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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 24 DE MARÇO DE 1858.

Presidencia do ex.mo Sr. Visconde de Laborim,

Vice-presidente.

Secretarios os Srs. Conde de Mello

Visconde de Balsemão.

Ás duas horas e meia da tarde, achando-se presente numero legal, o Sr. Presidente declarou aberta a sessão.

Leu-se a acta da precedente, sessão, que se approvou na fórma do Regimento por não haver reclamação em contrario.

O Sr. Marquez de Vallada aproveita a primeira occasião que se lhe offerece para em pleno parlamento dar os seus louvores ao Digno Patriarcha eleito de Lisboa, por ter sabido resistir nobre e apostólicamente aos esforços do Governo em quanto tendiam a fazer praticar S. Ex.ª Rev.ma uma irregularidade: irregularidade que foi notada em um jornal, na redacção do qual elle orador tem a honra de fazer parte. Referia-se ao Bem Publico. S. Ex.ª Rev.ma não tomou posse do governo desta diocese em quanto teve o caracter de Patriarcha eleito, resistindo a todas as ordens do Sr. Ministro das Justiças, para que o fizesse: e d'ahi dava seus louvores ao nobre Prelado que soube resistir ás inqualificáveis ordens do Governo.

Accrescentou que chegado pois o momento de S. Ex.ª Rev.ma tomar posse da alta dignidade para que fóra eleito por Sua Magestade El-Rei o Sr. D. Pedro V, e na qual foi confirmado pelo Summo Pontífice o Papa Pio IX; repetia quedava por este facto os parabens a S. Ex.ª Rev.ma, e tambem ao povo do patriarchado, por serem governados por um tão digno Prelado.

Expoz que quizera apresentar estas breves considerações como uma censura ao Governo, á qual melhor desenvolveria se naquella occasião estivesse presente aqui o Sr. Ministro das Justiças.

Aproveita o uso da palavra para annunciar uma interpellação que deseja fazer ao Sr. Ministro do Reino, relativamente ao hospital nacional e real de S. José, e sobre um objecto que não póde deixar de ser conhecido de S. Ex.ª, porque o é de todos, pela circumstancia de se ter publicado pela imprensa uma correspondencia, na qual se pede uma syndicancia sobre a administração daquella casa de caridade.

Tambem deseja perguntar ao Sr. Ministro do Reino qual a razão por que não attendeu ao offerecimento que fizeram as irmãs da caridade para tractarem dos doentes, á similhança do que se pratica n'outros paizes? Talvez se lhe responda que foi por motivos de economia que esse offerecimento se não acceitou, mas elle orador ha de provar o contrario disso, se tal razão se adduzir; e assim como ha de tambem tractar do desfalque em que se achou o fallecido thesoureiro do hospital, o Sr. David Alves Renda, e por essa occasião fallará igualmente do negocio relativo ao recebedor.

Mandará pois para a mesa a sua nota" de interpellação, e em tempo opportuno desenvolverá todos estes pontos tão melindrosos e importantes.

O Sr. Presidente roga ao Digno Par que envie para a mesa a sua nota de interpellação.

O Sr. Marquez de Vallada declara que passava a escrevel-a.

(Entrou o Sr. Ministro da Fazenda.)

O Sr. Conde de Thomar....

O Sr. Ministro da Fazenda —No dia 7 de Dezembro do anno passado tive eu a honra de ser exonerado da Pasta das Justiças, que Sua Magestade houve por bem commetter-me interinamente: de então para cá é evidente não podér eu estar habilitado para podér responder relativamente aos objectos que teem sido tractados naquelle Ministerio, mas posso affirmar ao Digno Par que até ao dia em que eu saí delle não se tinha praticado facto algum que podesse justificar a asserção do Digno Par o Sr. Marquez de Vallada; e posteriormente a essa data parece-me podér tambem affirmar a S. Ex.ª, que as cousas se teem passado do mesmo modo que se passavam no tempo em que estive á testa daquella Repartição.

Se porém os Dignos Pares tivessem tido a bondade de prevenir o Governo do desejo que tinham de fallar nesta materia, como o Governo esperava que SS. EE. fizessem, então respostas mais cathegoricas podiam ser dadas, e não deve estranhar-se que agora o não faça cabalmente um Ministro que não é da respectiva Repartição.

Já eu disse aqui, Sr. Presidente, n'outra occasião, que o Regimento desta Casa estabelece regras que se não teem cumprido muitas vezes a respeito deste Ministerio. (O Sr. Marquez de Vallada pede a palavra para fallar com relação á asserção que o Sr. Ministro acaba de estabelecer.) Não sei o que V. Ex.ª poderá dizer contra a asserção que eu enunciei, porque ella é verdadeira: o Digno Par mesmo tem feito perguntas muitas vezes sem se prevenir disso o Governo; outras vezes, e muitas, tem sido convidado o Governo a vir aqui responder, sem se designar sobre que objecto: lembra-me até que eu recebi em certa occasião um officio convidando-se-me a vir eu aqui quanto antes, para o fim de responder a uma pergunta de grande alcance politico!

Torno portanto a dizer, que sobre negocios desta gravidade, a prudencia desta Casa pedia que se não prostergassem as regras estabelecidas no seu Regimento, que estabelece o preceito de se prevenir o Governo, ou o Ministro respectivo, de que se deseja interpellal-o sobre tal assumpto, fim delle vir responder devidamente habilitado.

O Sr. Patriarcha eleito certifica que não ha fundamento para justificar as asserções do Digno Par o Sr. Marquez de Vallada, nem elle orador havia resistido a ordem alguma do Governo.

O Sr. Marquez de Vallada expõe que as palavras que acabava de pronunciar o muito digno e respeitavel collega, o Sr. Patriarcha eleito, não podiam deixar de provocar logo da parte delle orador uma explicação.

S. Ex.ª disse que não havia resistido a ordem alguma do Governo, ou do Sr. Ministro dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça, mas e certo que elle orador vira no Diario do Governo differentes officios dirigidos pelo Ministerio dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça ao Vigário geral de Lisboa, como Governador do Patriarchado, assim como vira tambem a Pastoral que o Vigário geral, o Sr. Cicouro, fez publicar sobre a dispensa de certa abstinencia durante a quaresma, Pastoral de que julga tiveram conhecimento muitos ou todos os Dignos Pares que estavam presentes, e neste documento apparece tambem o Sr. Vigário geral como Governador do Patriarchado. Ora, nessa occasião disse-se publicamente, e era por ahi repetido muitas vezes, que o Nuncio Apostólico de Sua Santidade nesta corte, o Sr. Cardeal Pietro, declarára que se o Sr. Patriarcha eleito exercesse algumas de suas funcções em quanto não fosse confirmado por Sua Santidade, praticaria actos irregulares, iguaes a outros que já alguns dos seus antecessores haviam praticado, e pelos quaes. tinham sido reprehendidos. (O Sr. Ministro da Fazenda—Esta fóra da ordem.) O orador observou a S. Ex.ª que não tem direito de o chamar á ordem. Usa do seu direito de Par do Reino, e ha de usar delle a despeito de qualquer censura, ou admoestação dos Srs. Ministros. No entanto diz que elle orador fez o que entendia que podia fazer, que foi felicitar o Sr. Patriarcha eleito, como já em outra occasião havia felicitado o Digno Par o Sr. Visconde d'Ourem, sem que a Camara lhe levasse isso a mal, como nesta occasião a não levou.

Devia dar esta explicação que julga satisfará a S. Ex.ª o Sr. Patriarcha eleito, a quem deseja dar mais este testimunho do seu respeito e consideração.

O Sr. Visconde de Castro — Eu pedia a V. Ex.ª e á Camara que não continuássemos mais neste negocio, que é muito grave, e de alta importancia.

Eu não pertendo tirar a palavra a ninguem, mas parecia-me que a Camara devia pôr termo a este negocio tão melindroso como é (apoiados). Pois havemos de estar aqui a acarear o Sr. Patriarcha eleito com o Sr. Ministro? Isto não póde ser (apoiados). Por conseguinte é necessario que esta Camara tome o seu logar, e acabe com esta questão.

O Sr. Conde de Thomar....

O Sr. Ministro da Fazenda — Eu nada mais tenho que dizer, ou que adiantar ao que já disse quando pela primeira vez pedi a palavra, de que na qualidade de Ministro da Fazenda não era competente para fazer declarações algumas, ou responder ao Digno Par ácerca do ponto em que fallára; mas que era certo que até ao momento em que eu largara a pasta dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça não me constára de facto algum que podesse motivar as declarações que aqui fizera o Digno Par o Sr. Marquez de Vallada. No entanto não me parece que fosse regular o modo pelo qual o Digno Par se houve sobre este objecto, porque não vi que se seguissem as prescripções do Regimento desta casa, e bom seria que nestes casos sempre se observasse o Regimento para melhor regularidade dos trabalhos, e os Ministros poderem satisfazer como devem, e de uma maneira conveniente.

Mas já que estou de pé, eu que tive a honra de refrendar o Decreto pelo qual foi elevado á dignidade de Patriarcha eleito de Lisboa o Meritissimo Bispo Conde, não posso deixar de dizer que foi uma grave injuria ao caracter elevado de S. Ex.ª suppôr que S. Ex.ª fosse capaz de desobedecer ás ordens do Governo, e sobre tudo em relação ao objecto que se annunciára.

A Camara não me levará a mal o ter pronunciado estas poucas palavras em testimunho do respeito e consideração que devo ao illustre Prelado.

O Sr. Presidente consulta a Camara se dava por terminado este negocio? (apoiados.)

O Sr. Conde de Mello expõe, que presando muito a liberdade de imprensa, não deseja por isso que se dê o menor motivo de menospreso para com essa liberdade, mas não póde deixar passar sem correctivo, no que espera a Camara acompanhe, um artigo que viu publicado no jornal o Portuguez (da vespora), relativo á votação que tivera logar na ultima sessão da Camara.

Leu o artigo a que se referia, e continuou dizendo, que o ultimo periodo que acabava de lêr não podia deixar de lhe fazer bastante impressão, por estar convencido de que durante todo o tempo que elle orador ha tido a honra de occupar, por bondade da Camara, as cadeiras de Secretario, não tem nunca deixado de cumprir as suas" obrigações (muitos apoiados).

Declara que estima sempre, e nem era possivel deixar de estimar, que quando se vota sobre qualquer objecto, os Dignos Pares votem do modo que mais se compadece com as opiniões delle orador, mas é incapaz de alterar a vontade ou o. voto que cada um expressar (muitos apoiados).

Na ultima sessão, quando teve logar uma votação, verdade é que houve engano (Uma voz — ouçam, ouçam), mas foi omittindo o nome do Digno Par o Sr. Conde do Farrobo, que tinha votado como elle orador votaria (apoiados). Quando se procedeu ás primeiras votações por levantados e assentados, achavam-se então na Camara cincoenta Dignos Pares, e tanto na primeira como na segunda vez só se levantaram vinte e quatro, deixando-se em ambas ellas ficar sentados dois Dignos Pares, razão pela qual dissera que vinte e quatro haviam approvado, e outros tantos tinham rejeitado. Procedendo-se, porém, depois á votação nominal, declarára que tinham votado pela admissão á discussão da proposta vinte e seis Dignos Pares, e pela não admissão vinte e quatro, omittindo nestes ultimos o nome do Digno Par o Sr. Conde de Farrobo. Mas foi advertido deste engano quando já a sessão estava fechada, e neste caso foi verificar com o Sr. Secretario o Digno Par Sr. Visconde de Balsemão, e S. Ex.ª combinando com elle orador as notas que se tinham tomado na votação, concordou logo em que vinte e seis Dignos Pares haviam votado para a admissão da proposta, e vinte e cinco pela não admissão (muitos e repetidos apoiados).

Entendia dever dar esta satisfação á Camara, a fim de lhe mostrar o modo leal com que procedêra (muitos e repetidos apoiados), e declarava francamente que se na Camara não tivesse a honra de encontrar os apoiados que acabava de receber, não subiria mais aquelles degraos da mesa, para se sentar na cadeira de Secretario; mas agradece a maneira benevola e honrosa, pela qual a Camara se digna de approvar o seu procedimento (apoiados geraes).

O Sr. Visconde de Balsemão declara ter-lhe esquecido participar á Camara na sessão passada, que havia recebido uma communicação do Digna Par o Sr. Marquez de Pombal, dizendo não comparecer á sessão por incommodo de saude.

O Sr. Presidente—Declara que se passava á ordem do dia.

O Sr. Secretario Conde de Mello—Leu a proposta do Sr. Conde da Taipa, que foi a seguinte:

«Proponho que a moção do Digno Par, Conde de Thomar, vá a uma commissão, para dar o seu parecer sobre os fundamentos de legalidade que ella apresenta. — Conde da Taipa.»

O Sr. Presidente abre sobre ella a discussão.

O Sr. Visconde de Ourem—Sr. Presidente, muito desejaria eu que a questão que agora aqui se agita não tivesse vindo a esta Camara, ao menos na occasião presente, e não se julgue por isto que eu defendo o Governo, pois antes pelo contrario estou convencido que elle não tem andado bem no negocio relativo ao Conselho de Estado. Todavia esta questão não póde, nem deve aqui continuar, aliás a Camara terá de se pronunciar a respeito de uma transacção que ainda póde vir a julgar de outra maneira, e neste caso colloca-se n'uma posição bastante delicada, e toma uma grande responsabilidade.

Mando portanto para a Mesa uma proposta de adiamento, para que V. Ex.ª tenha a bondade de a propôr a Camara, a fim de ser discutida conjunctamente com a proposta do Digno Par o Sr. Conde da Taipa.

Peço a urgencia.

A proposta foi a seguinte:

«A Camara dos Pares tomando em muita consideração a proposta do Digno Par o Sr. Conde de Thomar, e reservando-se para opportunamente tomar sobre ella uma resolução, passa á ordem do dia. — Visconde de Ourem.»

(Votada a sua urgencia, e admittida á discussão).

O Sr. Visconde de Algés (sobre a ordem) é de parecer que o Sr. Marquez de Ponte de Lima não póde naquella occasião ter a palavra, porque a pediu sobre a materia, e para fallar nella estava inscripto em primeiro logar o Digno Par o Sr. Ferrão.

Explica que a materia era a moção do Digna Par o Sr. Conde de Thomar; que depois, como questão prejudicial, e annunciado assim pelo Sr. Presidente, viera a proposta do Sr. Conde da. Taipa, admittida pela Camara á discussão; e por ultimo havia ainda a proposta do Digno Par o Sr. Visconde de Ourem, cuja urgencia a Camara acabava de approvar.

Nestes termos era sua opinião que se devia dar primeiramente a palavra aos que tivessem de fallar nesta questão de preferencias de propostas; e quando novamente se chegasse á materia, o primeiro a usar da palavra deveria ser o Sr. Ferrão.