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Discurso proferido pelo digno par visconde de Algés, na sessão de 26 de fevereiro, publicada no Diario de Lisboa n.° 53, de 7 de março; e que deveria ter entrado a pag. 468, lin. 1.ª, no logar onde se acha um resumido extracto

O sr. Visconde de Algés: — Sr. presidente, o que significa este apparato parlamentar? Vejo as forças todas em armas e não só as forças effectivas, porque se chamou tambem a reserva para engrossar as fileiras do exercito! Mas que é isto! Periclita a patria, a liberdade, a dynastia, a fórma do governo? Tremem as bases fundamentaes da sociedade com os repellões irados do vulcão socialista? Vem ahi os Proudhons e os Fouriers arrancar-nos dos braços as esposas e os filhos? Que é isto que yejo, o susto e o pavor debuxado no semblante de todos?! É um projecto para converter em receita publica o producto dos emolumentos consulares, applicando as sobras, satisfeitos os respectivos vencimentos, a melhorar o proprio serviço consular, o serviço diplomatico e a secretaria dos negocios estrangeiros.

Eu canto o bispo e a espantosa guerra,

Que o hyssope excitou na igreja de Elvas!

Não se infira d'estas minhas palavras, que é para mim pouco importante o projecto que n'este momento se discute, importante pelo contrario o considero eu, mas importante porque tende a melhorar serviços importantes, e não pela parte que tem sido o alvo das exclamações altisonantes e dos vaticinios aterradores, que é precisamente a parte financeira do projecto.

Sr. presidente, eu concordo que a situação financeira do paiz, comquanto não seja desesperada é certamente melindrosa; eu concordo que devemos evitar todas as despezas com uma restricção apenas — que não forem notoriamente reproductivas; eu concordo que devemos realisar todas as economias com uma restricção tambem — que não affectarem serviços em que interesse a conservação e desenvolvimento da sociedade em que vivemos; eu concordo que a palavra economia estava inscripta no programma inaugural da situação, como tambem estava a palavra reforma.

No que eu não posso porém concordar é que o governo engeitasse o seu programma, apresentando o projecto actualmente em discussão, e digo — o governo, e não o sr. ministro dos negocios estrangeiros, porque o projecto não é do sr. ministro dos negocios estrangeiros, o projecto é do governo (apoiados), é de responsabilidade collectiva e solidaria do governo, que primeiro o approvou em conselho de ministros, como todos os projectos de iniciativa ministerial.

Não sei pois para que se pretende isolar de seus collegas o sr. ministro dos negocios estrangeiros, como se a elle só coubesse precipua a responsabilidade do projecto que é igualmente quinhoada por todo o gabinete. Não digo isto, sr. presidente, porque a minha voz possa destoar dos encomios justamente dirigidos ao sr. ministro da fazenda, s. ex.ª bem sabe o alto conceito que formo de suas distinctas qualidades politicas e de suas nobilissimas qualidades particulares; o que digo é que preciso não obliterar da mente a idéa de responsabilidade solidaria. Repetirei pois, o governo apresentando o projecto que n'este momento se discute não engeitou o seu programma, porque o projecto não obriga a despeza, e se não realisa economia, é porque esta se não acha em condições realisaveis.

Sr. presidente, dada a determinação de converter em receita publica o producto dos emolumentos que até agora constituíra o estipendio exclusivo dos consules, a não querer supprimir todas as instituições consulares que temos nos pontos commerciaes mais notaveis do mundo, o que a camara certamente não pretende, porque é muito illustrada e conscienciosa para o pretender, é consequencia irrecusavel, visto que a verba do orçamento não contára com a retribuição do trabalho consular, augmentar a verba respectiva. D'esta proposição, cuja verdade ninguem poderá contestar, já eu deduzo dois importantes corrolarios: primeiro que a receita descripta no projecto com a qual se propõe fazer face ao augmento da despeza não é receita phantastica, porque, se o fosse, os consules que até agora têem vivido das forças d'essa receita não seriam consules, mas phantasmas consulares; o segundo é que a questão, perdendo as volumosas proporções que se lhe tem dado, começa a revelar-se nos seus verdadeiros e legitimos termos, que são, dada a necessidade impreterivel de augmentar a verba da despeza, determinar o quantum d'esse augmento. Ora o quantum póde oscillar entre dois pontos: ou augmentar a verba da despeza em tanto quanto bastasse para traduzir em vencimentos fixos os vencimentos até agora variaveis do exercicio consular, ou aproveitar o pouco avultado remanescente, satisfeitos os indicados vencimentos, para aperfeiçoar o serviço consular, o serviço diplomatico e o serviço da secretaria dos negocios estrangeiros. O governo adoptou este ultimo alvitre, e eu sustento que adoptando-o não infringiu o seu programma, porque não creou despeza nova, e porque, se não realisou economia, foi porque essa economia imponderável em relação ao desequilibrio financeiro importaria na hypothese presente em infecundidade de serviços nos quaes interessa, a meu ver, a conservação e desenvolvimento da sociedade em que vivemos.

Para demonstrar que do projecto resulta despeza, fôra mister demonstrar, visto que a receita e a despeza se ajustam integralmente, ou que a despeza era effectivamente maior do que a que se vê indicada no projecto, ou que a receita era menor, ou que ambos este phenomenos se davam simultaneamente. Provar que a despeza é maior é impossivel na hypothese, porque é impossivel em these que haja um ministro da corôa que, apresentando a cifra indicativa da despeza geral, apresente ao mesmo tempo o quadro dos serviços com os respectivos vencimentos, sendo a somma das verbas parcelares superior á expressão numerica da despeza geral, para isto era preciso suppor que se ía sentar n'aquellas cadeiras um homem que não conhecia as operações fundamentaes da arithmetica, o que é, a meu ver, um impossivel moral. É verdade que no projecto ha uma certa vacuidade na despeza, vacuidade que ha de ser preenchida pelos gastos da representação, e aqui temos a questão da auctorisação, da qual adiante fallarei; porém' como no projecto esta prefixado o limite maximo da despeza, e como ainda ninguem demonstrou nem poderá demonstrar que as despezas elementares hão de forçar e dilatar esse limite, é para mim incontroverso que a despeza não poderá transpor as fronteiras que o projecto lhe demarca.

Quanto á receita tenho ouvido, é verdade, apprehensões sobre a sua eventualidade, mas apprehensões vagas, apprehensões indecisamente formuladas, apprehensões emfim, e eu pergunto á camara se o meu espirito solicitado de um lado por meras apprehensões, e do outro pela fé que merece um trabalho consciencioso e reflectido, effectuado por homens competentes e versados no estudo e no exercicio de funcções consulares, premunidos alem d'isto com todos os esclarecimentos e informações que lhes foram ministradas para os conduzir com segurança na investigação da verdade; eu pergunto se o meu espirito solicitado ao mesmo tempo por estes dois agentes contrarios, poderia ter um momento sequer de perplexidade?

Que a receita é eventual, d'isso não tenho eu apprehensões, tenho certeza; a receita é eventual como eventuaes são todas as receitas, mas d'aqui a concluir que a receita se não poderá realisar integralmente no futuro, e que ha de portanto desabrigar o orçamento contra grande parte da despeza, vae muito longe, e tão longe que ainda lá não chegou nenhum dos eloquentes impugnadores do projecto. E é preciso acrescentar que a receita não só foi calculada