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SESSÃO N.° 84 DE 16 DE JUNHO DE 1899 5

mente na população; comtudo, deve pôr-nos de sobreaviso.

Retomando, porém, o fio das minhas considerações ácerca da presumpção do alcoolismo, em Portugal, pelos dados da criminologia, vamos desenrolar perante a camara os numeros eloquentes que a estatistica nos offerece.

Como ha pouco fiz notar, n´estes ultimos dezoito annos a criminalidade tem duplicado.

Compulsando as estatisticas vê-se que esse consideravel augmento é devido principalmente aos crimes de embriaguez, ferimentos e furtos.

Por outro lado, o numero das reincidencias nos delictos avulta muitissimo, mórmente nos menores.

Assim, para 100:000 habitantes, de diversas idades, houve, annualmente, no quinquenio de 1889 a 1890, condemnações pelos crimes de:

Furtos.................................. 473,6

Ferimentos e offensas corporaes............... 467,6

Embriaguez............................... 47,4

Vadiagem................................. 41,4

Homicidio................................. 6

Infanticidio................................ 1,6

D´qui se infere que, á excepção do furto, mais denunciador da miseria publica, a frequencia dos crimes é attributo da embriaguez e das rixas e desordens occasionadas por ella.

Vejamos em seguida o quadro das reincidencias.

Temos para 1:000 criminosos:

Adultos. 320

Menores. 499

Como a nossa juventude se vae depravando!

No proprio quadro criminal da embriaguez dá-nos a estatistica, para 100:000 habitantes:

Menores de 20 annos. 105

Adultos............ 57

É instructivo o confronto, mas de um prenuncio agourento para o futuro da nossa sociedade. (Apoiados}.

A estes elementos demonstrativos vem addicionar-se as informações policiaes de Lisboa, que, até 1889, registavam 2:281 prisões por embriaguez, annualmente; e, hoje, esse algarismo eleva-se a 2:800.

No resto do paiz nada podemos avaliar; apenas conjecturas baseadas na inspecção perfunctoria das cousas.

Ora, sr. presidente, é manifesto que todos estes numeros e estas rasões se referem ao alcoolismo grosseiro, plebeu, d´esse que anda á mão da policia. E, comtudo, ha outras especies de alcoolismo. Não fallarei do alcoolismo aristocratico, nem esse póde figurar na estatistica. (Riso.)

Mencionarei, no entanto, o alcolismo latente, que é tão funesto como o outro, e mais insidioso.

Não se pense que um individuo, pelo facto de ingerir pequenas doses de alcool, não é alcoolico; porque se o fizer habitualmente, os effeitos far-se-hão sentir lentamente, mas explodirão logo que o organismo seja atacado por outra molestia, a qual tomará a feição caracteristica das doenças dos individuos alcoolisados.

É isto de observação quotidiana, nos dominios da clinica.

A mesma penuria estatistica, ou ainda, maior, do que para a embriaguez, se faz sentir no computo do consumo de bebidas alcoolicas, em todo o paiz. Sómente pude obter, devido á obsequiosidade de um funccionario distincto do ministerio da fazenda, o sr. Rangel de Lima Junior, a nota do consumo em Lisboa, relativa aos annos de 1896, 1897 e 1898.

Mas, essa nota é de molde a comprovar o meu intento

Diz-nos ella que o consumo do alcool e dos licores diminue de anno para anno. Ao contrario, o consumo da aguardente subiu de 31:965 litros a 32:028; e, para o vinho, exhibe-nos o quadro seguinte:

1896 1897 1898

Litros Litros Litros

Lotação Até 15°.. 30:197,666 31:780,729 30:227,444

16º a 19º 179,615 278,036 318,343

Estes algarismos, sr. presidente, são dignos de toda a ponderação. O consumo cresce, em maior escala, sobre vinhos de 16° a 19°; consumo que augmentou, em dois annos, de 138:728 litros!

Isto quer dizer que a população de Lisboa bebe vinhos adulterados com aguardentes industriaes, o que constitue uma dupla intoxicação.

Não temos vinho puro com a força alcoolica que nos diz a estatistica, e, por conseguinte, é patente a sophisticação.

É escusado encarecer o facto, e ao governo cumpre exercer a maior vigilancia e mais escrupulosa fiscalisação sobre a venda d´estes vinhos, de uma nocividade incontestavel. (Apoiados.}

Tudo o que até aqui tenho exposto, sr. presidente, deve levar-nos ao convencimento de que o alcoolismo tenta apossar se rapidamente das nossas mais valiosas energias e que urge embargar-lhe o passo.

Falta-nos a demonstração perfeita e directa que só os dados de uma estatistica, conscienciosamente elaborada, podem fazer; mas chegámos á maxima probabilidade. (Apoiados )

Vejamos agora os meios de combate.

Sr. presidente, os processos que lá fóra se têem posto em pratica para combater o alcoolismo são de differentes ordens.

1.° Prohibição do fabrico e venda de bebidas alcoolicas.

Este systema, porém, não tem dado sensiveis resultados Recentemente, a Russia tomou para o estado o monopolio do alcool, mas os beneficios ainda não tiveram tempo de manifestar-se.

2.° Limitação das casas de venda.

3.° Augmento das respectivas taxas de licença.

Estes dois processos são os que têem produzido resultados mais satisfactorios.

Em França, ha uma casa de bebidas alcoolicas para trinta habitantes; e uma proporção extraordinaria; ao passo que os Estados unidos decretaram ha pouco que houvesse uma para mil.

A Suissa mostra se preoccupadissima, porque possue uma para setenta e cinco.

Não sei se Portugal irá diante da França.

Sei que, em 1893, pelos mappas da policia civil, havia, em Lisboa, uma casa de bebidas para setenta e quatro habitantes.

Hoje, não pude colher elementos de apreciação; mas pelo que se observa em toda a parte, poucas são as lojas onde não se ostenta a garrafa-reclamo ou o ramo suggestivo. (Apoiados - Risos.)

Finalmente, contra o alcoolismo organisam-se sociedades de temperança, de iniciativa individual e particular.

Bem conheço, sr. presidente, que a minha voz não calará no animo do paiz, com a facilidade e geral agrado que coube ao meu illustre collega, o sr. dr. Moreira Junior, não só pela falta de eloquencia apropriada...

O sr. Moreira Junior: - Não apoiado.

O Orador: - Mas, principalmente, porque a repressão do alcoolismo vae ferir inconfessaveis interesses do commercio, licito ou illicito, de tal modo, que será difficil a um governo arcar com o egoismo mercantil d´essa classe numerosa o que, sobretudo, pesa na balança eleitoral.