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II SÉRIE-B — NÚMERO 29

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todo o País, em espaços de diversão noturna ou nas suas imediações8.

O Chega considera imperativo perceber se esta realidade não «passa» para o RASI, ou se nele é retratada

de forma a criar uma perceção diferente da realidade, mais amenizada, para contento dos cidadãos nacionais

e para funcionar como isco para turistas. E, em caso positivo, perceber qual a responsabilidade do Primeiro-

Ministro e do Governo nesse processo.

Um segundo aspeto a ter em conta prende-se com o facto de o RASI transmitir apenas um lado da

realidade da criminalidade em Portugal, o das estatísticas do sistema de justiça criminal.

Sucede que uma parte importante da criminalidade é desconhecida, precisamente porque não é participada

às autoridades policiais: são as chamadas cifras negras, correspondentes à criminalidade não participada.

É do conhecimento comum que os crimes mais graves são aqueles que são mais facilmente relatados, ao

passo que, com os menos graves – como o pequeno furto, por exemplo – passa-se exatamente o contrário.

Por outro lado, a confiança nas autoridades é fator determinante para a apresentação de queixa.

Estatisticamente, Portugal tem uma taxa de criminalidade muito mais baixa do que a da Suécia, não por ter

menos crimes do que aquele país, antes, porque os suecos reportam mais pela confiança que têm nas

autoridades, de que não deixarão de investigar.

As metodologias que permitem colmatar esta insuficiência do sistema de justiça criminal são os inquéritos

de vitimização e os inquéritos de delinquência autorrevelada: só com estes três instrumentos é possível traçar

um panorama fiel da criminalidade que, em cada ano, ocorre em território nacional.

A realização de inquéritos de vitimização, de resto, tem sido um ponto em que os responsáveis pelo

Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT) têm insistido, em várias

ocasiões:

⎯ «Constituiria um instrumento útil para definir as políticas de segurança mais eficazes», observou RUI

PEREIRA a propósito do RASI de 2013, quando era Presidente do OSCOT9;

⎯ António Nunes, Presidente do OSCOT, a propósito do RASI de 2017, defende que «é preciso estudar

melhor a realidade portuguesa», porque o retrato feito pelo relatório anual de segurança «não é completo»,

dado que «só regista a criminalidade participada»10.

Tanto quanto se sabe, em Portugal foram realizados apenas três inquéritos de vitimação, através do

Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Justiça (GEPMJ): em 1988 na área metropolitana de

Lisboa, em 1992 em território continental português, e em 1994 à escala nacional, sendo ainda de referir o

inquérito de vitimação relativo ao stalking, no âmbito do projeto «Stalking em Portugal: Prevalência, Impacto e

Intervenção», conduzido pela Universidade do Minho, em 2011.

Os apelos do OSCOT têm caído, portanto, em saco roto, o que equivale a dizer que os sucessivos

Governos se contentam com este palimpsesto que anualmente produzem, em vez de procurarem conhecer a

realidade da criminalidade, de quem a previne e combate e das respetivas vítimas.

Em terceiro lugar – mas não último! –, cumpre referir que em Portugal não existe coincidência entre a

definição de criminalidade violenta prevista no Código de Processo Penal (CPP) – ali denominada

criminalidade violenta e criminalidade especialmente violenta – e a que é utilizada em sede de RASI –

criminalidade violenta e grave –, sendo certo que é com base nesta última que tem sido feita a medição da

criminalidade violenta desde 1998.

A definição de criminalidade violenta (e especialmente violenta) do CPP compreende 32 crimes previstos

no Código Penal, e reflete uma perspetiva jurídico-penal do conceito de criminalidade violenta, ao passo que a

definição de criminalidade violenta e grave adotada para os fins do RASI compreende apenas 25 crimes, nem

todos do Código Penal, e traduz uma vertente sociológica da análise da realidade criminal, para a qual

relevam apenas o sentimento de insegurança e alarme social provocado pelos crimes.

Em consequência destas diferenças de objeto quanto ao retrato da criminalidade grave, em qualquer RASI

que se queira analisar haverá um conjunto substancial de crimes que ficam fora do radar das estatísticas do

8 https://www.cmjornal.pt/portugal/detalhe/violencia-na-noite-faz-5-mortos-em-9-dias-no-pais 9 https://www.noticiasaominuto.com/pais/196060/observatorio-de-seguranca-defende-inquerito-de-vitimizacao 10 V. nota 2.