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SESSÃO N.° 14 DE 9 DE JUNHO DE 1891 9

"Nunca o latrocinio se exerceu em parte alguma com mais cynico impudor.

"Eis porque os sentimentos cavalheirosos da França se revoltam a tal ponto, que ninguem ha aqui que não envie a expressão dos seus sentimentos de sympathia ao valente povo portuguez, repudiando os processos da Inglaterra.

"E porque será que em Portugal, como em França n'uma epocha dolorosa, falta ao partido republicano o patriotismo?

"Não devia ser o primeiro a sustentar a realeza na resistencia nacional contra a invasão ingleza?

"Porque, emfim, não é culpa da casa de Bragança que a Inglaterra se lance sobre as possessões portuguezas como um pirata sobre um navio mercante.

"O Rei lucta quanto póde e deve.

".Era este o momento, e só este, de se agrupar ao lado da bandeira nacional, e deixar para quando o inimigo abandonasse as fronteiras, as lactas intestinas.

" Mas parece ser regra que a republica haja de aproveitar-se sempre das desgraças da patria, para se juntar aos outros flagellos, o insulto, a invasão, o abaixamento nacional.

"E em logar de apresentar o peito aos canhões inglezes, os republicanos portuguezes exigem da realeza concessões exorbitantes, collocando-a entre a revolução do interior e o bombardeamento pelo estrangeiro.

"Sob o ponto de vista patriotico, é pouco louvavel.

"Não ha rasão para que os republicanos se conduzam em Portugal, hoje, differentemente dos republicanos francezes no dia 4 de setembro. É sempre a mesma doutrina: pela republica primeiro, pela patria depois... se ella viver,."

É singular, sr. presidente, que nestas questões de dignidade nacional eu veja sempre espectros diante dos srs. ministros. Lá me parece estar vendo o espectro do pae de um nosso illustre collega, o sr. Basilio Cabral, que pronunciou aqui um discurso violentissimo contra a Inglaterra por um facto de muito menos importancia do que o tratado.

Este discurso é cheio de energia e de patriotismo; encontra-se transcripto em um. dos melhores trechos de um livro de Luiz Blanc:

Um ultraje publico, feito á bandeira portugueza, por cruzadores inglezes, uma violação audaciosa de direitos, tinham despertado a altivez nacional.

Nos mares de Angola, ao sul do equador, navios portuguezes foram aprisionados como navios de traficos, e entregues a tribunaes inglezes para serem julgados. O governo de Lisboa tinha ultimamente protestado, e pedia uma reparação aos seus orgulhosos oppressores.

Reunidas no dia 2 de janeiro, occuparam-se, primeiro, as côrtes, d'esta importante questão.

O ministerio Bomfim tinha posto no discurso da corôa palavras de conciliação, que foram acolhidas com indignação.

Vivas interpellações foram dirigidas ao governo, e, na Bua exaltação patriotica, alguns oradores propozeram declarar immediatamente a guerra.

Não se póde exprimir melhor os sentimentos de colera, levantados pelas indignas violencias britannicas, do que recordando algumas palavras energicas pronunciadas n'esta occasião pelo senador Basilio Cabral:

"Como o ministro da marinha está presente, peco-lhe "esclarecimentos sobre os ultimos acontecimentos nas aguas "de Loanda, onde uma quadrilha de salteadores, cujo chefe "é lord Palmerston, rouba a nação portugueza.

"Na minha qualidade de portuguez, tendo contribuido "para collocar a Rainha no throno, eu tenho o direito de "classificar desta maneira, os estrangeiros que julgam poder roubar-nos impunemente. Sr. presidente, é preciso "recordarmo-nos de que os portuguezes eram uma grande "nação, quando os inglezes eram ainda bem pequenos.

"Conhecem-se os nossos feitos, e, n'essa epocha, a historia de Inglaterra não tinha um unico feito heroico, "era apenas uma longa nomenclatura de intrigas e de roubos. Hoje, poderosa, a Inglaterra abusa da sua força em "face de um paiz que não póde resistir-lhe.

"Mas o que se póde esperar de uma nação, onde o dinheiro é tudo e póde tudo?

"Aos meus olhos o povo ingles é o mais traiçoeiro e o "mais infame que eu conheço."

A historia de 1848 recorda o que então houve contra a Inglaterra e os protestos de homens de antes quebrar que torcer.

Tambem me parece estar vendo o espectro do barão da Ribeira de Sabrosa, que pronunciou igualmente um outro discurso energico contra a Inglaterra, o do marquez de Sá da Bandeira, que já me appareceu aqui "m uma outra questão importante de defeza nacional.

Parece que estou vendo aquelle vulto eminente das nossas glorias militares, apontando com o seu braço esquerdo, mirrado, porque o direito tinha-o perdido nas campanhas da liberdade, para o seu querido mappa da Africa mutilado pelas patas brutaes do leopardo bretão.

Fm 1839 ou 1840 este valente general escreveu um folheto precioso e violento contra a Inglaterra, intitulado O MU de lord Palmerstron. Sinto não o ter aqui para ler á camara alguns dos seus periodos energicos e patrioticos.

Já a camara vê que estou em muito boa companhia.

Ha quem julgue que a rejeição deste tratado é um golpe fatal na monarchia. Eu sou de opinião contraria. Estou convencido que da sua approvação, em epocha mais remota, é que póde vir a fatalidade para a dynastia. Oxalá que me engane.

Estes receios são confirmados por uma carta de õ de junho corrente de um notavel publicista francez, escripta a um amigo meu particular. Peço licença para ler dois ou tres dos seus periodos.

"O vosso bello paiz está passando por umas provações bem duras n'este momento, e eu pela minha parte sigo com o maior interesse e affeição as peripecias da crise, que elle vae atravessando. Estou convencido que ha de resolver-se favoravelmente, porque essa crise é consequencia de uma campanha bolsista promovida por capitalistas inglezes, ajudados pela judiaria cosmopolita,

"A situação economica de Portugal não justifica a baixa da cotação dos fundos publicos portuguezes do governo, nem o panico que se apoderou dos banqueiros e dos depositantes. Se Portugal conservar o seu sangue frio e se, principalmente, evitar o lançar-se em aventuras revolucionarias, que me parecem ser inspiradas pela Inglaterra, nutro a firme confiança que sairá da crise sem maiores prejuizos.

"Sendo certo que os processos violentos da Inglaterra têem despertado em todos os corações honestos uma profunda sympathia pela vossa patria."

Sr. presidente. Agradeço a benevolencia da camara, mas as minhas modestas reflexões, não mereceram nem um protesto, nem um apoiado. Não o podia esperar, nem pela fórma, nem pela essencia do meu discurso. Sei que não posso agradar á maioria d'esta camara, cuja orientação é differente, mas o seu profundo silencio significa o applauso do paiz, humilhado por este tratado. Respeito todas as opiniões e só peço que respeitem a minha, comquanto humildo.

Sr. presidente, parece-me estar a ouvir neste momento sons estranhos e destemperados, que vem lá do lado ao norte da Gran-Bretanha.

Recordo-me que são os echos de um hymno muito popular em Inglaterra, intitulado Rull Britannia hymno composto por Thomson e Arne, cuja letra é a seguinte:

Quando a Inglaterra á voz omnipotente surgia do azul dos mares, recebeu em partilha o imperio das ondas, e os seus anjos da guarda saudaram-na com este canto:

Impera, Albion, sobre o oceano, porque os bretões jámais serão escravos

Onde estão os escravos, sr. presidente?

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