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4 | II Série B - Número: 002 | 29 de Setembro de 2007

APRECIAÇÃO PARLAMENTAR N.º 51/X DECRETO-LEI N.º 295/2007, DE 22 DE AGOSTO, QUE «DEFINE O ESTATUTO DOS DIRIGENTES ASSOCIATIVOS DAS ASSOCIAÇÕES PROFISSIONAIS DE MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS»

O Governo publicou a decreto-lei referido em epígrafe ao abrigo do disposto no artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 3/2001, de 29 de Agosto. O artigo 4.º da Lei Orgânica a que o decreto-lei deve obediência, manda o Governo aprovar o estatuto dos dirigentes associativos, e nada mais.
A Lei Orgânica n.º 3/2001 — lei de valor reforçado — estabelece especialmente direitos associativos, designadamente conferindo o direito de associação a militares (artigo 1.º) e enunciando os direitos de que gozam essas associações uma vez criadas (artigo 2.º). Igualmente fixa a lei orgânica restrições ao exercício desses direitos, nos exactos termos do seu artigo 3.º, expressamente remetendo para normativo preexistente.
Este artigo 3.º da lei orgânica não é uma cláusula susceptível de regulamentação nem confere autorização ao Governo para sobre ela legislar ou sequer para a concretizar. Contudo, o Governo, ao aprovar o decreto-lei, prevaleceu-se dessa norma, reproduzindo-a, e explicando até a opção legislativa no preâmbulo.
Com efeito, usa o Governo a faculdade legal para aprovar o estatuto dos dirigentes de associações de militares, para legislar em matéria de direitos liberdades e garantias, sem prévia autorização parlamentar, ofendendo assim a reserva relativa de competência legislativa que a Constituição confere à Assembleia da República pela alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º. Estaremos perante uma inconstitucionalidade orgânica a sindicar.
Indo mais longe ainda, opera o Governo, por simples decreto-lei, uma efectiva restrição ao exercício dos direitos das associações, violando materialmente quer a Constituição quer a própria lei orgânica — de valor reforçado — que os estabeleceu.
No tocante ao estatuto, introduz, o decreto-lei, um apertado e restritivo procedimento de dispensa de dirigentes com vista à participação em reuniões associativas (artigo 7.º), estabelecendo inclusive «que a dispensa pode ser recusada, cancelada ou interrompida pelo chefe do Estado-Maior» (n.º 4 do artigo 7.º). A título de exemplo, diga-se que um pedido de reunião entre uma comissão parlamentar e uma associação de militares fica dependente de um pedido formal, com a antecedência mínima de 10 dias, podendo ainda ser cancelada ou recusada pela hierarquia militar. Este restritivo procedimento, excedendo o estrito âmbito estatutário do dirigente, tem o alcance de interferir não apenas na actividade das associações, como ainda obstruir a livre decisão de órgãos terceiros que com as associações se queiram avistar, designadamente um órgão de soberania.
O decreto-lei, cuja apreciação é requerida, excede ainda o âmbito do estatuto dos dirigentes que lhe incumbe criar, porquanto faz depender o exercício de «qualquer actividade associativa no interior das unidades» de uma autorização prévia [alínea c) do artigo 5.º] sem que correspondentemente a necessidade dessa autorização esteja prevista na lei orgânica. Por isso mesmo, a própria divulgação das «suas iniciativas, actividades e edições nas unidades e estabelecimentos militares» [alínea f) do artigo 2.ª da lei orgânica] não carece de autorização mas tão só da escolha de um local apropriado.
Cria ainda o decreto-lei um registo obrigatório das associações de militares (artigo 9.º), um regime especial injustificado, que colide com o disposto na lei orgânica ao estabelecer que a constituição, gestão, funcionamento e extinção das associações «são reguladas pela lei geral, nomeadamente pelo Código Civil». O decreto-lei contraria — não podendo fazê-lo — a lei geral aplicável às associações e a lei geral das associações profissionais de militares.
Designada formalmente como lei estatutária, o decreto-lei é antes de mais uma lei redutora do estatuto ou de estatuto diminuído. E na medida em que interfere na dinâmica e expressão do associativismo militar é uma lei anti-associativa. O seu cunho anti-associativo traduz-se no seu carácter restritivo. Encurta e limita os efeitos de uma lei — orgânica — que, por ele, decreto-lei, deve ser observada. O decreto-lei é uma lei restritiva de direitos liberdades e garantias, como de resto decorre com propriedade de uma leitura atenta do seu preâmbulo.
A maioria parlamentar que, em 2001, quis um associativismo militar aberto, livre e responsável, logo democrático, vê-se agora confrontada com uma maioria governamental que, já não podendo recuar no tempo, tolera o associativismo, mas pouco, e prefere-o confinado e diminuído.
Nestes termos, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 162.º e o artigo 169.º da Constituição da República Portuguesa e ainda dos artigos 4.º, n.º 1, alínea h), e 189.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, vêm requerer a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 295/2007, que «Define o estatuto dos dirigentes associativos das associações profissionais de militares das Forças Armadas».

Assembleia da República, 20 de Setembro de 2007.
Os Deputados do PCP: António Filipe — Bernardino Soares — Jerónimo de Sousa — João Oliveira — Miguel Tiago — Bruno Dias — Honório Novo — Francisco Lopes — José Soeiro — Luísa Mesquita.

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