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DIARIO DO GOVERNO.

é isto de accôrdo com o General, então chamado rebelde ou revoltoso. Sr. Presidente, qual foi o resultado? Um sequestro nos meus bens por ordem dos Generaes, e do Sr. Gosta Cabral, hoje S. Ex.ª o Ministro da Justiça! Um sequestro, Sr. Presidente, por motivos politicos, mandado fazer por alguns dos homens desembarcados nas Praias do Mindello, e que trouxeram á frente o Codigo das garantias Portuguezas!

Sr. Presidente, custa a acreditar, mas foi certo; assim como ser eu intimado para ir residir em Midões, para onde se tinha mandado Um plano para eu ser assassinado. Tambem fui chamado ao Juizo Correccional, mais o meu amigo, Delegado hoje em Setubal; julgo unicos em Portugal deste modo perseguidos naquelle tempo. Sr. Presidente, premitta-se-me dizer mais, fui perseguido e sequestrado pelos homens do Usurpador em 1828, porém estes foram mais benignos, porque não tinham em frente na terra da minha naturalidade o Juiz Amaral, executor das determinações da Alçada que acompanhou o Exercito de Setembro, e cujo Juiz ainda se acha no mesmo Logar ha mais de tres annos, Logar aonde perseguiu, e continua a perseguir os homens que não são do seu partido. Ministro, que soube aproveitar boas custas no processo do sequestro que me fez, mandando contar vinte idas a minha casa na Batalha, não tendo alli ido mais do que uma!

Eis-aqui, Sr. Presidente, considerações que eu teria omittido se não visse que ficam sempre impunes estes excessos, os quaes se devem apresentar á vindicta publica para os avaliar justamente como merecem.

Sr. Presidente, concluo em dizer, que devemos ser fieis ao juramento que voluntariamente tivermos prestado: jurámos a Constituição de 1838; sobre ella se devem basear as Leis para fazer estavel a tranquillidade no nosso Paiz; serviços que os nossos Constituintes anciosamente esperam das Camaras presentes, devendo acabar todas as animosidades de partidos. E o meio é empregar a todos os individuos complicado nos acontecimentos de que se tracta, não demittindo quem se achar empregado, seja qual fôr a sua côr ou opinião com tanto que cumpra com os seus deveres, e que não intrigue. Este é o meu modo hoje de pensar. (Apoiados)

O Sr. Basilio Cabral (sobre a ordem): — É costume geralmente seguido no Parlamento Portuguez, todas as vezes que se tracta de discutir um Projecto de Lei, assistir á discussão delle o Ministro da Repartição a que o objecto desse Projecto de Lei diz respeito: é este exactamente o caso em que presentemente nos achâmos, accrescendo, que este Projecto de Lei teve origem na Camara dos Srs. Deputados por uma Proposta do Governo. Em consequencia digo, que me parecia conveniente convidar-se o Sr. Ministro da Guerra para vir assistir a esta discussão.

O Sr. Presidente: — Este Projecto foi dado para ordem do dia de hoje, e o Ministerio tinha disso noticia; por tanto se elle o julgasse conveniente, teria comparecido para tomar pane na sua discussão (apoiados). Tem a palavra o Sr. Leitão.

O Sr. Leitão: — Sr. Presidente, não tencionava fallar acêrca deste Projecto, porque tendo a deliberação de o approvar, e conhecendo que a maioria da Camara, ou para melhor dizer, a Camara toda, estava disposta a approva-lo por entender que é de toda a justiça, assentava eu que não devia tomar tempo á Camara fazendo algumas reflexões sobre a sua materia; porém como um illustre Senador que já ha dias pediu a palavra para fallar sobre a materia do Projecto, quando elle entrasse em discussão, pareceu pelo seu discurso que não só queria increpar a Administração actual, mas tambem ai Administrações anteriores, de uma das quaes «u fiz parte, e de outros amigos meus; julguei por isso ser de absoluta necessidade o pedir a palavra á V. Ex.ª, para fazer algumas observações a respeito do que acaba de dizer o illustre Senador.

Sr. Presidente. Bem longe de ser injusto o Governo por não dar ao Decreto de 4 d'Abril a extenção, ampliação, ou interpretação que o illustre Senador diz que lhe devia dar, eu digo que fez o que devia, não fez o que não podia fazer, e seguiu as regras da justiça (apoiados). O que contém o Decreto de 4 d'Abril? Contém um acto do Poder Real, concedendo amnistia, ou, por outras palavras, determinando o esquecimento e absoluto silencio sobre os acontecimentos pastados a que se refere mas este Decreto não comprehendia, nem podia comprehender a especie que se apresenta neste Projecto (apoiado). É necessario, Sr. Presidente, não digo, não conhecer, não digo, ignorar, mas certamente, não se recordar, em quer consistem os effeitos necessarios de uma amnistia, ou de um Decreto de esquecimento, para lhe attribuir tal amplitude. A Constituição da Monarchia diz que pertence ao Rei conceder amnistia em caso urgente, e quando o pedir a humanidade, e o bem do estado. A amnistia concede-se, quando se dão circumstancias, em que as Leis, parece, deverem considerar-se inapplicaveis; circumstancias, em que a acção multiplicada das Leis teria todos os espiritos em sobresalto, e produziria inquietações, que precipitariam em resoluções violentas, e perigosas. Então é perciso desarmar as Leis, e entrar de novo em uma ordem de coisas, em que todos recebem protecção igual.

Ora, em que consistirão os effeitos naturaes da amnistia? Consistem, primo, em inhibir as authoridades de tornar conhecimento desses factos: — segundo, em repor todos aquelles, que nesse Decreto são comprehendidos, no gôso dos seus direitos civis e politicos; mas neste gôso dos direitos politicos não se comprehende a restituição aos empregos que legalmente se perderam, não havendo declaração expressa; e muito mais quando esses empregos senão podem dar senão por uma escala fixa, regular, impreterivel. A respeito destes não podia o Governo, nesse Decreto de amnistia, fazer essa ex-pressa declaração, porque ella excedia os seus poderes. A demissão dada aos militares que a pediram, não póde em si considerar-se uma injustiça do Ministerio, para poder ou dever ser remediada por elle, ou pelos subsequentes Ministerios; por quanto esse acto de pedir a demissão, que alguns Militares praticaram, foi um acto de renuncia ao qual o Governo accedeu, (apoiados). E tambem, Sr. Presidente, sendo a amnistia um Decreto de esquecimento, ou de absoluto silencio, segue-se, como consequencia necessaria, que, pelo que respeita a terceiro, toma as coisas no estado em que se acham no momento de sua publicação: e não se podendo duvidar que neste caso havia terceiros interessados, e com direitos adquiridos, (porque, segundo a Legislação militar, a. antiguidade e a actividade do serviço dá direitos que não podem ser violados), o Governo não podia por um acto seu offender estes direitos, com a publicação de um Decreto de amnistia. E estando fixada a maneira de se fazerem as promoções, e sendo a regra geral estabelecida na Lei, que estas sejam reguladas pela antiguidade dos Militares effectivos; segue-se, que o Governo não tinha authoridade por um acto seu, para proceder, violando esta Lei. Eis-aqui os motivos pelos quaes o Governo, nem podia dar maior amplitude ao Decreto de amnistia, nem tambem podia interpretar da maneira, que se disse. Verdade é, que se o Decreto precisasse interpretação, não era por uma Lei que devia ser interpretado; que não é por um acto do Corpo Legislativo que ha de ser interpretado um acto proveniente da Real Prerrogativa = Ejus est interpretare, cujus est condere = O Governo publicou aquelle Decreto, e se elle precizasse interpretação, só o Governo é que, o podia interpretar; mas, Sr. Presidente, esse Decreto não precisa interpretação, porque o seu espirito é clarissimo; não comprehendeu, como não podia comprehender, o caso de que se tracta. Todos os Ministros que referendaram esse Decreto (e eu fui um delles), desejavam que se fizesse então, o que agora se pretende fazer por este Projecto de Lei; mas esses Ministros sabiam bem quaes eram os seus direitos para usar delles, os seus deveres para os não violar, e os limites da sua authoridade para os não ultrapassar (Apoiados).

Sendo pois certo, que a providencia, de que se tracta, não póde ser regulada senão por uma Lei, será justo que se faça esta Lei? Sobre este ponto eu não desconvenho da opinião do illustre Senador. Esta Lei é justa, porque as considerações particulares que se poderiam fazer a respeito de terceiros, devem ceder no caso presente á rasão politica: é necessario por uma vez extirpar o germe de todas as divisões, e destruir as raizes de todos os odios e dissensões, que nos têem dividido, para que possamos um dia vêr levantado felizmente entre nós o altar da concordia (apoiados geraes). Agora direi, Sr. Presidente, que a regra que manda regular as promoções pela antiguidade, não obstante ser uma regra geral não é tal, que não tenha excepções nas Leis Militares existentes; não tractarei agora de indicar, ou fazer a enumeração dessas excepções; porque além de ser isso desnecessario, seria tambem inopportuno o fazê-lo, diante de uma Assembléa aonde estão, tantos e tão abalisados membros da profissão militar; mas julgo bastante o dizer, que estabelecendo as Leis actuaes já excepções a aquella regra geral, não é muito que, no caso presente, cesse o rigor dessa regra por motivos tão ponderosos, e tão dignos da consideração do Legislador. Nem eu supponho, que haverá no» Exercito um só digno Official que não estime, e senão encha de satisfação, veneno entrar de novo nas fileiras aquelles que a seu lado combateram a tyrannia; nem supponho, que haja. algum, que senão encha de prazer ao abraçar de novo os camaradas, que partilharam todos os seus perigos, assim como participaram sempre, da sua gloria (Apoiados).

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira: — A Lei que está em discussão, refere-se a militares que, quasi sem excepção, serviram a Causa da independencia e da Liberdade do Paiz; Officiaes; que por circumstancias politicas, deixaram o serviço. Foi seguramente com grande prazer que a Administração de que eu tinha a honra de fazer parte viu que esses Officiaes queriam dimittir-se; mas o Governo, viu-se inhabilitado a oppôr-se a que elles sahissem do Exercito. O illustre Senador pela Guarda acaba de explicar as razões porque o Governo, quando lavrou o Decreto da amnistia, não pode comprehender esta classe de militares; razões que foram ponderadas naquella occasião,

É pois com grande satisfação que eu concorro com o meu voto para que esses militares voltem ás fileiras; e parece-me, que o mais conveniente, é approvar a Lei como ella está (Apoiados).

O Sr. Trigueiros: — Tão cabalmente se combina com as minhas idéas, o que acabou de dizer ha pouco o Sr. Manoel Duarte Leitão, que eu poderia dispensar-me de accrescentar nadai ao que elle disse, ou porque tudo está dito, ou porque se disse melhor do que eu o podarei dizer. Mas, Sr. Presidente, eu não posso neste momento deixar do pagar um tributo de respeito áquelles que podem; ter parte na Lei, que este Senado está para votar. Este Projecto deve ser olhado por dous lados: primeiro, se a Lei é necessaria; e segundo, se é util. Senão estes dous pontos que eu tractarei com toda a brevidade que o estado de clareza, em que a questão se acha, exige de mim.

Será a Lei necessaria? Eu digo que é necessaria; tão necessaria que sem ella julgou o Governo que não podia reintegrar estes militares, e eu julgo, que o Governo andou bem. Pretendesse que a amnistia é comprehensiva não só do delicto, mas tambem do acto pelo qual os Officiaes militares pediram sua demissão; pessoas ha que tem podido achar motivo de questionar, e á força de sophismar a questão tem progredido; vejamos porém o que é amnistia. — Amnistia é uma palavra grega, que foi adoptada pelos Romanos; passou destes para algumas Nações modernas da Europa, que a tem empregado com a mesma significação. Sr. Presidente, o que é a amnistia pelos proprias palavras que empregam os que tem definido estas palavras injuriarum, et offemionum oblivio, esquecimento das injurias, e das offensas, que se tem commettido; mas se esta só definição não basta, eu serei obrigado a trazer o testimunho daquelles que a introduziram no Codigo das palavras, e provarei com elle o uso que della se fazia, e as idéas, que elle comprehende. Que esta não comprehende mais que o esquecimento do delicto, é tão evidente, que Cicero dizia que se lisongeava de ter introduzido a palavra amnistia na lingoa dos Romanos, e que acreditava que esta introducção não seria inutil, applicando-se a idéa que ella significava aos crimes que as guerras civis tinham occasionado, porque elle entendia que nem todos os crimes das guerras civis deviam ser punidos: e Cicero entendia que sómente a respeito á delictos é que se empregava a palavra amnistia, e Cicero foi o introductor da palavra na lingoa Latina, e é desta, que ella passou para outras lingoas, e para a nossa. Eu não posso considerar que estes militares praticassem um delicto, e por isso ella não os póde comprehender. Tenho ouvido trazer as intenções de cada um, tenho ouvido fazer uso dellas para provar a desnecessidade desta Lei, sei que se augmenta com as circunstancias que forçaram os Officiaes a pedirem sua demissão; mas que são intenções perante a Lei? E dessas intenções, e dessas cir-