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38 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

dirigido n'aquella occasião ao presidente do Transwal, mas apesar de mais novo, para não azedar o debate, entendi, sobretudo, que não devia discutir o alludido telegramma nem pôl-o em parallelo com a minha modesta moção. Uma vez, porém, que s. exa. fallou em balança, permitta-me que siga as suas pisadas e acceite os seus conselhos e que, portanto, diga que este paragrapho do projecto de resposta ao discurso da corôa em que se allude á regencia de Sua Magestade a Rainha, não tem rasão de ser. Para que se ha de dizer que a camara, de inteiro accordo com o governo, testemunha a Sua Magestade a Rainha o seu reconhecimento pela maneira por que a mesma augusta senhora se houve no periodo em que assumiu a regencia effectiva do reino?

Pois se o governo entendeu que não devia fazer menção no discurso da corôa, d'esse periodo, ou da regencia de Sua Magestade a Rainha, por que é que a camara se ha de ligar ao governo e acompanhal-o n'um assumpto que elle entendeu que é desnecessario, que era inutil, porque é que ha de referir-se a um facto que o governo entendeu que não devia pôr na boca d'El-Rei?

Para que havemos de ser mais papistas do que papa? Faça a camara a sua moção e não envolva n'ella o governo.

Mas, sr. presidente, falla-se aqui na viagem de Sua Magesta El-Rei ao estrangeiro, e é sabido de todos que essa viagem foi um acto perfeitamente official, e nem podia deixar de ser assim, desde o momento em que esse acto tomou a feição que todos nós conhecemos.

Os jornaes affectos ao governo, n'essa epocha, declararam que os srs. ministros assumiam por completo todas as responsabilidades dos acontecimentos que se prendiam ou podessem relacionar com a viagem de El-Rei; e sendo assim, não deve ninguem estranhar que eu peça algumas explicações referentes a essa viagem ou ás consequencias d'ella.

Não está presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros, o que muito sinto, mas emfim, como o chefe do governo é o sr. presidente do conselho, basta que s. exa. me diga como foi preparada essa viagem, e qual o objectivo d'ella.

Diz toda a gente que essa viagem teve por fim o estreitar relações com as potencias estrangeiras. Se a viagem foi para estreitar relações, permitta-me v. exa. que eu diga que acho extraordinario o modo como acabou essa viagem.

Sendo uso e costume, em questões d'esta ordem, preparar o terreno e sondar os gabinetes estrangeiros, é singular que El-Rei se visse obrigado a estar em Paris durante vinte dias, por assim dizer á espera das ordens do governo.

O sr. Conde de Lagoaça: - Apoiado.

O Orador: - A camara deve lembrar-se de que os jornaes publicaram o itinerario da viagem de Sua Magestade, que noticiaram as horas a que devia sair de qualquer ponto, e aquellas a que devia chegar a outro, as capitaes que tencionava visitar e, no fim de contas, Sua Magestade, chegado a Paris, fica ali vinte dias á espera das ordens do governo, isto é, o governo collocou o chefe do estado na deploravel situação de não saber como resolver as difficuldades levantadas. Chovem telegrammas, amontoam-se as nuvens no horisonte e, finalmente, Sua Magestade deixa de visitar seu do o Rei de Italia. Aqui, sr. presidente, cabe dirigir uma pergunta ao governo.

Eu sou conservador e liberal, mas entendo que ha considerações a que se não póde faltar.

Então o governo combina e planeia a visita do chefe do estado a seu tio, em Roma, e Sua Magestade sáe de Portugal com o pretexto de estreitar relações; mas, pergunto eu: e o chefe da igreja? Pois não teremos nós as melhores relações com a igreja e com Roma? Não é justamente em Roma que nós temos uma legação com um representante que tem a categoria de embaixador? E porque a temos? Pela excepcional posição do chefe da igreja em relação a Portugal.

Pois nem ao menos serviu, n'este caso, ao governo, a lição do passado? Não sabem os actuaes ministros, como deve constar de documentos que existem nas secretarias, que na occasião de Sua Magestade a Senhora D. Maria Pia, ser chamada por um telegramma, para ir receber a ultima palavra de seu pae que agonisava, o Rei soldado, Ella, afilhada do Summo Pontifice, e tendo ído a Roma não para se divertir nem para estreitar relações, mas pare ir ver, como já disse, seu pae nos ultimos momentos de sua vida, recebeu do Summo Pontifice aviso de que lhe era inteiramente impossivel receber a sua afilhada, apesar de ter por ella a maior estima e consideração, porque Sua Magestade tinha ido alojar-se no Quirinal?

Com effeito, sr. presidente, as cousas são o que são; e desde o momento em que a Senhora D. Maria Pia tinha ido alojar-se no Quirinal, era evidente que o Summo Pontifice não podia receber à pessoa da Rainha de Portugal, pelos motivos que todos conhecem e que escuso de repetir.

Pois então, existe este precedente, e o governo, que d'elle deve ter perfeito conhecimento, expõe El-Rei ao facto de se demorar vinte dias em Paris, e de ter de realisar a visita a seu do e a um paiz com cujo governo nós estavamos nas melhores relações, e que, em todas as circumstancias, nos havia prestado relevantes serviços, interpondo os seus bons officios em todas as questões internacionaes que tivemos?!

É possivel que o sr. ministro dos negocios estrangeiros, como mais novo, apesar de diplomata d'elite, não conheça estes factos; mas o sr. presidente do conselho que tem sido bom mentor por certo os conhecia.

Então El-Rei vae viajar para estreitar relações, e no fim volta com a triste bagagem, permitta-se-me a expressoo, de ficarem interrompidas as nossas relações com a Italia, e no discurso da corôa passa-se por isto ao de leve, como se fosse uma cousa muito simples?

O discurso da corôa contem até, a proposito d'este facto, uma expressão muito curiosa: diz elle que - circumstancias occasionaes impediram El-Rei de ir á Italia.

Mas, sr. presidente, quem provocou essas circumstancias occasionaes? Foi El-Rei? De certo que não. El-Rei está completamente fora da discussão. Foi, portanto, ainda o seu governo quem provocou essas circumstancias occasionaes, entendendo que El-Rei devia ir a Italia e não prevenindo o triste desfecho da viagem.

Estava preparado o terreno, mas mais tarde allega-se que circumstancias occasionaes impediram El-Rei de fazer essa viagem!

O resultado foi, sr. presidente, como todos sabem, o rompimento de relações com aquelle paiz, rompimento que, me parece, teria sido muito mais grave se não fossem os bons officios de alguem.

Esperava eu, porém, sr. presidente, que ao menos no discurso da corôa se dissesse alguma cousa sobre os esforços que o governo tem empregado para reatar as relações e desfazer quaesquer attritos desagradaveis para nós. Nem uma palavra a tal respeito.

Deus me livre de ir buscar aos jornaes estrangeiros as apreciações que sobre o assumpto se fizeram. Ellas não eram desagradaveis para o nosso paiz, mas eram-o, e muito, para o governo. Bem basta, porém, o que os jornaes estrangeiros disseram; e não serei eu quem venha repetil-o aqui.

Aqui está a rasão por que eu pedi a palavra a v. exa.

Eu estou certo que o nobre presidente do conselho dará explicações que me satisfaçam e que desvaneçam por completo a má impressão que me causou o desastre da viajem de Sua Magestade.

Sr. presidente, agora dirijo-me ao sr. relator do projecto de resposta ao discurso da corôa.