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56 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Reconheço, pela minha longa experiencia, que estas alterações da ordem não podem dar bom resultado, até porque, geralmente, as pessoas que as promovem, não dão garantia, de que queiram reformar o paiz e as instituições, n'aquillo em que devem ser reformados, tendendo unicamente a substituir pessoas por pessoas, ficando tudo no mesmo estado; mas uma cousa e não querer sedições, outra e approvar todos os meios empregados para as debellar.

Quanto ao modo por que se procedeu, quando esta camara, sem ser convocada como camara politica, se constituiu em tribunal de justiça para tratar do processo de um digno par, que se diz implicado n'estas conspirações, já eu tratei d'este assumpto, alem de outros dignos pares, que, commigo, combateram a reunião da camara como tribunal de justiça, sem se ter verificado a garantia da carta. A camara decidiu-se contra as praxes seguidas, e deu occasião a que se duvide da legalidade dos meios empregados para se processar o digno par.

Não pretenda agora renovar esta questão, e direi só que mal se alcançam os fins da justiça, quando se dá occasião a duvidar de que os meios empregados para a obter foram apaixonados.

Assim, sr. presidente, permitta-me a camara que eu lhe faça algumas reflexões, com as quaes, me parece, não sairei fora da ordem, porque n'esta occasião só procuro, quanto em minha pequena intelligencia cabe, apresentar diversos factos que se têem dado e vão correndo, para d'elles deduzir aquellas consequencias que julgo convenientes, a fim de mostrar que nem tudo que se tem feito tem sido o que deveria ter praticado em conformidade com os bons principios.

O artigo 120.° da carta constitucional diz que "os juizes de direito são perpetuos"; do que todavia se não entende que não possam ser mudados de uns para outros logares, pelo tempo e maneira que a lei determinar.

O § 11.° do artigo 145.° da referida carta diz que "será mantida a independencia do poder judicial".

Isto estabelece-se para dar aos juizes toda a independencia.

Os pares do reino tambem exercem funcções de juizes, nos processos crimes das pessoas que devem ser julgadas n'esta camara. Não podem ser mudados, porque são juizes com attribuições especiaes; mas, não estarão elles na categoria dos outros membros do poder judicial, que a carta estabelece que sejam perpetuos para poderem ser independentes?

Poderá pois algum digno par aceitar o emprego de procurador geral da corôa, e substituir as augustas funcções de juiz (que o são), pelas de accusador, que lhe são impostas pelo artigo 42.° da carta constitucional?

Não se poderá dizer que o par do reino, que substituiu as funcções de juiz pelas de accusador, tivera em vista, fazendo a escolha, tornar a accusação mais forte ou enfraquece-la?

Alem de que, este procedimento não será contrario á perpetuidade dos juizes, que é uma garantia para o cidadão accusado, e de independencia para todos os membros do poder judicial, para que as suas decisões sejam justas?

Outro facto acontece, que não posso deixar de mencionar á camara, por isso que é de summa gravidade.

O actual sr. presidente da camara electiva é juiz do supremo tribunal de justiça, e como tal é agora relator de um processo em que tem de ser julgado o sr. visconde de Ouguella, processo que é inteiramente politico.

O presidente da camara dos senhores deputados é uma pessoa essencialmente politica, e então como 6 que póde ser juiz em um processo de crime politico?

Eis o resultado que se tira das accumulações dos diversos empregos do estado com o de membros do parlamento, contra o que eu, por muitas vezes, me tenho pronunciado; mas ha de vir tempo em que se reconheça que tenho rasão, quando me levanto contra taes abusos, que outro nome não podem ter similhantes factos.

Sr. presidente, ainda que tenho a desgraça de não ser jurisconsulto, não posso deixar de dizer a minha opinião sobre estes assumptos.

A reforma judiciaria de 1841, titulo 19.°, capitulo 2.°, estabelece a maneira por que no supremo tribunal de justiça se deve proceder a respeito de suspeições dos seus juizes.

Se esta questão a que alludi, ali fosse proposta pelo advogado do sr. visconde de Ouguella, desejaria muito ver a decisão do tribunal composto de caracteres tão conspicuos, que todos respeitâmos e consideramos.

Seja-me permittido dizer n'esta occasião algumas palavras a respeito do que se passa em Inglaterra, com relação a incompatibilidades. N'aquelle paiz, os juizes, por uma disposição muito antiga, tanto da Inglaterra propriamente, como da Irlanda e da Escocia, não podem ser membros do parlamento. Modernamente, depois do bill de sir Roberto Peei sobre a propriedade da Irlanda, crearam-se certos juizes para dar execução á lei, e esses juizes ficaram tambem inhibidos de poderem ser membros do parlamento.

Estes é que são os bons principios; e porque se tem aberrado d'elles é que as cousas, entre nós, têem chegado ao estado, em que as vemos.

Claro está que, nas apreciações que tenho feito com relação aos dois illustres cavalheiros a que me tenho referido, o meu intuito não tem sido de modo algum faltar-lhes ao respeito que merecem o que lhes devo, pelas suas qualidades pessoaes; porem, quanto ás circumstancias politicas em que se acham esses, posso eu avaliar e hei de faze-lo, com a liberdade propria de um membro d'esta camara.

Sr. presidente, o discurso da corôa tambem se refere a alguns tumultos que têem agitado o paiz em diversas partes, mas diz que os implicados já estão entregues á acção judicial. Tudo isto mostra que o paiz está muito agitado, e que de modo algum se póde confundir a maneira por que Sua Magestade foi recebido nas provincias, com a approvação do systema seguido pelo governo.

Agora vou chamar a attenção da camara sobre um paragrapho do discurso da corôa, que exige, quanto a mim, uma particular attenção, e um reparo em especial. O periodo a que me quero referir é este:

"No intervallo das sessões, usando das faculdadas concedidas no artigo 15.° do acto addicional á carta, decretou o meu governo varias providencias de caracter legislativo, que todas vos serão opportunamente apresentadas.

"Tanto estas, como as que ficaram pendentes, e que tambem devem ser presentes á camara, por ella serão devidamente avaliadas."

O paragrapho seguinte ao que li promette economias, e diz: que "o ministro da fazenda, apresentando o orçamento, submetterá á attenção do parlamento diversos projectos de lei que alteram parte da legislação tributaria, alliviando da contribuição alguns productos de geral consumo, elevando e dando nova fórma a outras imposições para as tornar mais productivas, etc.!!"

Este periodo, bem exemplificado, refere-se especialmente á proposta apresentada pelo sr. ministro da fazenda sobre o real d'agua, e novo imposto sobre a conducção das bebidas, alcoolicas.

Parece impossivel que houvesse tal lembrança, para sobrecarregar de impostos aquellas bebidas, embaraçando assim o commercio, e causando aos proprietarios grandissimo incommodo e despeza.

Não direi mais nada sobre este projecto, mas sómente que me associo completamente a todas as manifestações exaradas nas representações feitas pelos povos contra o tal projecto, que espero não chegue a esta camara, porque são bem patentes e visiveis as peias e os embaraços que d'elle resultam para a agricultura e para o commercio.

N'esta occasião, por isso que é a propria para se poder avaliar em toda a sua generalidade o que póde actuar sobre o andamento dos negocios publicos, que por qualquer