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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

SESSÃO DE 19 DE MAIO DE 1848.

Presidiu — O Em.mo e Rev.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios, os Sr.s V. de Gouvêa.

Margiochi

ABERTA a Sessão pela uma hora da tarde, estando presentes 31 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão — Concorreu o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Mencionou-se a seguinte

CORRESPONDENCIA.

1.º Um Officio do Ministerio da Fazenda, enviando, sanccionado, um dos authographos dos Decretos de Côrtes, concedendo ao Hospital de Guimarães um annel de agoa, e á Misericordia da mesma Villa a Igreja do extincto convento de Santo Antonio.

Passou o Authographo ao Archivo.

2.° Outro Officio do Ministerio do Reino, satisfazendo aos esclarecimentos pedidos pela Commissão de Fazenda, em 2 do corrente, pag. 606 col. 4.ª

3.° Outro dito do mesmo Ministerio, remettendo os esclarecimentos pedidos em 5 do corrente pelo D. Par V. de Sá, pag. 630, col. 1.ª

4.º Outro dito do Ministerio da Justiça, satisfazendo ao exigido em 15 do corrente (pag. 678 col. 4.ª) ao requerimento do Sr. Fonseca Magalhães, e a que respondêra logo em parte o respectivo Ministro, annunciando que o faria completamente.

Os Officios 2.°, 3.º, e 4.º passaram á Secretaria.

O Sr. V. DE FONTE ARCADA — Peço á Camara que tenha a bondade de consentir, que eu faça a renovação de dous Requerimentos, que já tive a honra de apresentar nesta Casa: o primeiro em 4 de Maio (pag. 620, col. 2.ª), e o segundo em 12 de dito (pag. 653, col. 3.ª) Estes meus pedidos ainda não foram satisfeitos, e não me parece, que sejam tão difficeis, que tenham dado logar a uma demora tal: por conseguinte torno renova-los.

O Sr. PRESIDENTE — Como esses pedidos já foram approvados pela Camara, segundo o estylo, a Mesa encarrega-se de fazer nova participação ao Governo.

O Sr. V. DE SÁ DA BANDEIRA — No dia 3 deste mez fiz eu um Requerimento, que esta Camara approvou, para que o Governo mandasse todos os documentos, que podessem provar as asserções, que haviam sido feitas, de que a insurreição geral de Outubro de 1846 tinha o caracter de miguelista, e havia o decidido plano de desthronar a Sua Magestade a RAINHA, e fazer subir ao Throno uma outra dynastia. No dia 15 deste mesmo mez fiz outro Requerimento, insistindo em que estas provas fossem mandadas á Camara; mas até agora ainda nada veio. Entendo que pela minha parte dei sufficiente tempo ao Governo, para enviar esses documentos, que certamente haviam de existir na Secretaria de Estado dos Negocios Estrangeiros, por que foi dessa Secretaria, que se fizeram todas as communicações a tal respeito ás Potencias estrangeiras.

Rogo agora a V. Em.ª, que tenha á bondade, de accôrdo com o Sr. Presidente do Conselho, de fixar um dia, em que possamos entrar naquella questão, sendo conveniente que assistam a ella; não só o Sr. Presidente do Conselho, como tambem o Sr. D. Manoel de Portugal e Castro, e o Sr. C. de Thomar, ainda que era nesse tempo empregado subalterno do Governo; porque, é absolutamente necessario mostrar, que todas aquellas asserções foram falsas, embora S. Ex.ªs se esforcem em dizer, que são verdadeiras. No decurso da discussão se esclarecerá este ponto, porque é justo, que a Nação saiba a verdade.

Desejo pois, que os Sr.s a quem me referi, sejam previamente avisados do dia, que V. Em.ª fixar, á excepção porém do Sr. C. de Thomar, ao qual, vindo todos os dias a esta Camara, julgo desnecessario fazer-se-lhe recommendação. S. Ex.ª vai agora entrar na questão, para o que já tem a palavra; mas eu conto não a pedir, visto que a apresentação dos documentos mencionados, offerecerá a melhor occasião para entrarmos a fundo nesta questão. E para este fim remetto á Mesa

o seguinte

REQUERIMENTO.

Requeiro que seja convidado o Sr. Presidente do Conselho de Ministros, e o Sr. D. Manoel de Portugal e Castro, a assistirem á Sessão, que S. Em.ª o Sr. Presidente designar, para responderem á interpellação, que desejo fazer-lhes, para que apresentem os motivos, que tiveram para affirmar, que a insurreição de Outubro de 1846 tinha o aspecto miguelista, e que havia o plano de desthronar Sua Magestade, A RAINHA, e elevar ao Throno outra Dynastia — Maio 19 de 48 — Sá da Bandeira.

O Sr. C. DE THOMAR — O D. Par enganou-se, quando disse, que eu queria entrar na questão; porque eu pedi a palavra para dizer, que estava prompto a entrar nella quando S. Ex.ª quizesse.

O Sr. PRESIDENTE — A Mesa passará a fazer a communicação ao Sr. Presidente do Concelho, e quando se tiver fixado o dia para se tractar da questão, far-se-hão os competentes avisos.

O Sr. FONSECA MAGALHÃES — Sr. Presidente, a maioria da Commissão de Inqueritos julgou do seu dever não demorar mais tempo a sua installação, e effectivamente acha-se installada, tendo nomeado para seu Presidente o D. Par o Sr. V. de Laborim, para Secretario Fonseca Magalhães, e para Relator o Sr. C. de Lavradio.

O Sr. PRESIDENTE — Antes de passarmos á ordem do dia tem a palavra o Sr. C de Thomar

O Sr. C. DE THOMAR — Vou ainda dizer algumas palavras sobre a questão, de que nos temos occupado nestas Sessões passadas.

A questão já se vai tornando um pouco fastidiosa á Camara, e a fallar a verdade podia ter acabado; mas visto que de novo se insistiu, e visto que se tirou a questão dos seus devidos termos, não tenho remedio senão dar ainda algumas explicações, será com tudo me fazer cargo de entrar profundamente na questão, e tanto mais que segundo o que acabo de observar, é ella uma das que fará parte da interpellação, que o Sr. V. de Sá da Bandeira deseja dirigir ao Ministerio, e para a qual pediu fosse eu intimado, e o Sr. D. Manoel de Portugal.

A questão tem aberrado, como disse, dos seus verdadeiros termos, e teria cançado muito mais a Camara, se se não pretendesse torna-la um pouco engraçada, com figuras poeticas, como aquella, de comparar á coallisão ao Adamastor, com a sua bocca negra, e dentes amarelos (Riso). Não empregarei figuras poeticas, nem combaterei no campo da poesia, a questão é de facto: expô-lo em toda a sua simplicidade, esclarece-lo, e prova-lo, eis o nosso objecto: tudo o mais póde complicar a questão, mas não esclarece-la.

A questão não é saber, se a predicção feita em 1846 no Parlamento, de que a revolução era dynastica, se realisou, ou se os factos vieram provar o contrario; a questão não é saber se a Junta do Porto foi miguelista, ou se os dous D. Pares, a quem se teem feito allusões, são, ou foram miguelistas; a questão reduz se a saber, se os miguelistas quando praticaram o acto de adhesão á Junta do Porto, abjuraram as suas crenças dynasticas, e os seus principios politicos: devemo-nos circumscrever aos termos destas asserções, e tractar de os desenvolver; e provar, porque tudo que não for isto, como já disse, é fóra da questão.

Os meus adversarios admittiram como verdadeiro, e incontestavel, que a união com o partido miguelista seria um grande crime, se ella não fosse acompanhada dessa abjuração de crenças dynasticas, e principios politicos; e disse-se mesmo que não teria coração portuguez quem consentisse similhante união sem tal condição: isto foi dito, e allegado para se salvar a Junta do Porto da nodoa que, mesmo na opinião dos nossos contrarios, havia de cahir sobre ella, se por ventura a

união feita com o partido miguelista não fosse acompanhada desta circumstancia; e pois que a tal circumstancia se foi buscar o fundamento para cobrir essa nodoa, é preciso que seja provada; mas provou-se ella?... Pedi-vos documentos, e dissestes — documentos não existem — se não tendes documentos anteriores a esse acto, de que vos resulta mancha, não provando a abjuração allegada, exigi agora declaração a esses (que tão cavalheira e patrioticamente se vos uniram) em como o fizeram abjurando os seus principios, e crenças dynasticas! Se nem uma nem outra cousa apresentais, então permetti que duvidemos da vossa palavra, que está em contradicção com os factos (Apoiados).

A esta segunda exigencia respondeu-se — essa declaração de nada vale — e recorre-se a uma singular prova!... Julgais melhor prova um argumento de presumpção, um argumento de indução? Eis-aqui toda a prova que apresentais! — o partido miguelista serviu debaixo das ordens da Junta, ergo abjurou das suas crenças dynasticas, e dos seus principios politicos. — Ao vosso argumento podemos oppôr outro, que é mais natural, e mais conforme aos factos — o partido Miguelista tinha a conseguir o seu fim; para isto precisava organisação, armas, artilheria, e cavallos, só o podia obter unindo-se á Junta do Porto; ergo a união foi sómente um meio de mais facilmente conseguir o fim! (Apoiados.) — (O Sr. C. das Antas — Prove-o) — Prove-o! Pois não estão ahi as provas? O que significam as declarações de muitos desses individuos, dizendo que são falsas as asserções feitas nesta Camara por alguns D. Pares? Não declaram mui explicitamente, que nunca por aquelle acto de adhesão á Junta do Porto se póde entender, que abjuraram das suas crenças dynasticas, nem dos seus principios? Que dizeis á vista dessas declarações?

De mais: argumentaste aqui com cavalheirismo, com sinceridade, e com boa fé, dos miguelistas que se vos uniram; dissestes que era impossivel, que quando esses cavalheiros se sujeitaram a junta, tivessem um pensamento reservado: pois bem, é para esse cavalheirismo, para essa sinceridade, e para essa boa fé, que eu appello, se existiu, nem da vossa parte deve haver duvida em pedir uma declaração, que confirme o que asseverais, nem da parte contraria deve apparecer recusa. Mas direi — podeis, sois capazes de proceder com esta franqueza?...

Eu não disse, que lamentára que o partido miguelista viesse abjurar as suas crenças dynasticas, e os seus principios: muito pelo contrario desejára eu bem, que estas asserções, que se teem feito aqui tão enfaticamente, fossem provadas, não só porque se lavaria a Junta do Porto, e lavar-se-iam os seus correligionarios politicos da mancha a que se teem arrogado, como elles mesmos teem reconhecido, mas tambem porque seria um grande serviço, que a Junta teria feito ao Paiz, concorrendo para a união da familia portugueza, fim este para que eu sempre tenho trabalhado, mas por differente caminho. E agora vem a proposito comparar o acto por mim praticado com aquelle, que praticou a Junta do Porto!

O D. Par, o Sr. Fonseca Magalhães, disse, que o acto da rectificação dos ecclesiasticos coitados aos seus beneficios, merecia elogios, e accrescentou S. Ex.ª — e quando eu faço elogios ao Sr. C. de Thomar, bem póde a Camara vêr, que não podem deixar de ser merecidos. O acto que mereceu elogios a S. Ex.ª é, como já disse, o que mandou restituir aos seus beneficios os ecclesiasticos, que delles se achavam privados sem processo, mas em virtude de medidas geraes, e só pelo fundamento de se haverem conservado no exercicio das suas funcções durante a usurpação. Devo porém notar, que os elogios que poderem resultar desse acto (assim como a responsabilidade), tocam-me tanto a mim como ao Sr. Fonseca Magalhães. S. Ex.ª não póde ter esquecido que, supposto este acto fosse praticado pela Repartição a meu cargo, e sobre lembrança minha, foi todavia resultado de uma deliberação em Conselho de Ministros.

Não posso realmente conceber como o D. Par entendesse, que havia alguma analogia entre o acto da restituição dos ecclesiasticos suspensos dos seus beneficios, e o acto da união da Junta com os miguelistas.

Disse S. Ex.ª — que eu fiz Abbades, e Conegos miguelistas, em quanto a Junta fez Capitães e Tenentes! Eu pratiquei um acto de grande justiça, fazendo observar a Lei, e restituindo aos seus beneficios ecclesiasticos que delles se achavam illegalmente privados, e sem outro crime, que o de se terem conservado no exercicio das suas funcções, durante a usurpação; mas quem melhor que V. Em.ª conhece esta materia? A Junta deu armas, e mandou organisar legiões miguelistas, cujo fim era destruir a Dynastia, e a Lei fundamental do Estado (Apoiados).

Note-se além disto, que nenhum ecclesiastico foi admittido sem primeiro requerer á SOBERANA, que lhe fizesse justiça, e reconhecendo assim o Governo da RAINHA, e mais ainda sem prestar o juramento solemne de reconhecimento, e obediencia a SUA MAGESTADE, e á Carta Constitucional (Apoiados).

Pergunto — acconteceu é mesmo da parte dos Miguelistas, com quem se uniu á Junta? Falla-se em palavra de honra, em cavalheirismo, e em patriotismo: mas além de não ser esse officio admittido entre nós, porque ainda não está em execução neste Paiz o Decreto do Governo provisorio, que aboliu os juramentos, bastará attender; a que tal palavra de honra não se prova ter existido, antes deve presumir se o contrario em vista das declarações, que tem sido feitas pela imprensa em nome, e por parte de muitos desses Cavalheiros (Apoiados.)

Admirou-se o D. Par, a quem estou respondendo, de que eu podesse duvidar das intenções do General Povoas, e a ponto de julgar fallaz a sua Proclamação. Devo declarar, que não tive