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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO DE 17 DE MAIO DE 1867

PRESIDENCIA DO Ex.mo SR. CONDE DE LAVRADIO

Secretario, os dignos pares

Marquez de Sousa Holstein

Marquez de Vallada

Depois das duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 20 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. secretario marquez de Sousa Holstein mencionou a seguinte

CORRESPONDENCIA

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados, acompanhando uma proposição sobre a suppressão dos juizes ordinarios, juizes eleitos, e sub-delegados do procurador regio.

Á commissão de legislação.

Um officio do ministerio da guerra, acompanhando, para ser depositado no archivo d'esta camara, o autographo do decreto das côrtes geraes, n.° 89.

Teve o competente destino.

O sr. Marquez de Vallada: — Sr. presidente, sinto muito não ver nas suas cadeiras nenhum dos srs. ministros, e principalmente os srs. ministros da justiça e do reino, aos quaes eu tinha tenção de dirigir uma interpellação muito importante, que ha mais tempo desejava verificar, e o teria feito se não fosse necessario colher varios esclarecimentos de que necessitava, para fallar com conhecimento de causa. Seria grande imprudencia vir aqui, desprovido de informações, fazer a interpellação, a qual se refere a um grande roubo, ou para melhor dizer, a uma successão de roubos praticados n'esta capital desde o anno de 1856, e que tem relação com a herança que deixou José da Costa Carneiro, natural de Goes e fallecido n'esta cidade no mencionado anno. Este individuo deixou uma herança consideravel, existindo entre esses bens (a respeito dos quaes ha um inventario pelo juizo da 4.ª vara) 22:000$000 réis em inscripções, que estavam averbadas em nome da sua mulher; mas hoje ha um outro sujeito chamado José da Costa Carneiro e Neves que tem continuado a receber da junta do credito publico o juro das inscripções que o outro individuo só podia receber como procurador de sua mulher que se chamava D. Luiza Rita, emquanto que a mulher d'este chamasse Luzia, não sei de que. Eu fallo assim, e explico tudo muito claramente, porque estou para isso auctorisado; porque se o não estivesse, não me seria facil estabelecer os factos com tanta clareza como o estou fazendo. O signal antigo era reconhecido pelo tabellião Scola, mas o actual é reconhecido pelo tabellião Saldanha. Já se vê que os tabelliães não têem culpa alguma n'isto. O que porém é certo é que a viuva do verdadeiro dono das, inscripções que era bem conhecido n'esta cidade, onde teve uma fabrica, esta vivendo na miseria. Eu desejo pedir ao sr. ministro da justiça explicações a este respeito, e tambem ao sr. ministro do reino, porque este assumpto não é só criminal, mas policial.

Com este fim mando para a mesa a minha nota de interpellação.

(O orador não reviu o seu discurso.)

«Desejo interpellar os srs. ministros do reino e da justiça, relativamente ao roubo da herança de José da Costa Carneiro, fallecido em 1856, sendo recebidas as inscripções que elle tinha averbadas em nome de sua mulher, por um individuo do mesmo nome do fallecido, que as vae cobrar por parte de sua mulher.

«Camara dos pares, 17 de maio de 1867. = Marquez de Vallada.»

O sr. Presidente: — Manda-se expedir com toda a urgencia.

Tem a palavra o digno par o sr. Ferrer.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, principio por declarar que faltei ás duas ultimas sessões por motivo de molestia; e pelo mesmo motivo não pude corrigir, nem ainda ver os discursos que proferi n'esta casa a ultima vez que fallei, e que saíram publicados no Diario de hontem.

Quando o correio foi a minha casa buscar os discursos, declarei-lhe que os não tinha podido rever, e no entretanto appareceram depois estes discursos publicados no Diario. Não farei a pintura exacta d'elles; e sómente digo que me parece que uma creança que tivesse acabado de fazer exame de primeiras letras não escreveria o que ali esta escripto.

Se não receiasse faltar ás regras da civilidade pediria a V. ex.ª e aos dignos pares que lessem o que ali está publicado. Acha-se ali formado o corpo de delicto, não sei contra quem, nem trato de o saber.

Sr. presidente, não posso comprehender como esses discursos foram publicados por tal fórma, sem ao menos se declarar que eu os não tinha revisto. É isto tanto mais para notar, quanto que no fim de um pequeno discurso, que vem proximo ao meu, e que é do sr. visconde de Chancelleiros, se acha a declaração de que s. ex.ª não tinha revisto o seu discurso. Acresce que as notas tachygraphicas, que me foram remettidas, não foram por mim emendadas em uma só palavra. E bastaria esta circumstancia, se o correio não fez a participação de que eu as não tinha corrigido, para no fim d'elles se dever fazer a declaração de que eu os não tinha visto. O que tudo isto prova é o mau serviço da casa.

Eu, sr. presidente, não aceito a responsabilidade do que esta n'esses discursos. Ainda que estou persuadido que, por mais baixo que seja o juizo que o publico faça de mim, ninguem acreditará que passasse pelas minhas mãos um documento d'aquella ordem.

Concluo, sr. presidente, pedindo a V. ex.ª que dê as ordens mais terminantes para que não aconteça mais o que agora aconteceu, e para que, não podendo eu rever os meus discursos, se declare no fim d'elles, que não foram por mim revistos.

O sr. Presidente: — A mesa vae averiguar quem foi o culpado d'essa falta, para dar completa satisfação a s. ex.ª

O sr. Ferrer: — Eu não peço satisfação alguma, nem accuso ninguem nomeadamente. O que peço é que, quando eu não revir os meus discursos, se faça no fim a declaração de que os não revi, como é costume.

O sr. Presidente: — O pedido de V. ex.ª será devidamente attendido.

O sr..Marquez de Niza: — Na sessão do dia 10 entrei n'esta casa quando tinha acabado a votação nominal sobre o projecto de lei relativo ao imposto do consumo, mas não estava ainda proclamada a votação; estavam os srs. secretarios contando, em voz baixa, os votos; eu pedi a palavra e apresentei o meu voto, na esperança que elle podesse ainda ser contado. Como V. ex.ª porém se oppozesse a isso e me dirigisse algumas palavras que mal ouvi, calei-me, esperando que se proclamasse a votação, e suppondo que talvez V. ex.ª tivesse annuido ao meu pedido; entretanto o sr. marquez de Sousa deu conta do resultado da votação, em que o meu nome não vinha consignado; então tornei a pedir a V. ex.ª que tivesse a bondade, ouvida a camara, de annuir a que se lançasse na acta o meu voto. Assim se passaram as cousas, e eu appello para o testemunho de toda a camara.

Na sessão do dia 10, que vem publicada no Diario do dia 15, vejo completamente alterados os factos; diz-se que eu cheguei aqui depois de proclamada a votação, e para se sustentar esta falsidade pozeram-se na minha bôca palavras que eu não proferi, e que evidentemente foram introduzidas, para confirmar esta falsidade.

E notavel esta coincidencia do motivo da minha queixa com o que disse o digno par, o sr. Ferrer, o que prova quanto necessario se torna chamar a attenção da mesa e a da commissão do regimento, a fim de fazer cessar, quanto antes, este escandalo vergonhoso, e para que as notas tachygraphicas, que se mandam a casa dos pares, não vão, como acontece muitas vezes, cheias de parvoíces e de necedades que nenhum de nós tem paciencia de corrigir; e quando o individuo que fallou quizesse recorrer á sua memoria, os disparates que apparecem nas notas tachygraphicas são taes que não póde achar-se o fio do discurso.

Queixando-me d'isto, refiro me sobretudo e principalmente á redacção, que tem a maior culpabilidade em que estes factos se dêem pela fórma que acaba de ser narrada, faltando-se assim ao respeito devido a esta camara e a cada um dos seus membros, apresentando-se não só o que se diz, mas até os factos que se dão, de uma maneira desfavoravel na opinião publica.

Recommendo pois muito particularmente a V. ex.ª, e a quem esta encarregado do regimento, que se ponha um freio a estes maus empregado» d'esta casa.

O sr. Presidente: — Se V. ex.ª tivesse visto as provas que lhe haviam de ter sido mandadas, já não aconteceria isto de que se queixa.

O sr. Marquez de Niza: — Eu estou no meu direito de não ver as provas quando julgo não serem importantes, mas eu não me refiro só ás palavras que proferi, refiro-me aos factos adulterados, porque ainda que eu recebesse as provas do que disse, não podia conhecer o que dizia respeito aos factos senão pela publicação da sessão que se deu passados cinco ou seis dias.

O sr. Presidente: — Se V. ex.ª tivesse visto as provas já isto não acontecia.

O sr. Marquez de Niza: — Torno a dizer a V. ex.ª que estou no meu direito de as ter ou de as não ter, e nem por isso cessa a obrigação de outros cumprirem com o seu dever.

O sr. Presidente: — Mas a mesa é que não tem obrigação de rever os discursos dos dignos pares. Seria descer da sua dignidade. Os dignos pares que querem que os seus discursos sejam exactos, revêem as provas como sempre se tem feito. A isto comtudo a mesa e a commissão administrativa hão de attender conforme o seu dever e as determinações da camara.

O sr. Marquez de Niza: —V. ex.ª permitte-me que eu responda? Ponhamos de parte o que é relativo ao que eu disse, mas subsiste a adulteração voluntaria; do que se passou retirarei a parte relativa ao meu discurso, visto V. ex.ª ter me dado essa lição que agradeço e que aproveitarei, mas a parte relativa á adulteração voluntaria dos factos, essa subsiste e sobre isso é que eu peço que se faça justiça.

O sr. Presidente: — Nós devemos sempre ser justos; por isso peço a V. ex.ª que retire as palavras adulteração voluntaria. Nós devemos ser muito sobrios em accusar pessoas que não se podem defender aqui. Não posso por isso admittir a palavra voluntaria, porque não esta provado nem póde estar, que houvesse adulteração por acto voluntario quando póde haver muitas causas que podessem induzir em erro as pessoas que prepararam essa sessão.

O sr. Marquez de Niza: — Se não houvesse adulteração das minhas proprias palavras, poderia suppor que a outra não era voluntaria, mas desde que são as minhas proprias palavras transtornadas e adulteradas completamente, não posso retirar a palavra. A camara póde por uma votação resolver isso, mas eu sem essa manifestação da camara não a retirarei.