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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 15 DE MARÇO DE 1858.

Presidencia do ex.mo Sr. Visconde de Laborim,

vice-presidente.

Secretarios, os Srs. Conde de Mello,

Visconde de Balsemão.

Depois das duas horas e meia, tendo-se verificado a presença de 27 Dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

O Sr. Barão de Porto de Moz tendo pedido na sessão passada que se declarasse na acta, que se tivesse assistido á sessão em. que se discutiu o parecer n.º 107 havia votar contra elle; e observando por a leitura da acta que tal declaração não se fez; por isso repete o pedido para que se lance a, dita declaração na acta de hoje. O Sr. Presidente—Vai declarar-se.. O orador aproveita a occasião de estar de pé para participar que o Sr. Visconde da Granja não compareceu á sessão de hoje, e talvez que falte a mais algumas, por estar doente.

O Sr. Presidente — Passamos á ordem do dia. Está votado na generalidade o parecer n.º IH, passa-se á especialidade, e vai lêr-se o

Art. 1.º (Veja-se o Diario n.º 92 do corrente mez.)

O Sr. Presidente— Como não estão presentes os Srs. Ministros, não sei se a Camara quererá continuar a discutir este projecto?...

O Sr. Conde de Thomar observa que tendo-se pronunciado, na discussão do parecer alguns Dignos Pares contra o artigo 3.º do projecto, o que foi presenciado por alguns dos Srs. Ministros que assistiram a essa discussão; era do dever de SS. Ex.ªs comparecerem hoje para darem as explicações que lhes fossem pedidas sobre esta materia, que não é de tanta simplicidade, que não mereça explicações da parte do Governo (apoiados).

Já por mais de uma vez elle orador tem levantado a sua voz nesta Camara, e dito e repetido, que os negocios publicos não podem marchar assim (apoiados); mas os Srs. Ministros não querem attender a isto. É só agora que se vé o Parlamento abandonado dos Srs. Ministros nas discussões importantes que aqui se ventilam. Não é possivel que se estejam a fazer estas queixas todos os dias, e a dizer, que assim não ha governo representativo neste paiz; que não devo isto continuar, porque não é possivel deixar em abandono os negocios publicos (apoiados).

Se a Camara julga que não é precisa a presença dos Srs. Ministros para discutir este projecto, decida-o assim: mas em quanto o não declarar elle orador entende que a presença de SS. Ex.ª é indispensavel.

O Sr. Visconde d'Athoguia —Sr. Presidente, a Camara não desconhece qual é o interesse que eu tenho em que passe este projecto que tem por fim beneficiar a ilha da Madeira: mas se a Camara entender que para a sua discussão é necessaria a presença dos Srs. Ministros não serei eu que me opponha a essa resolução que é tão curial e conveniente. Mas perguntaria, porque não está presente o Sr. Ministro da Justiça, que não tem na outra Casa materia em discussão, que diga respeito á pasta de que S. Ex.ª está encarregado? S. Ex.ª melhor do que eu, que sou funchalense, podia defender os interesses daquella provincia, aonde foi por muitos annos Governador civil. (O Sr. Aguiar—Não está na outra Camara.) Se não está, então com mais razão devia estar aqui, porque S. Ex.ª tinha o dever de se mostrar grato aos habitantes da Madeira, que lhe deram um nome maior do que já tinha, e recebeu delles muitas e distinctissimas provas de sympatia. S. Ex.ª cumpria um dever sagrado vindo a esta Camara por esta occasião para defender um projecto, que foi apoiado pelos seus collegas: acabo, Sr. Presidente, dizendo, que a Camara reconhece com quanto desgosto eu devo concorrer para que se não discuta, quanto antes, pela ausencia dos Srs. Ministros, um projecto sobre o qual eu podia dar alguns esclarecimentos, e o mesmo teria logar da parte dos membros da commissão.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada—Sr. Presidente, o que os Dignos Pares acabam de dizer não póde ser contradicto de maneira alguma. É necessario que haja na Camara algum Ministro para dizer, o que occorrer, e dar as explicações que forem necessarias. Nós temos dois Ministros que são Pares do Reino, e outros que são da Camara dos Srs. Deputados. (Uma voz—O Sr. Visconde de Sá está doente.) Não sabia, mas em geral nós temos visto, que por mais que se tenha fallado a respeito da precisão que ha de SS. Ex.ªs comparecerem nesta Camara, tem sido escusado, porque nem por isso tem tractado de vir aqui com mais assiduidade, e isto assim não póde continuar (apoiados). Nem isto é governo representativo, não sei que nome lhe darei, mas não é aquillo que devia ser, e tambem não me parece que a Camara esteja tão desarmada que não possa compellir os Srs. Ministros a concorrer ás suas sessões. Eu não faço a proposta, mas seria util que a Camara resolvesse—que em quanto os Srs. Ministros não estivessem presentes, não tractaria de negocio algum. (O Sr. Barão de Porto de Moz —Não vem.) Então não sei o que havemos fazer.

O Sr. Visconde d'Algés pede que não se esteja a gastar todos os dias o tempo com estas questões. O Sr. Conde de Thomar fez uma proposta, que não tem discussão, porque é incontestavel que todos os projectos de interesse publico estão sendo adiados por não estarem presentes os Srs. Ministros para darem explicações. Comtudo os projectos que não exigem a sua presença podem discutir-se e votarem-se, e portanto devemos passar á ordem do dia (apoiados).

O Sr. Presidente—A Camara conhece que os pareceres n.º 108, 110, 112 e 113 dependem todos da presença dos Srs. Ministros, e que hão se podem discutir na sua ausencia.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada—Então são todos?

O Sr. Secretario Conde de Mello — Para os pareceres n.ºs 108 e 110 é necessario que esteja presente o Sr. Ministro da Fazenda, porque são sobre objectos de fazenda (O Sr. Visconde d'Algés — Devem ficar adiados). O parecer n.º 113, que tracta da collocação de um official reformado, pertence ao Sr. Ministro da Guerra, que tambem não se acha presente; e o 113 está no mesmo caso por pertencer ao Ministerio da Marinha, e o Sr. Visconde de Sá tambem não está presente.

O Sr. Visconde de Ourem (sobre a ordem) — V. Ex.ª deu para ordem do dia os pareceres n.°s 114, 108, e 110, que não se podem discutir sem á presença dos Srs. Ministros...

O Sr. Presidente — Eu já disse quaes eram os pareceres que foram dados para ordem do dia...

O Orador—Muito bem; mas eu creio que os pareceres 112 e 113 não precisam da presença dos Srs. Ministros para se discutirem.

O Sr. Visconde de Fonte Arcada—Este é justamente o modo delles cá não virem.

O Sr. Presidente—Eu torno a dizer que todos dependem da presença dos Srs. Ministros; mas se a Camara, apesar disto, quer discutil-os, vou pólos em discussão...

O Sr. Barão de Porto de Moz — Sr. Presidente, eu peço a palavra sobre este incidente...

(Entrou o Sr. Ministro da Fazenda.)

O Sr. Presidente — Chega o Sr. Ministro da Fazenda.

O Orador — Cedo da palavra, porque era para pedir a V. Ex.ª que lhe mandasse aviso para comparecer nesta Camara.

O Sr. Presidente— Vamos ao parecer n.º 114, na sua especialidade.

O artigo 1.º foi approvado sem discussão, e bem assim o artigo 2.°

Art. 3.º

O Sr. Barão de Porto de Moz, ainda que não tem querido nesta Casa tomar sobre si a missão da defeza de uma instituição antiga e de seculos; e pelo contrario é dos que pensa que pelo estado em que ella se acha não póde ter grande esperança de duração, e que por isso aquelles mesmos que querem a sua existencia deviam antes tractar de reformar esse seu estado actual; todavia não pensa que ella leva ser destruida, ou pelo menos receber uma larga ferida, por um meio indirecto. Refere-se á instituição vincular.

O artigo 3.° deste projecto 6 desta ordem; por que, tractando das garantias que o Governo ha de receber dos emprestimos que fizer aos proprietarios que quizerem estabelecer uma fabrica de assucar na Madeira, diz o seguinte (leu).

Se isto melhorasse a situação do administrador do vinculo, ainda podia calar-se; mas sem vantagem nenhuma para esse administrador vai violar direitos adquiridos, que a Camara não póde destruir. O parlamento tem direito de abrogar uma instituição, se ella não convem á sociedade: mas nem a Camara, nem o Corpo Legislativo pôde querer destruir o direito que já tem adquirido os immediatos successores dos vinculos. Muito embora os administradores, por seu proprio facto, queiram destruil-os por um contracto: quem lhe deu esse direito, e á Camara o de sanccional-o, contra aquelles que já tem um direito adquirido?

O orador não é defensor zeloso desta instituição, como ella está; porque os vinculos, como estão, não podem existir; mas não deseja que uma instituição, velha ou nova, seja vulnerada, ou a queiram destruir, não frente a frente, mas por meios indirectos. Não importa que a ferida, que se vai fazer na legislação antiga, ou na actual, sobre a instituição vincular seja grande ou pequena; não é assim que se mede a abrogação dos principios. Muito embora seja pequena a quantia de 40 contos de réis, o principio fica na sua extensão tão violado, como se fóra de centenares de contos de réis. Se ámanhã vier uma lei como esta, e no outro dia outra, a instituição desapparece d'entre nós, mas aos bocados, sem gloria para ninguem, se nisso póde haver gloria. E assim não é o modo de fazer a sua refórma. (apoiados): e, ao monos por sua parte, nunca ha de concorrer para se reformar assim a sociedade; porque quando ella precisa uma refórma ha de intental-a pelas razões claras, mas não pelas razões indirectas; o que revela, não á falta de coragem, que não falta a nenhum Digno Par, e muito menos tanta como a qualquer delles, ás pessoas que dirigem os negocios publicos; mas que se prefere vencer difficuldades, que aliás podem ser vencidas directamente, por meios que bem se podem chamar mesquinhos.

O Sr. Conde de Linhares —Eu pedi a palavra unicamente para declarar que partilho a opinião que acabou de enunciar o Digno Par Barão do Porto de Moz, menos em um ponto. Disso S. Ex.ª que não era defensor zeloso da instituição dos Vinculos; e eu usando da verdade e franqueza proprias do meu caracter direi, que sou defensor zeloso da instituição vincular (apoiados).

Sr. Presidente, permitta-me V. Ex.ª perguntar se este artigo 3.° ha de ser votado em globo, ou se hão de votar-se separadamente cada um dos §§ delle; digo isto, porque não posso approvar o § 3.°, que diz assim (leu-o). Não -vejo que possa haver inconveniente algum em se fazer a votação separadamente (apoiados). Foi só para fazer esta declaração que pedi a palavra, e nada mais direi por agora, reservando-me para defender mais tarde esta minha opinião, se ella fôr atacada. Entendo que o que se deve fazer é votar o artigo 3.°, eliminado o § 3.°, que a meu vêr é um ataque ao principio vincular que defendo.

O Sr. Conde de Thomar quando este projecto de lei começou a discutir-se na sua generalidade, declarou logo o orador que votava por elle, e que se reduzia a votar pelo principio, ou sentença delle, isto é, pelo emprestimo de 40:000$ réis a favor dos lavradores da ilha da Madeira, a fim de que elles possam assim remediar em parte os prejuizos resultantes do mal das vinhas; mas não quer dizer que estivesse disposto a votar todos os artigos do projecto nos quaes se acham, salvo se fosse convencido do que assim devia ser não só por utilidade publica, como pela especial dos habitantes da ilha da Madeira.

Em vista do que disse o Digno Par Barão de Porto de Moz, a materia não é tão simples como pareço á primeira vista, porque vem aqui uma idéa que tende a conseguir por meios indirectos aquillo que até agora por meios directos se não póde alcançar, aquillo que foi já objecto de debates parlamentares, e a cujo respeito se desenvolveu uma opinião quasi geral nesta Camara, o que até agora não foi possivel combater-se com opiniões sólidas — a conservação da instituição vincular (apoiados).

O Sr. Conde está intimamente convencido de que, pelo disposto neste artigo do projecto, em quanto se estabelece a hypotheca dos bens vinculados ao pagamento das sommas emprestadas pelo Governo para a compra das acções, vai isso destruir na Madeira o principio da instituição vincular.

Não é por taes meios que é justo, nem decente a um parlamento chegar ao fim de anniquilar aquelle principio: é de frente que devem ataca-lo os seus adversarios, se por ventura entendem que não convem aos interesses publicos (apoiados).

Offerecem-se ainda outras duvidas a respeito deste artigo, que lhe parece não estarem sufficientemente esclarecidas, e que carecem ter maior desenvolvimento, o qual espera que darão os Dignos Pares, membros da commissão: por exemplo, o artigo 2.° diz isto (leu). O effeito desta compra é passar a acção ao dominio do comprador? São estas acções transmissiveis a terceiro? E sendo-o, ficam ellas sendo hypotheca ao pagamento das sommas emprestadas pelo Governo aos proprietarios da ilha da Madeira? E como fica segura a hypotheca sendo transmittida a terceiro? Além disto, estas acções podem parar na mão de um homem que possua bens vinculados e livres, e comtudo os livres podem não chegar para o pagamento das acções. Morre esse homem, ficam herdeiros, o passa o vinculo ao primogenito: o que não é vinculado tem de ser dividido pelos herdeiros. Pergunta o orador, fica o vinculo obrigado ao pagamento destas acções? O vinculo que, na conformidade da lei, deve passar livre ao immediato successor? Todas estas questões valem a pena de serem esclarecidas pela commissão, porque não estão claras no projecto, e carecem sê-lo (apoiados).

Aproveita esta occasião para perguntar ao Sr. Ministro da Fazenda, se o Governo está de accôrdo com toda a doutrina deste projecto de lei, e se approva as disposições que elle contém; e se o Governo não acha que em vista dellas soffra o paiz, e soffram tambem as convicções dos Srs. Ministros; porque, em quanto á parte vincular, já o Governo declarou nesta Camara que é pela conservação desta instituição. É pois conveniente que tambem o Governo se explique sobre este assumpto.