inicialmente, claramente acima dos compromissos comunitários; não é de repente que se gere uma taxa de inflação superior àquela que é aceitável.
A questão é que nós fizemos, de facto, um grande esforço para entrar no euro, os agentes económicos perceberam isso, e depois não tirámos as consequências disso, não tirámos as consequências de estar no euro. Ou seja, a uma política monetária que teve um carácter expansionista sem precedentes com a entrada no euro e, portanto, com a convergência, quase imediata, das taxas de juro nós deveríamos ter respondido com uma política orçamental naturalmente compensatória, naturalmente restritiva. Acresce a isto que, ainda por cima, estávamos mais avançados no ciclo económico do que a média da União Europeia nessa altura, o que reforçava a necessidade de termos tido uma política anticíclica no mesmo momento, do ponto de vista orçamental. Porém, fizemos exactamente o contrário: juntámos a uma política monetária extraordinariamente expansionista uma política orçamental também expansionista sem precedentes, provavelmente nos tempos de que nos podemos lembrar.
Portanto, isto resultou no que resultou. Ou seja, conseguimos, em 2001, juntar a pior das combinações: um défice externo, que é recorde na OCDE; um défice orçamental, que é recorde na União Europeia; uma taxa de inflação que, na altura, em finais do ano passado, estava dois pontos percentuais acima da média da União Europeia, com a agravante de que isto já se verificava há uma sucessão de anos - nos últimos quatro ou cinco anos os custos do trabalho para as empresas subiram em termos reais, o que corresponde a uma apreciação da taxa de câmbio real na ordem dos 12%, é como se tivéssemos revalorizado o escudo, se esta ainda fosse a nossa moeda, em 12%, com a consequência que isto tem sobre as empresas.
Ora, o normal é que um País que tenha um défice e uma inflação elevados tenha um crescimento alto, e nós conseguimos juntar a estes dois problemas um crescimento baixo. E isto tem de ter reflexos, porque o défice externo, ao contrário do que alguns diziam, numa união monetária não é irrelevante, tem um significado, significa que as empresas portuguesas vinham, seguramente, a perder competitividade, como se verificou, e que, se não for corrigido por políticas adequadas, corrige-se espontaneamente pela pior via possível, que é a da recessão, mais ou menos forte, conforme a gravidade da situação.
Isto afecta, naturalmente, a confiança dos agentes económicos, que se habituaram, durante vários anos a fio, a ouvir dizer que estava tudo bem, que éramos um caso de sucesso. Tínhamos entrado no euro e estava tudo a correr muito bem: o crédito cresceu, em Portugal, a uma taxa de juro sem precedentes e sem paralelo em outros países da União Europeia; o consumo crescia… Aliás, tudo crescia, menos o investimento das empresas, naturalmente.
Aliás, se formos um pouco atrás, verificamos que a retracção do investimento das empresas está longe de ser de agora. Se olharmos para os números do investimento estrangeiro, veremos que o problema está longe se ser de agora; e, como sabe, pois também tem formação económica, as políticas económicas produzem os seus efeitos com desfasamentos.
Portanto, a situação de hoje, e dos meses mais recentes, é consequência das políticas que foram adoptadas, ou das que não foram, ou das que foram mal adoptadas nos últimos anos.
Por isso, é natural que os agentes económicos, que andaram alguns anos a ouvir dizer que estava tudo bem e que constataram que uma parte daquilo que lhes era dito não era verdade, tenham dúvidas e haja quebras nos indicadores de confiança. Acresce, como sabe, que estes indicadores de confiança têm sempre o seu lag de publicação e de inquérito, é preciso que se diga em que momento é que são feitos esses inquéritos e o gap temporal que vai desde a sua realização até à sua publicação, além de que também é preciso perceber o que são estes indicadores.
É natural que os consumidores, percebendo que há uma política orçamental mais rigorosa (e, como o Sr. Deputado sabe, uma política orçamental mais rigorosa significa que há menos rendimentos distribuídos, o Estado não gasta… o seu consumo não se evapora), também entendam que este não é o momento de fazer grandes despesas em bens duradouros, que foi as que referiu, que a situação não é aquela que todos nós desejávamos que fosse. E, portanto, tal como o Estado tem de fazer os seus sacrifícios, é natural que os consumidores tenham interiorizado isto, o que até é positivo. É positivo que as pessoas interiorizem que a situação não é tão boa como lhes diziam que era, e que, portanto, agora percebam que é o momento de pôr as coisas no sítio, antes de se entrar em novo ciclo de consumo.
Tal como eu lhe dizia no outro dia, a confiança perde-se rapidamente, e leva tempo a ganhar-se. Mas penso que, hoje, a situação se irá alterar em função daquilo que os agentes económicos concluam que é a prática do Governo, daquilo que é a sua determinação para prosseguir determinados objectivos e determinadas políticas. E haverá um momento em que isto irá acontecer, quando os empresários e os consumidores concluírem que, de facto, a prática é diferente.
Como ainda no outro dia lhe disse no Plenário, a propósito daquele inquérito sobre o Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia realizado pela Ideias & Negócios, a maior parte das pessoas dizia que as medidas eram muito positivas, mas 80% delas não acreditava que essas medidas se concretizassem, apesar de estarem calendarizadas e bem determinadas e identificadas, porque, de facto, era esta a prática. A prática de sucessivos governos foi a de fazer grandes declarações, grandes diagnósticos, prometer grandes mudanças e, depois, nada acontecer.
Ainda hoje aprovámos, no Conselho de Ministros, a privatização do notariado. Quantas vezes se falou na privatização do notariado nos últimos anos? Mas nada aconteceu. Quantas vezes se falou na mudança das leis de trabalho? Quantas vezes se falou nas reformas da segurança social, da saúde? Quantas vezes se falou nestas medidas que temos vindo a aprovar no Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia, no licenciamento industrial, no capital de risco, no Programa Operacional da Economia? E nada disto se fez.
Portanto, é natural esta desconfiança, mas também é natural que tenha de se dar tempo para que as medidas produzam os seus efeitos. Não basta aprovar as medidas, mas já é um passo importante aprová-las, porque sem serem aprovadas é que elas não produzem efeitos de certeza. Logo, aprová-las é o primeiro passo, pô-las em prática é o segundo e serem utilizadas pelos agentes económicos é o terceiro passo.
O Sr. Deputado também compreenderá que tem havido um grande esforço, e em alguns casos até com sucesso,