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II SÉRIE-C — NÚMERO 8

PETIÇÃO N.? 109A/I (1.9)

RECLAMANDO CONTRA 0 TEOR DA ALÍNEA B) DO ARTIGO 288.« DA CONSTITUIÇÃO

A S. Ex.* o Presidente da Assembleia da República.

Excelência:

Nos termos da Lei n.° 43/90, de 10 de Agosto, os cidadãos abaixo assinados, no pleno uso dos seus direitos e independentemente das suas diversas opiniões filosóficas e políticas, vêm perante V. Ex." apresentar a seguinte representação:

Refere a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 288.°, que «as leis de revisão constitucional terão de respeitar [...] b) A forma republicana de Governo». É opinião dos signatários que uma Constituição não deve, nem pode, hipotecando a opinião democrática dos vindouros, pretender legislar ad aeternum, sob pena de, por razões de pormenor, se arriscar a si própria a ver encurtada a sua vida ou diminuído o respeito que por ela os cidadãos devem ter. Assim, os signatários, de uma forma geral contrários a todas as disposições que, antidemocráticamente, obrigam a nossa e as vindouras gerações a uma intolerável situação de capitis deminutio, vêm perante V. Ex." reclamar em especial contra a alínea com cuja citação iniciaram a presente representação.

É que ela, para além de implicar, ou pretender implicar (de forma pouco inteligente e constitucionalmente bárbara), que aos Portugueses é vedado escolher uma forma de governo não republicana, quiçá monárquica, implica também que, pelo menos teoricamente, deveriam existir «formas de governo republicanas» versus «formas de governo monárquicas». O que, além de falso, é destituído de sentido e nem teoricamente se verifica. O que existe (e V. Ex." será, por certo, o primeiro a reconhecê-lo) são materialmente formas de governo autoritárias e ditatoriais versus formas de govemo democráticas e, formalmente, formas de govemo parlamentar, semipresidencialista ou presidencial unipessoais, de executivo ou de assembleia.

Terá sido, pois, um lapso, com ridículos efeitos, a introdução da alínea em causa no texto constitucional. E não o terá sido menos o facto de se não ter aproveitado as revisões de 1982 e 1989 para o corrigir.

Na impossibilidade de descortinar claramente o que se passa no espírito dos constituintes, entende-se, de maneira geral, que a absurda imposição se refere, não à forma republicana de governo, figura inexistente, mas à forma de regime republicano, isto é, à caracterização do regime através da existência de um chefe de Estado eleito. Para a Constituição, mais importante que a democracia e as liberdades públicas, é o ódio serôdio e ridículo à chefia dinástica do Estado, existente na maioria dos parceiros de Portugal na CEE.

A vontade popular será inconstitucional caso venha a desejar substituir o regime republicano pelo monárquico, ainda que, no mundo de hoje, este exista precisamente nos " países onde a democracia atingiu as suas formas mais ançrfeiçoadas. Donde se conclui, Sr. Presidente, que a disposição em causa não tem, necessariamente, cabimento numa Constituição democrática, só o podendo ler em simulacros de Constituição elaborados por regimes totalitários.

Acresce, Sr. Presidente, que o artigo 37.° da Constituição consagra expressamente a liberdade de expressão e informação, da qual deriva, expresso no artigo 51.°, o direito de associação e organização política «a fim de concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e organização do poder político».

Não sendo de admitir que os constituintes entendessem consagrar expressamente tais liberdades e direitos, mas, ao mesmo tempo, proibir a sua democrática concretização — o que revelaria inqualificável má-fé e desprezo pelo povo português —, torna-se evidente que a alínea b) do artigo 288.° da Constituição se choca frontalmente com os princípios consagrados no plano dos direitos, liberdades e garantias, princípios que, evidentemente, antecedem as disposições do artigo 288.° e não podem por este ser derrogados.

Ou prevalecem os direitos e desaparece a alínea em causa, ou se dá a hipótese inversa a bem da constitucional coerência o que será totalmente inadmissível.

No primeiro caso, para além da coerência consagrar-se-ia a democraticidade da Constituição; no segundo, talvez se ganhasse em coerência, mas passaríamos a viver em ditadura.

Assim, e atendendo que:

1) A vontade popular é soberana e não pode, nem deve, ser espartilhada por imperativos como os contidos no artigo 288.° da Constituição, designadamente na sua alínea b);

2) Portugal pertence à CEE, cujos membros são em grande parte monárquicos, sendo a referida alínea, objectivamente, uma ofensa a tais países;

3) A monarquia se tem revelado por toda a parte como um esteio fundamental da democracia, v. g. no caso espanhol;

4) As sucessivas crises e clivagens que os vários preenchimentos do cargo de chefe do Estado têm provocado no seio da democracia portuguesa têm, indubitavelmente, posto em causa aquilo a que a Constituição chama «forma republicana de governo»;

5) O n.° 2 do artigo 37.° estabelece que o exercício dos direitos expressos no n.° 1 do mesmo artigo «não pode ser impedido por qualquer tipo ou forma de censura», princípio este que afinal é violado pela própria Constituição;

os cidadãos abaixo assinados, monárquicos e republicanos, mas acima de tudo portugueses, submetem à apreciação de V. Ex." a presente representação solicitando que lhe seja dado o seguimento previsto na Lei n.° 43/90.

Notam entretanto que já em 30 de Maio de 1986 idêntica queixa foi apresentada a S. Ex." o Presidente da República com o pedido de uma audiência que, por motivos que desconhecem, não foi até hoje concedida.

Lisboa, 30 de Setembro de 1990.— O Primeiro-Re-querente, Rodrigo Jorge de Moctezuma Seabra Pinto Leite.

Nohl. — Desta petição foram subscritores 1269 cidatlãos.