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1076 II SÉRIE - NÚMERO 35-RC

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, na altura em que considerámos a questão do Provedor de Justiça foi possível fazer uma reflexão alargada sobre as virtualidades e inconvenientes da pulverização de provedores, em termos que não vemos razão para alterar. Gostaríamos, apesar de tudo, que não se utilizasse nesta matéria o critério de aguardar que o Sr. Deputado Rui Machete esteja presente para discutir o artigo 108.° e de não aguardar pelo Sr. Deputado Raul Castro para alargar o juízo sobre esta matéria.

Portanto, propunha que esse juízo ficasse suspenso.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Raul Castro, se quiser, fará a defesa sem que seja necessário reabrirmos o debate, que é o critério que normalmente seguimos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - O PSD não se pronunciou sobre esta matéria, o que é também um direito.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Pronunciou-se, sim.

O Sr. Presidente: - Sem entusiasmo nenhum. Não vêem vantagem em consagrar na Constituição estes valores.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, pronunciámo-nos em polifonia, eu e o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Então, terá sido uma manifestação lacónica.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passaremos labora agora à parte relativa à organização do poder político, designadamente ao artigo 111.°, para o qual há duas propostas, uma do CDS e outra do PSD, bastante semelhantes. O PSD propõe substituir a expressão "o poder político pertence ao povo", uma vez que dá isso como pressuposto, pela expressão "o povo exerce a soberania através de representantes ou por meio de referendo [...]". Aqui substituiu-se também a expressão "poder político" pelo termo "soberania".

Têm a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, o projecto do PSD substitui a expressão "poder político" pelo termo "soberania". São conhecidos os debates sobre o alcance quer de um termo quer do outro, estando assome que a ideia de poder político é mais ampla do que a ideia de soberania.

O PSD considera, no entanto, que será muito mais prudente e oportuno que, ao nível do artigo 111.°, se refira o termo "soberania" em vez da expressão "poder político". Em primeiro lugar, porque soberania é poder político e, em segundo lugar, porque é um poder político, mais forte e eivado de uma autoridade que, no fundo, radica naquela concepção que Bodin já sublinha.

O poder soberano é capaz de reproduzir poderes políticos derivados; faz-se, assim, coincidir essa sua potencialidade com a ideia genérica de poder político, que, à partida, se reputa de mais ampla. O poder político soberano tem capacidade de criar poderes políticos não ;soberanos - chamemos-lhes assim - e, por consequência, não há aqui, do nosso ponto de vista, nenhuma restrição à ideia que está consagrada na actual redacção da Constituição.

Há pontos que me parecem de sublinhar no que diz respeito a esta preferência: em primeiro lugar, o ponto de vista da conformação formal de outros artigos da Constituição com este, uma melhor conjunção e uma melhor convergência de termos, porquanto os artigos 1.°, 2.° e 3.° da Constituição se referem já a soberania, em segundo lugar, a ideia de que o povo exerce a soberania, tendo uma identificação directa e uma conotação semântica sem ideias de soberania popular. E é exactamente por teimosia nesse termo, que fez história - e fê-la com bastante felicidade -, que teimamos de novo em que se diga "o povo exerce a soberania" em vez de se dizer "o povo exerce o poder político". O problema da alteração que o Sr. Presidente, referiu ,é um problema de construção de frase, pois poderíamos dizer "a soberania é exercida pelo povo".; Ora, o que está aqui em causa é exactamente esta. mudança de termo, mais do que a construção da frase, que é secundária e irrelevante.

Questão que nos parece também importante neste projecto, a nível do artigo 111.°, é a referência ao referendo. É, na verdade, uma inovação relativamente ao texto constitucional que têm vantagens, porque, ao nível do artigo 111.°, há, no nosso projecto, a conjugação da democracia representativa com a democracia directa. Sem menosprezar a importância do princípio representativo nas suas formas de manifestação, como é o direito de voto igual, e a sua potencialidade de criação de governos legítimos, é importante reconhecer o "tempero" dos efeitos do sistema representativo pela introdução do referendo.

As vantagens dessa introdução podem resumir-se, em nossa opinião, nalguns pontos que poderei aqui também resumir, o primeiro dos quais é o de haver, um acréscimo de legitimidade no processo de participação na decisão política. Já não temos aquilo que se atribui muitas vezes ao sistema representativo, a saber, o exclusivo de circulação de elites, em que, no fundo, os cidadãos são um "objecto-situação" das decisões legislativas, mais do que sujeito dessas mesmas decisões; havendo agora um acesso directo às mesmas decisões. Há, assim, um acréscimo de legitimidade que deixa de ser uma legitimidade abstracta e fria do esquema representativo simples, havendo também uma intervenção directa na criação da decisão por via do referendo.

É bom que fique claro que a nossa ideia de referendo transmite, antes de mais, uma preocupação fundamental, que é a da preservação do sistema pluripartidário e a da não intenção de dissolver esse sistema isto é; reconhecemos o sistema de representação através dos partidos políticos como meio fundamental de criação, dessa mesma decisão e, por outro lado, rejeitamos - e é importante sublinhar isto aqui - qualquer ideia identitária de participação no poder e de criação das decisões. O referendo não significa formas plebiscitarias, não tem a ver com estruturas autoritárias em que às pessoas é dada a decisão e em que estas se vão pronunciar apenas sobre o que está feito.