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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de da ruina do paiz. Não abdicarei dos meus direitos de cidadão, mas prescindo de ser representante do povo, emquanto só houver representação do governo. Não me presto a ficções, e não quero nem posso concorrer para perpetuar a illusão, desde que só a minha presença me parece culpavel cumplicidade em actos que eu condemno o que me repugnam.

Se tomar esta resolução, eu darei ao meu paiz as rasões por que procedo assim, e hei de da-las plenas e com a clareza bastante, para que o meu procedimento seja comprehendido e pareça justificado.

Nunca me recusei, e estou prompto, a fazer ao meu paiz todos os sacrificios, e com a melhor vontade me prestaria a faze-los ainda maiores do que os que tenho feito, que não são pequenos para as minhas forças. É indispensavel, porém, para que eu os continue, que a minha intelligencia me não demonstre claramente que elles são completamente inuteis.

Offereço o pequeno concurso das minhas idéas, do voto, da palavra e do trabalho constante e assiduo, emquanto poder esperar que a minha dedicação aproveite para o bem da patria. Tenho prolongado, e prolongarei ainda a minha esperança até aonde me seja possivel sustenta-la. Com uma experiencia mais póde ficar de todo perdida, e então ninguem poderá estranhar que eu repute de mais a minha presença n'esta casa, e para o meu logar virá quem com maior vantagem me substitua e em melhor harmonia se sustente com os governos e com as maiorias politicas, se quizer concorrer para a consummação da obra, a que eu recuso associar-me.

A primeira questão, a que n'este programma me refiro, é a de fazenda, cuja solução eu não sei separar das considerações politicas e economicas. Eu trato em primeiro logar de habilitar os contribuintes para occorrerem sem grande sacrificio ás difficuldades do thesouro, e para isso os unicos meios parecem-me ser o desenvolvimento da riqueza e a suppressão de muitas despezas que reputo inuteis. A este respeito escrevi o seguinte, que me parece dispensar maior desenvolvimento:

«O nosso estado financeiro é muito grave, e póde tornar-se quasi desesperado, se o systema, por longo tempo seguido, não mudar immediata e radicalmente.

«A simples diminuição da despeza, o desejado augmento, da receita, não bastam; e muito menos, como vagos enunciados theoricos. O essencial é que um governo mereça a confiança do paiz e consiga leva-lo a acreditar no que elle actualmente não acredita; — na efficacia dos sacrificios que se exigem, e na sua applicação fiel e rigorosa a remediar o mal que todos sentem.

«A confiança no governo, acompanhada de algumas medidas de transição, levará facilmente o paiz a sacrificios extraordinarios, transitorios tambem, mas desde logo bastantes para o inteiro equilibrio do orçamento. A divida fluctuante deve consolidar-se a todo o custo. O novo systema de arrecadação, fazendo cessar a necessidade da representação do deficit, produzirá o adiantamento da receita corrente, evitando a creação de nova divida fluctuante, cancro que hoje não só consome em leonina usura uma grande parte dos rendimentos publicos, mas, peior ainda, é obstaculo invencivel ao desenvolvimento da riqueza nacional, porque nem a agricultura, nem o commercio, nem a industria encontram a juro modico dinheiro no mercado, onde não podem concorrer com o governo, que absorve todos os capitaes disponiveis, disputando-os em letras a curto praso, de facil realisação, com alto premio e garantidas com penhor de fundos publicos. Esta concorrencia é invencivel; por isso as fontes de riqueza parecem entre nós quasi exhaustas.

«Não é menos necessario, nem menos urgente, alliviar os contribuintes das despezas inuteis, que actualmente são as mais onerosas. Póde, com segurança, affirmar-se, que o orçamento do estado excederá em saldo a somma do deficit actual, e que os contribuintes pagarão menos do que hoje pagam, se pela simplificação dos serviços desapparecer a obrigação das despezas inuteis. Todos os que hoje têem um negocio a resolver em quasi todas as repartições publicas, nas superiores especialmente, pagam em despeza, em tempo e em trabalho inuteis, um tributo enorme, que, sendo o mais pesado para o contribuinte, nada aproveita ao estado. Temos tambem dez empregados mesquinhamente retribuidos, onde quasi sempre um bastaria depois de simplificado o serviço, podendo ser bem retribuido como é indispensavel que seja, e resultando ainda grande vantagem para o thesouro. Na organisação dos serviços ha tudo a fazer de novo, e é urgente reforma radical ou antes revolução profunda. Em quasi todos os ramos o systema actual não premeia o merito, incita ao ocio e ao desmazelo, quasi prohibe o esforço e a actividade, porque, em vez de recompensar e punir, iguala tudo na retribuição e nas promoções. A concentração da responsabilidade, systema inglez, entro nós experimentado por excepção, mas sempre com vantagem; a absoluta prohibição de accumulação de funcções; a larga remuneração a par da severa responsabilidade; a combinação do maior interesse dos funccionarios com a breve execução dos serviços, tornando a simplificação dependente d'este poderoso incentivo; a plena garantia aos que bem servem; a prompta punição aos que servem mal e aos que muitas vezes nem exercem, são os meios indispensaveis para substituir pela boa ordem o cahos existente. Organisados devidamente os serviços, ver-se-ha evidentemente, que cada contribuinte, reunidas as actuaes despezas inuteis ás contribuições publicas, pagará menos do que hoje paga, e o orçamento em vez de deficit, ha de ter saldo importante».

Seguem-se, como reformas politicas, a do poder judicial e a reforma parlamentar. A segunda está sufficientemente indicada pela legislação dos dois paizes, a que Se faz expressa referencia. A primeira demandaria grande desenvolvimento, que a estreiteza do tempo me obriga a reservar para occasião opportuna, em que especialmente me occuparei d'este assumpto importantissimo. Todavia1 desde já deixo indicadas as bases principaes. O proprio poder judicial, na sua organisação superior, será encarregado dos actos, que hoje, por serem attribuição do executivo, affectam a independencia do judicial. Algumas medidas de repressão e os meios de vigilancia, que hoje não podem entregar-se ao poder executivo e que são indispensaveis para a boa administração da justiça, podem sem difficuldade entregar-se ao judicial devidamente organisado, que, pelo seu tribunal superior, zelará simultaneamente a independencia e a responsabilidade que devem ter todos os membros do poder judicial. As leis organicas podem realisar facilmente o pensamento da reforma que proponho.

«Dependem as mais importantes reformas da previa reforma politica. O poder judicial, aquelle que mais tem reisistido á geral dissolução, aquelle que não poucas vezes tem salvo não só as liberdades individuaes, mas até algumas instituições, demanda nova organisação; que na pratica realise o que em theoria se estabeleceu na lei fundamental. Pertence-lhe pela carta a independencia absoluta. Pelas leis organicas está hoje dependente do executivo nos despachos, nas promoções e nas transferencias. Está, alem d'isso, miseravelmente retribuido. A administração da justiça, que deve ser prompta, proxima e barata, é muitas vezes o contrario, morosa, distante, difficil e carissima. É urgente firmar plenamente a independencia do poder Judicial, estabelecer-lhe a dotação correspondente ás suas elevadas funcções, e torna-lo inteiramente distincto dos outros poderes.

«A reforma parlamentar é, talvez, a primeira das mais instantes necessidades. Uma lei eleitoral, que assegure livre e certa a verdadeira representação, tanto da maioria como das minorias, e que, deixando a opção, estabeleça rigorosas as incompatibilidades, adoptando o systema da Belgica; e a camara alta electiva tambem pelo systema da America do Norte, salvas pequenas modificações, são reformas indispensaveis.»