O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

482 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Pergunto eu, sr. presidente, não está aqui a justificação plena, completa e clara da nossa intransigente attitude perante o projecto que se discute!?

Sabiamos já pelo relatorio do sr. ministro da fazenda que o thesouro não dispunha de recursos para pagar os encargos actuaes; sabiamos isso pela palavra auctorisada do sr. Dias Ferreira, quando aqui nos affirmou que, tendo pago tres coupons, não pagara um unico sem recorrer ao credito; sabiamos isso quando o sr. ministro da fazenda affirmou que tinha vendido £ 967:500 de titulos da divida externo; sabiamol-o quando o sr. ministro da fazenda confessou aqui que tinha empenhado 72:812 obrigações do caminho de ferro; todos o sabiam é certo; mas o que faltava era a confissão de s. exa., e essa fel-a o sr. ministro da fazenda pela maneira mais clara e categorica.

Quer dizer, o thesouro não póde pagar com os seus proprios recursos, e se é assim o que representa a consignação das receitas das alfandegas, senão o abrir-se as portas á administração estrangeira?

Eu fallo sem paixão, sr. presidente, fallo serenamente; digo o que em minha consciencia sinto. O que eu penso é que a consignação dos direitos das alfandegas, quando se dê a segurança de que o thesouro não póde satisfazer os encargos do projecto em discussão, é abrir de par em par as portas para que por ellas entre a administração estrangeira. A este respeito não póde haver duas opiniões.

Não importa a declaração do sr. ministro da fazenda, de que não consentirá que estrangeiros intervenham na administração portugueza. Eu acredito na sinceridade da affirmação de s. exa., de que não deixará que no accordo fique uma unica palavra, clara ou equivoca, que possa justificar a entrada de elementos estranhos na nossa administração; acredito na sinceridade d'essa affirmação, porque laço justiça aos sentimentos de patriotismo e de dignidade do sr. ministro da fazenda, do governo que se senta n'aquellas cadeiras e dos deputados que d'aquelle lado da camara defendem e votam este projecto; (Apoiados) não são mais nem menos patriotas, não são mais nem menos portuguezes (Apoiados) do que eu; mas, sr. presidente, o perigo não está ahi, nós todos sabemos que o sr. ministro da fazenda não fará um accordo em que fique consignado o direito ao estrangeiro de intervir na nossa administração; o perigo está no facto em si; a consignação das receitas das alfandegas, desde que não se possam satisfazer os encargos, o facto envolve em si a administração estrangeira. Desde que não paguemos integralmente aos nossos credores aquillo a que nos obrigamos, nenhuma duvida póde haver de que virão exigir-nos o que não lhe pagamos e virão exigir-nol-o, não na Boa Hora mas no Tejo, não guiados pelo codigo do processo civil, mas a tiros de canhão.

E se não succeder isto, acontecerá o que não é menos triste: levar-nos-hão alguma, ou todas as nossas colonias, como ha pouco o disse o sr. conde de Burnay. (Apoiados.)

É o caso do credor particular a quem o devedor não paga os juros dos capitães hypothecados; move-se-lhe a execução, que n'este caso não é senão a intervenção de estranhos na administração publica portugueza.

E como nós de antemão sabemos que não podemos pagar os encargos actuaes ou aquelles a que vamos obrigar-nos que são os mesmos, creio eu, nós de antemão sabemos tambem, que a breve trecho, passado um, passados dois annos, Portugal passará a ser um paiz tutelado. (Apoiados.)

Eu declaro a v. exa. que estou convencido de que se o paiz não estivesse hypnotisado por uma indifferença, que constituo um dos peiores males de que elle enferma, a declaração do sr. ministro da fazenda, de que era preciso um emprestimo para dar ao governo os recursos de que carece para satisfazer os seus encargos, mataria este projecto de lei, se elle ainda tivesse alguma vida. (Apoiados.)

Mas, dizia-nos o sr. ministro da fazenda, donde vem a difficuldade? A difficuldade vem do agio do oiro que attribuia a tres factores importantes: desconfiança, excesso da circulação fiduciaria e a concorrencia do thesouro.

Não ha duvida de que são estes os tres factores mais importantes para a valorisação da mercadoria oiro. Pergunto, o que fez o governo até hoje para conjurar estas causas a que se attribue a elevação do agio do oiro? O que fez o governo para grangear a confiança d'aquelles que vão fazer as suas capitalisações ao estrangeiro? Nada. (Apoiados.)

Cá dentro, o emprestimo de 1:800 contos de réis destinados ao pagamento das classes inactivas e que não passa de um expediente para alliviar o orçamento hoje para o sobrecarregar enormemente ámanhã.

Que fez lá fóra? Vendeu e empenhou valores do estado, dando assim a impressão de que o thesouro portuguez entrou n'um periodo de agonia. (Apoiados.)

A verdade é que o plano financeiro do actual governo tem-se reduzido unica e simplesmente a consumir o que lhe foi legado pelo seu antecessor, a pedir novos capitães emprestados e vender valores do estado, que constituiam um precioso recurso, de que se podia lançar mão dada a contingencia de um momento afflictivo e de sacrificio. (Apoiados.)

O que fez o governo para conjurar o mal que nos vem do excesso da circulação fiduciaria? Pois o governo está convencido de que o excesso da circulação fiduciaria é uma das causas mais poderosas da elevação do agio do oiro, e como procedeu n'estas circurnstancias?

Augmentou a circulação fiduciaria! Encontrou um limite de 63:000 contos de réis para a emissão; de notas do banco, e veiu pedir ao parlamento uma lei; que o auctorise a elevar essa emissão a 72:000 contos de réis.

Ha um grande mal no excesso da circulação fiduciaria, e o sr. ministro da fazenda arranca ao parlamento uma lei que auctorisa o banco de Portugal a elevar essa emissão de 63:000 contos a 72:000 contos de réis! Mais do que isso.

Como v. exa. sabe, essa lei não está em execução, porque o governo ainda não fez o contrato com o banco. (Apoiados.) E todavia o que aconteceu? Ê que o governo, pesando dia a dia sobre o banco de Portugal, porque o governo vive, como v. exa. sabe, au jour le jour, levou o banco a elevar a emissão de notas a 65:500 contos de réis, isto é, mais 2:500 contos de réis, sem auctorisação legal para isso. (Apoiados.)

N'este ponto não insisto, porque é melindroso de mais para sobre elle bordar largas considerações.

O que faz o governo para afastar a concorrencia do thesouro, de que resulta um augmento de agio? Vendeu titulos, empenhou titulos, não pesou no mercado. Mas como é que elle evitou ter de pesar ámanhã enormemente no mercado? Vendeu quasi todo o stock de titulos da divida externa que lhe davam oiro. Empenhou as obrigações do caminho de ferro que lhe deram oiro, restando-lhe uma pequenissima porção de titulos de divida externa, que ainda póde vender ou empenhar, e as acções da companhia de Moçambique, que creio que existem ainda na posse da fazenda. Depois aonde é que o thesouro vae buscar oiro? Ao mercado; e se o vae buscar ao mercado, como é que abasta a difficuldade, se o sr. ministro da fazenda reconhece o perigo do thesouro concorrer no mercado para a elevação da cambios? Essa previsão não é só minha; o cambio sobre Londres está a 35 1/2. (Apoiados.)

E essa previsão não é ao minha; o cambio está a 35 1/2, porque está no convencimento publico a idéa clara e positiva de que o governo em um praso mais ou menos curto ha de pesar no mercado, elevando o agio; e aqui tem a camara a rasão por que o cambio já está a 35 1/2 (Apoiados.)