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24 DE FEVEREIRO DE 2016

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empregadoras e prestadores de trabalho, a regressão ocorrida na contratação coletiva e a facilitação do

despedimento foram mecanismos legais de promoção da precariedade. Por outro lado, a generalização da

precariedade fez-se por via da banalização da transgressão das normas laborais. Os falsos recibos verdes, o

falso trabalho temporário, as falsas bolsas, os falsos estágios ou o falso voluntariado são mecanismos de

ocultação de uma relação de trabalho subordinado que se disseminaram, abrangendo hoje centenas de

milhares de trabalhadores. Por último, o trabalho informal continua a ter um peso importante na sociedade

portuguesa, inibindo o exercício de direitos e o acesso à proteção que decorre da existência de um contrato de

trabalho.

Durante muitos anos, a precariedade permaneceu um assunto silencioso na sociedade portuguesa. Muito

embora as organizações sindicais venham falando do tema desde meados da década de 1980, é sobretudo a

partir dos anos 2000 que ele ganhou centralidade no espaço público. Na segunda metade da década de 2000,

nomeadamente a partir de 2007, o surgimento de uma série de organizações de trabalhadores precários deu

uma nova expressão pública ao fenómeno. Bolseiros, trabalhadores a falso recibo verde, estagiários,

intermitentes, encontraram formas de organização que lhes conferiram uma voz coletiva.

No ano de 2011, assistiu-se a um dos maiores protestos da nossa história democrática. A 12 de março

desse ano, centenas de milhares de pessoas saíram à rua em todo o país nas mobilizações da “Geração à

Rasca”. Nos anos subsequentes, as manifestações e os protestos contra a austeridade e contra a Troica

ocuparam as ruas de várias cidades. No mesmo período, Portugal assistiu a tantas greves gerais quantas as

que tinha havido em todo o período anterior em democracia.

Um dos processos que os organizadores destes protestos desencadearam foi a Iniciativa Legislativa de

Cidadãos “Lei contra a Precariedade”. Promovida pelos Precários Inflexíveis (PI), pelo Movimento 12 de março

(M12M), pela Geração à Rasca do Porto, pela Plataforma dos Intermitentes do Espetáculo e do Audiovisual e

pelo FERVE (Fartos d’Estes Recibos Verdes), ela foi subscrita por cerca de 40 mil cidadãos e entregue no

Parlamento. O seu conteúdo incidia sobre a fiscalização do falso trabalho independente, a limitação dos

contratos a termo e o combate ao abuso do trabalho temporário.

Na sequência desta iniciativa, foi aprovada a Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto, que entrou em vigor a 1 de

setembro de 2013. Esta lei deu resposta a uma das três dimensões propostas pela “Lei contra a

Precariedade”, instituindo mecanismos de combate à utilização indevida do contrato de prestação de serviços

em relações de trabalho subordinado. Foi provavelmente a única alteração de sentido positivo na legislação

laboral que ocorreu na anterior legislatura.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) já em 2006 tinha aprovado a Recomendação n.º 198,

relativa às relações de trabalho que previa a adoção de políticas nacionais que contemplassem medidas para

combater as relações de trabalho encobertas e assegurar a adequada proteção dos trabalhadores. Em

novembro de 2013, no relatório elaborado pelo Grupo de Ação Interdepartamental da OIT sobre países em

crise para a Conferência de Alto Nível “Enfrentar a crise do Emprego em Portugal: que caminhos para o

futuro?”, foi referido que se deveria garantir que “a Lei n.º 63/2013, que entrou em vigor em 1 de setembro de

2013, seja implementada de forma a apoiar a criação de empregos dignos.”

No passado dia 15 de dezembro de 2015, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda promoveu na

Assembleia da República uma audição pública de balanço sobre a aplicação desta lei. Com a presença de

ativistas dos movimentos de precários, dirigentes sindicais, especialistas de Direito do Trabalho, advogados,

elementos do Ministério Público, da Autoridade para as Condições de Trabalho e também com a presença do

Ministro do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social do atual Governo, fez-se uma análise da

aplicação desta lei, das limitações que se têm verificado e dos mecanismos legais e sociais necessários para

garantir a sua eficácia e o alargamento do seu âmbito.

A Lei n.º 63/2013 teve o grande mérito de atribuir um conjunto de novas competências à ACT e de assumir

que não poderia depender da iniciativa do trabalhador o combate a estas situações e o seu encaminhamento

para os Tribunais, no caso de a empresa notificada pela ACT não regularizar a situação. Além disso, passou a

haver uma ação mais articulada entre a ACT e o Ministério Público. Feito o balanço da aplicação da lei

constatou-se que esta resultou até hoje na regularização de 1867 trabalhadores a falsos recibos. Em 2015, os

dados provisórios fornecidos pela ACT apontam para a regularização imediata de cerca de 560 situações, o

encaminhamento para o Ministério Público de 446 casos, e o reconhecimento em tribunal de 90 situações.