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SESSÃO N.º 27 DE 10 DE NOVEMBRO DE 1906 9

apresentam para, confundindo todo, tirar á fiscalização o caracter de seriedade, de efficacia e de respeitabilidade.

O director geral da Contabilidade é o guarda-livros do Estado, ordena a despesa em nome do Ministro, classifica-a, balanceia-a, mas ahi termina as suas funcções, porque se nunca se disse, nem é sequer comprehensivel, que o guarda-livros possa ser o fiscal do chefe da casa commercial onde exerce as suas funcções sob as ordens, vigilancia e direcção do qual escritura as receitas e despesas, igualmente não se pode comprehender que aquelle alto funccionario, que era nome do Ministro exerce aquellas funcções, que é o seu primeiro collaborador no ordenamento das despesas publicas, na percepção das receitas do Thesouro, seja o seu fiscal, seja, numa invasão completa de hierarchia burocratica, superior ao seu superior legitimo, e, de uma forma efficaz, possa negar-lhe os meios que elle julga necessarios para governar.

Condição para a boa systematização das despesas publicas é somente, a seu ver, a organização de uma fiscalização previa, orientada no sentido de impedir que o Governo faça despesas que não estão conformes com o orçamento.

E, se todos comprehendessem que tal fiscalização não pode tornar-se proficua senão com a condição de preceder a despesa, porque de outra forma encontra-se o Parlamento perante a irremediabilidade de factos consummados, que não podem já esconder-se, porque, suppondo mesmo que a responsabilidade ministerial deixe de ser uma palavra vã, nem o castigo do Ministro compensa o prejuizo que o Thesouro soffreu, nem, senão rara e difficilmente, acontecerá que a fortuna do responsavel seja sufficiente para comportar as retribuições dos dinheiros publicos indevidamente despendidos, tratando se de sommas que estão fora de toda a proporção com patrimonios, mesmo de uma certa importancia.

Se a fiscalização previa é hoje absolutamente indispensavel, é necessario, como disse, que se exerça de uma maneira efficaz, de molde a dar garantias e infundir respeito, o que não succede quando ella se exerce por funccionarios que, embora declarados inamoviveis, são funccionarios subordinados ao Ministro, sentindo todos os dias a sua acção de superior hierarchico e a quem a todos os momentos associam, como seus colaboradores, a sua responsabilidade á d'elles.

Em parte alguma do mundo a fiscalização é exercida por individuos que dependem da administração, e cuja iniciativa é, tantas vezes, a iniciativa dos proprios Ministros.

Ninguem ignora que, na maior parte dos casos, os regulamentos que os Ministros publicam, as instrucções, as portarias e até os projectos que apresentam ao Parlamento são elaborados pelos respectivos directores geraes.

As funcções imprimem caracter.

A independencia do fiscal não se coaduna com a dependencia do auxiliar, nem com a subordinação do executor.

O primeiro executor das ordens do Ministro é o director geral.

Fazê-lo fiscal do executivo, é confundir a administração com a justiça, é dissipar todas as garantias que esta dá.

Em toda a parte, como disse, a fiscalização previa é entregue a entidades independentes do executivo.

Em Italia o Tribunal de Contas exerce a sua fiscalização preventiva não só sobre as despesas publicas, mas ainda sobre todos os actos e decretos do Governo.

Nos termos da lei de 14 de agosto de 1862 todo o decreto real seja qual for o Ministerio de onde emane, é sujeito ao visto do Tribunal de Contas, mesmo que se não ligue com movimento algum de fundos e não interesse ao orçamento.

As altas funcções de que esse tribunal se encontra investido conferem-lhe um caracter verdadeiramente constitucional.

Examinando o acto ou decreto, o tribunal visa-o, rejeita-o se o encontra nos termos da lei, e senão recusa-lhe o visto. Essa deliberação é transmittida pelo Presidente ao Ministro signatario. Se o Ministro persiste, submette-se a deliberação ao Conselho de Ministros, se este é de parecer que se deva insistir, o tribunal é chamado a deliberar segunda vez, e se não se conforma com as razões dadas pelo conselho ordena o registo, mas com a seguinte declaração - visto com reserva. Communica directamente o facto, dentro de quinze dias, á Camara dos Deputados e ao Senado, e estes é que resolvem era ultima instancia.

Isto quando se trata de actos, decretos, regulamentos ou portarias que não se ligam com o orçamento e não trazem aumento de despesa, porque quando se trata de qualquer pagamento ou despesa, a recusa do visto por insufficiencia de verba orçamental ou de imputação irregular de capitulo a recusa do visto annulla o acto, e sem appellação.

D'esta forma, e só d'esta forma, é que se garante a inviolabilidade do orçamento.

O Brasil inscreveu na sua constituição republicana o artigo 90.°, criando o Tribunal de Coutas como uma instituição constitucional, independente de qualquer ramo da administração, com absoluta autonomia.

Pretendendo investi-lo das elevadas funcções que lhe competem e garantir-lhe a plenitude das suas attribuições, foi que o legislador constitucional o contemplou no acto fundamental da republica com a hierarchia igual ao Supremo Tribunal Federal, estabelecendo para o provimento d'esses logares o mesmo regime de investidura que o dos membros d'esse tribunal.

De resto, em todos os regimes classicos de fiscalização e autonomia do Tribunal de Contas é considerada elemento fundamental da instituição.

Em França, onde a Cour de Contas se resente da feição que lhe imprimiu o poder absoluto e centralizador do grande Napoleão ao organizá-lo no acto de 1807, é ainda assim, uma magistratura superior, separada da administrativa e tendo a independencia que dá a immobilidade e o .habito de julgar e lidar com leis.

Na Belgica, em 1806, pretendeu-se estabelecer limites á funcção de fiscalização previa do Tribunal de Contas, defendendo o grande ministro Mallon, com grande vehemencia, a disposição que limitava o exame da Côrte á approvação da validade de creditos e da regularidade da imputação, isto é, da classificação. Pois apesar disso a alteração não se fez, porque se entendeu que o tribunal, e só o tribunal, é que devia ter o arbitrio de recusar o visto pura e simplesmente.

Pois volvidos 60 annos, após tantos progressos nas sciencias economicas e financeiras, sob o Governo eminentemente liberal do Sr. João Franco, vem-se proporão Parlamento o que uma Camara conservadora, um partido conservador, não pode conseguir em 1856.

Nem na Rússia, pois no imperio autocrata dos czares a fiscalização dos dinheiros publicos constituo um Ministerio especial, com um pessoal proprio, independente do Ministerio das Finanças, pertencendo-lhe apenas as funcções proprias de exame e do julgamento das despesas e das contas publicas.

As republicas de S. Salvador, da America, e do Peru, do Mexico, apropriaram ás suas instituições a organização italiana do Tribunal de Contas, confiando-lhe a fiscalização previa das despesas com o voto absoluto.

O Sr. Ministro da Fazenda se não teve em vista mystificar a opinião publica, teve a habilidade de o apparentar. Mas mystificação tão patente, que, para a verificar, basta notar os argumentos com que se preconiza a subs-