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22 DE JUNHO DE 2022

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c) Enquadramento constitucional

O projeto em apreço versa sobre aquisição da cidadania portuguesa, alterando a Lei n.º 37/81, de 3 de

outubro, na sua redação atual. Trata-se de uma matéria da reserva absoluta de competência legislativa da

Assembleia da República [alínea f) do artigo 164.º da CRP], carece de votação na especialidade pelo Plenário

(n.º 4 do artigo 168.º da CRP), assume a forma de lei orgânica (n.º 2 do artigo 166.º da CRP) e convoca um

alargamento da legitimidade para requerer a fiscalização preventiva da constitucionalidade, que é conferida não

apenas ao Presidente da República, mas também ao Primeiro-Ministro ou um quinto dos Deputados à

Assembleia da República em efetividade de funções (n.os 4 e 7 do artigo 278.º da CRP).

Assim, quando e se aprovado este projeto assume, do ponto de vista orgânico-formal, a natureza de lei de

valor reforçado, nos termos do n.º 3 do artigo 112.º da CRP.

Do ponto de vista material, o projeto convoca o disposto no artigo 4.º da CRP, nos termos do qual «São

cidadãos portugueses todos aqueles que como tal sejam considerados pela lei ou por convenção internacional.»,

o que significa que o legislador constituinte deixou grande latitude ao legislador ordinário nesta matéria, embora,

como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira «(…) o facto de a Constituição ter remetido para lei ou convenção

internacional a definição dos critérios da cidadania portuguesa não quer significar que exista aqui total liberdade

de definição. Não pode ser adotada uma solução arbitrária. Há-de existir naturalmente uma qualquer conexão

relevante entre o cidadão português e Portugal (nascimento em território português ou em território sob

administração portuguesa, filiação de portugueses, casamento com portugueses, etc.)»4.

No mesmo sentido, entre os princípios de direito internacional está o princípio da nacionalidade efetiva, que

se traduz na ligação efetiva e genuína entre o indivíduo e um Estado. De acordo com este princípio, um Estado

só deve conceder a sua nacionalidade a quem com ele tenha, por força do nascimento, descendência ou outros

fatores relevantes, uma relação de pertença. Daqui resulta que o princípio da nacionalidade efetiva opera como

um limite da atuação legislativa dos Estados em matéria de concessão da nacionalidade5.

Outros princípios de direito internacional sobre esta matéria são também a proibição de discriminação, o

alcance individual e não coletivo da aquisição ou da perda de cidadania e a dependência de consentimento do

próprio para a naturalização ou qualquer forma de aquisição superveniente da cidadania6. E a Declaração

Universal dos Direitos do Homem, determina, no artigo 15.º, que «todo o individuo tem direito a uma

nacionalidade».

Por sua vez, são os seguintes os princípios de direito nacional nesta matéria: prevalência do jus sanguinis,

ausência de diferenciação com base no sexo ou na filiação por imperativo de igualdade, conservação da

cidadania portuguesa por cidadão que se naturalize noutro Estado e não declare renunciar à cidadania

portuguesa7.

Esta prevalência do jus sanguinis não determina, contudo, salvo melhor opinião, um juízo de

inconstitucionalidade sobre o diploma, apesar de este privilegiar em certas situações o jus soli.

d) Enquadramento legal

No plano da legislação ordinária, a atribuição, aquisição e perda da nacionalidade é regulada pela Lei n.º

37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade), a qual foi, até ao momento, alterada nove vezes, através da Lei

n.º 25/94, de 19 de agosto, do Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro (na redação dada pelo Decreto-

Lei n.º 194/2003, de 23 de agosto)8 9 e das Leis Orgânicas n.os 1/2004, de 15 de janeiro, 2/2006, de 17 de abril,

1/2013, de 29 de julho, 8/2015, de 22 de junho, 9/2015, de 29 de julho, 2/2018, de 5 de julho, e 2/2020, de 10

de novembro.

Das alterações introduzidas pela Lei n.º 25/94, de 19 de agosto, destacam-se as relativas à distinção entre

4 V. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, volume I, Coimbra, 2007, pág. 222. 5 V. Maria Fernanda Carneiro, Os princípios do Direito da Nacionalidade no instituto da aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, Porto, 2021, pág. 12. 6 V. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa anotada, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra, 2010, pág. 124. 7 Cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, op. cit., pág. 126. 8 Retificado pela Declaração de Retificação n.º 11-I/2003, de 30 de setembro. 9 A alteração introduzida por este diploma, traduzida na revogação do artigo 20.º da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, dizia respeito à gratuitidade de atos de registo, não afetando a área de reserva absoluta de competência legislativa a que se refere a alínea f) do artigo 164.º da Constituição.