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SESSÃO N.° 14 DE 9 DE JUNHO DE 1891 7

ferro que partindo das fronteiras atravesse a colonia portugueza até á bahia de Lourenço Marques.»

Eu beijo respeitosamente a mão da gentil dama que escreveu este primoroso artigo, sem saber que era em minha defeza.

Sr. presidente, o que é este tratado que estamos discutindo comparado com o anterior?

O ultimatum, de 11 de janeiro foi uma fatalidade, o de 20 de agosto, para o não classificar mais acremente, foi uma infelicidade, e este que estamos discutindo, e que se vae votar, é, na minha humilde opinião, uma expropriação violenta a favor da Inglaterra.

Sr. presidente, v. exa. e a camara que não são estranhos á politica seguida n'estes negocios, sabem quando foi que se desenvolveu a questão de Lourenço Marques.

O tratado com os Boers foi que dispertou mais acentuadamente a ambição da Inglaterra.

Lembro-me, sendo ainda eu ministro, dizer, que á vista dos documentos existentes qualquer questão que houvesse seria resolvida a nossa favor.

Assim succedeu com a arbitragem acceite pela Inglaterra e resolvida pela republica franceza. O nosso direito, á vista dos documentos, era incontestavel.

Quer v. exa. saber quaes eram já as intenções da Inglaterra n'essa epocha?

Está aqui um collega nosso e mui velho amigo que de certo se lembra do que lhe disse em epocha mais remota o ministro inglez, que Lourenço Marques havia de ser por força da Inglaterra. Creio que não será preciso appellar para o testemunho, de s. exa.

Sr. presidente, a politica seguida pelos nossos governos nos ultimos tempos tem sido realmente infelicissima, principalmente desde 1888.

Este negocio podia ter terminado perfeitamente então, pela arbitragem offerecida pela Inglaterra, se não fosse a politica adoptada n'aquella epocha pelo governo progressista, porque a Inglaterra estava então disposta a fazer um tratado comnosco com pouca differença nos mesmos termos em que se fez o tratado com o Transvaal, com a condição de que seria livre a navegação do Zambeze.

Então era certa a benevolencia da Inglaterra, mas o illustre ministro que geria n'aquella epocha a pasta dos estrangeiros entendeu que não devia aproveitar aquelle ensejo; contava com a influencia da Allemanha, que por fim lhe fugiu, o que foi para nós ainda uma maior desgraça.

O gabinete de Lisboa, contando que a Allemanha o auxiliasse, não quiz entrar em negociações sobre essas bases em tal momento, e deu a entender ao sr. Petre que preferia deixar as cousas como estavam a assignar qualquer accordo que não desse satisfação ás pretenções territoriaes de Portugal. Fatal illusão.

A Inglaterra tinha que se vingar e assim succedeu.

Em relação ao tratado com o Transvaal, sobre o qual se disse que era a origem de todos os nossos males, eu vou ler á camara a opinião do marquez d'Avila quando no parlamento se tratou d'este negocio.

Note a camara que o governo d'aquella epocha tinha incluido nas leis da dictadura todas as leis do governo transacto, inclusivamente o tratado a que acabo de me referir, ao que eu me oppuz tenazmente.

O marquez d'Avila, dizia o seguinte;

«Que o principio que se tinha estabelecido (era então o marquez de Sá da Bandeira presidente do conselho) no seio da commissão de accordo com o governo, foi pedir a approvação das medidas que estavam em execução e como este (o tratado) ainda não estava em execução, porque as ratificações não estavam trocadas, entendeu-se que o tratado não devia ser incluido, mas se a camara o queria eliminar se não oppunha, porque, como já tinha dito, a intenção do governo era vir pedir auctorisação para a sua ratificação.»

O sr. Costa e Silva replicou:

«Que não fazia questão politica, mas desejava saber sé o sr. presidente do conselho se compromettia a apresentar e a fazer votar uma proposta de lei para a ratificação de um tratado tão vantajoso e que era perigoso incluil-o na proposta do governo.»

O marquez d'Avila respondeu Affirmativamente, e na sessão de 10 de dezembro de 1870, como já dissemos, foi submettido á approvação do parlamento, votado e sanccionado depois pelo Rei.

O sr. Pinto de Magalhães, hoje conde da Arriaga, dizia:

«Que o tratado tinha sido feito em 1869 e que o praso fatal terminava em 29 de julho de 1870, e que o governo ou estivesse em dictadura ou não, o devia sanccionar; - que em 1836 o governo da metropole auctorisou o governador de Moçambique para enviar agentes áquella republica a fim de elaborarem as bases de um tratado que era de incontestavel vantagem para Portugal.»

Na sessão de 10 de dezembro de 1870, expuz as seguintes idéas:

Que a ratificação de um tratado que tem parte de soberania interna e parte de soberania externa se não podem annullar.

O acto de soberania interna, por ser internacional, não está dependente de uma das partes, mas sim de ambas.

Que estes principios de direito internacional, professados por grandes auctoridades como Vattel e Heffter, deviam ser tomados na maior consideração.

Em seguida mandei para a mesa uma proposta, a fim de ser eliminado o n.° 5.° § unico do artigo 2.° do projecto do governo em discussão. Era o tratado.

Era então presidente do conselho o marquez de Sá da Bandeira, e v. exa. sabe que o illustre general não era homem que transigisse n'esta questão, se o tratado fosse mau.

O marquez de Sá da Bandeira, que tinha a este respeito o seu nome compromettido nas consultas do conselho ultramarino, saíu do ministerio, e em julho de 1870 o marquez d'Avila, tratando-se d'este assumpto na camara, disse o que já li á camara.

Por consequencia, tenho provado que o tratado feito com os Boers tinha-nos collocado na melhor posição possivel.

Quer v. exa. saber o que é o tratado que estamos agora a discutir?

Basta ler um periodo do discurso que lord Salisbury proferiu ha poucos dias, e que vem publicado no Jornal do commercio de hoje. Diz elle que o que é habitavel por brancos ficou para a raça anglo-saxonia, que é mais activa e mais robusta; o que não póde ser habitado pelos brancos, fica para os portuguezes. Isto é não fallando já noa filões dos territorios que agora são cedidos á Inglaterra.

Tambem não deixa de ser curioso um telegramma vindo de Londres em 8 do corrente, communicando que o Standard, que advoga a politica do governo inglez, publicou um artigo, no qual se diz que as idéas modernas exigem, não sómente a conquista dos paizes barbaros, mas tambem a civilisação d'elles, e que Portugal deverá lembrar-se d'isto, visto que a convenção do Zambeze contem clausulas que o obrigam a civilisar as suas possessões africanas, aliás terá de deixar que o faça, em seu logar, algum vizinho mais emprehendedor.

Note-se bem o que diz Salisbury: Fica para os portuguezes o que não póde ser habitado pelos brancos.

A alta politica ingleza inspira-se por certo, não nas theorias moraes e metaphysicas da antiguidade, hoje obsoletas, mas nas modernas theorias dos seus grandes escriptores e philosophos naturalistas, entre os quaes cumpre especialisar Darwin. O chamado direito humano não póde deixar de estar e está de facto sujeito ás leis superiores que derivam da essencia dos factos e da successão e natureza das cousas.