SESSÃO N.° 84 DE 16 DE JUNHO DE 1899 3
O dr. Taine, baseando-se nas estatisticas d´essas companhias, conclue que o alcoolismo diminue a vida humana de seis turnos, pelo menos.
Embora não possamos conferir a esta conclusão um rigor scientifico indiscutivel, é certo que as investigações do Taine são muito para attender e meditar, principalmente porque se conjugam com os conhecimentos actuaes ácerca da pathologia do alcoolismo.
Ora, sr. presidente, alongar a vida por mais seis annos, só pelo facto da abstinencia do alcool, ou simplesmente pela regularidade no seu uso, é, sem duvida, um avanço social de proeminente alcance, não só para o individuo, mas para a especie humana. (Muitos apoiados.)
Com respeito á tuberculose, assinalaremos ainda que o obituario d´esta doença tem diminuido nos grandes centros de população, onde era mais mortifera, e principalmente em Lisboa. A ultima estatistica mostra-nos, para Lisboa, o seguinte quadro, referido a annos economicos:
1895 a 1896.............. 1:704 obitos
1896 a 1897.............. 1.423 »
1897 a 1898.............. 1:328 »
Por consequencia, em dois annos apenas, a mortalidade baixou de 376 obitos. É um resultado digno de menção, e tanto mais que não podemos attribuil-o á melhoria das condições economicas da população lisbonense, onde os generos de primeira necessidade para a alimentação das classes operarias e para occorrer á sustentação do proletariado, têem augmentado no preço e na falsificação. Este resultado, sr. presidente, devemos lançal-o á conta da hygiene, que deu agigantado passo, na capital, com o estabelecimento do posto de desinfecção publica.
Depois que este posto foi instituido, a tuberculose começou a declinar. É isto, sr. presidente, uma prova bem manifesta da poderosa acção dos elementos hygienicos na lucta contra a tuberculose. D´este beneficio cabe a gloria ao sr João Franco.
S. exa. foi o ministro que referendou o decreto, creando o posto de desinfecção, e este foi, talvez, o maior serviço que o sr. conselheiro João Franco tem prestado á cidade de Lisboa e ao paiz. E já que alludo ao sr. conselheiro João Franco, apraz me declarar que tenho pelo illustre leader da minoria, e um dos seus oradores mais distinctos, a consideração e o respeito que me merece o estadista honesto e o homem honrado, (Apoiados.} embora eu desadore os processos politicos de s. exa., que continuarei combatendo com vigor emquanto elles se distanciarem tanto da norma liberal e ordeira que norteia o partido progressista. Mas, afastemos para longe os azedumes da politica, visto que se trata agora de um assumpto social de levantado interesse. (Apoiadas.)
Sr. presidente, entrando propriamente na materia do meu aviso previo, começarei por notar a carencia das estatisticas relativas ao alcoolismo. Para este ponto chamo a attenção do sr. ministro da fazenda.
Urge a organisação séria e minuciosa de uma estatistica por onde se possa avaliar directamente a marcha do alcoolismo no paiz. O que existe, disperso pelas repartições do estado, é de precaria confiança, mas assim mesmo, sr presidente, constitue presumpção bastante para justificar o signal de alarme que hoje venho fazer resoar perante o governo e a nação. (Apoiados.)
Relembrarei, comtudo, que o sr. Ressano Garcia, n´um excellente discurso sobre a questão dos alcooes, pronunciado n´esta camara, na sessão legislativa de 1893, referiu-se aos effeitos do alcoolismo, adduzindo algumas estatisticas para demonstrar que o nosso paiz não estava isento do terrivel flagello.
N´essa epocha, porém, o avião foi recebido desdenhosamente.
É o systema usado nos negocios publicos quando não agitam ostensivamente as multidões.
Mais tarde, em 1898, um medico illustrado, sr dr Alfredo de Figueiredo, n´um relatorio apresentado ao congresso nacional de medicina, reunido em Lisboa, accentuava mais frisantemente o crescimento do alcoolismo em Portugal. Os echos d´esse, congresso, porém, morreram dentro das paredes da sala, onde se constituiu a assembléa.
Hoje, os elementos estatisticos directos e indirectos, ainda que muito imperfeitos, continuam a revelar-nos o successivo desenvolvimento do consumo das bebidas alcoolicas, com todas as consequencias que d´ahi derivam.
Sr. presidente, um dos meios indirectos que mais justamente evidenccia a marcha do alcoolismo, é a criminalidade. (Apoiados.)
Com effeito, em todos os paizes a curva evolucionista da criminalidade segue parallelamente á do alcoolismo.
De entre as causas, mais geralmente consideradas como geradoras do crime, o alcoolismo é a unica que não soffre excepção na sua universalidade. Assim, têem os criminalistas imputado ao progresso da civilisação o movel do crescimento dos crimes. Ora, é sabido que a criminalidade tem augmentado na França, na Italia, na Allemanha, mas tem diminuido na Inglaterra, na Belgica e na Suissa, nações não menos civilisadas que as primeiras.
A fórma de governo, outro factor reputado como causa productiva do crime, não possue tambem a generalidade de uma regra, O crime cresce na França e decresce na Suissa, ambas republicanas; desenvolve-se na Italia, na Hespanha, na Russia; diminue na Inglaterra e na Belgica, todas monarchicas.
Outra causa apresentada como fomentadora da criminalidade - a instrucção - igualmente carece do cunho de uma proposição geral. Se na França e em Portugal o crime tem acompanhado a diffusão das escolas, é certo que a Inglaterra apresenta nos facto diverso.
Depois da lei de Forster, a população escolar subiu de 1.500:000 de individuos a 5.000.000. Ao mesmo tempo o algarismo dos criminosos, especialmente dos delinquentes menores, descia de 14:000 a 5:000! É significativo. (Apoiados.)
Comtudo, eu creio, sr. presidente, que não é tanto a quantidade de instrucção, como a sua qualidade, que póde influir na marcha da criminalidade. E isto explica, decerto, o desaccordo entre os differentes paizes. (Apoiados.)
Na verdade, se o crime consiste, como diz Garofalo, na offensa ao senso moral da sociedade, é pela educação moral que chegaremos a nivelar o individuo com o meio social onde tem de viver, e assim prevenir o apparecimento do crime.
Parece-nos correctamente logico. (Apoiados.)
Applicando agora, sr. presidente, os principios expendidos, ao nosso paiz, vemos que não é licito attribuir a qualquer dos referidos factores da criminalidade o grande augmento do crime, em Portugal, e que é tão consideravel, que ha dezoito annos para cá tem duplicado Effectivamente, nem a fórma de governo ha mudado, nem a civilisação tem avançado tanto, nem a instrucção padece de um predominio notavel de qualquer dos elementos, intellectual ou moral, que justifiquem uma influencia criminal.
Vamos, pois, procurar a causa d´este crescimento n´outra parte.
Como disse, existe sempre perfeita concordancia entre a evolução do crime e do alcoolismo.
Para o demonstrar respiguemos alguns exemplos dos muitos que nos offerecem as nações do globo
Em França, segundo o relatorio da commissão de classificação dos recidivistas, publicado em 1895, a criminalidade tomou incremento desde 1880, epocha em que se permittiu a liberdade da venda de bebidas alcoolicas.
Na Hollanda, a criminalidade decresceu depois da publicação da lei que restringiu o numero de casas de con-