19 DE JANEIRO DE 1956 711
estudos ou trabalhos de investigação científica na Bélgica. O Governo Português aceitou a permuta; oferecendo uma bolsa equivalente, e as duas Administrações chegaram a acordo sobre - as condições - da mútua concessão. Quase ao mesmo tempo, retomou-se o estudo do anteprojecto pendente e obteve-se um texto definitivo do Acordo que mais ou menos se ajustava ao cânone habitual destes instrumentos. Restava a oportunidade da assinatura. Ofereceu-a a auspiciosa visita a Portugal do Sr. Paul Henri Spaak, estadista notável, Ministro dos - Negócios Estrangeiros do Governo de Bruxelas. O instrumento do Acordo cultural entre Portugal e o reino da Bélgica foi finalmente assinado em Lisboa, no dia 30 de Julho de 1955, pelos respectivos plenipotenciários, Ministros dos Negócios Estrangeiros dos dois países, Srs. Paul Henri Spaak e Paulo Cunha.
8. Corresponde este diploma ao que seria lícito esperar dele, dadas as esplêndidas tradições da nossa cultura e os altos interesses actuais das duas Portes contratantes? No decurso das negociações o texto do Acordo foi sensivelmente reduzido. Tem apenas novo artigos, ou sejam menos seis do que o anteprojecto belga. No artigo 1.º define-se o objectivo geral do diploma: «promover e estreitar por meio de amigável colaboração as relações culturais existentes entre os dois países». O artigo 2.º sofreu alterações. No anteprojecto belga entregava-se a uma comissão mista, constituída desigual número de membros por cada uma das potências signatárias, o encargo de aplicar e interpretar o Acordo. Era, aliás, a fórmula adoptada pela Bélgica em todos ou quase todos os Acordos intelectuais que assinara (Acordo com a França, de 17 de Junho de 1921; com o Luxemburgo, de 21 de Setembro de 1923; com a Polónia, de 1 de Setembro de 1925; com os Países Baixos, de 26 de Outubro de 1927; novo Acordo com a França, de 22 de Fevereiro de 1946; Acordo com a Grã-Bretanha, de 17 de Abril do mesmo ano; novo Acordo com os Países Baixos, de 16 de Maio de 1946). Portugal, porém, não aceita a comissão mista, porque na orgânica do Estado existe a título permanente, um organismo - o Instituto e Alta Cultura - em cujas atribuições cabe, por definição legal, o exercício dessa função, ou seja a regulamentação e execução dos Acordos culturais internacionais. Portanto, ou o Instituto se entende directamente, para o aludido fim, com o organismo autorizado que a outra potência signatária designar, ou nomeia delegados seus para com os - delegados da outra Parte constituírem a comissão mista, ou comissão executiva do Acordo, recurso mais ou menos elegante de que se lançou mão durante as negociações da Convenção Cultural entre Portugal e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, de 19 de Novembro de 1954 (veja-se o parecer da Câmara Corporativa n.º -14/VI, Actas n.º 15, de 5 de Fevereiro de 1955). A primeira solução, agora adoptada, é evidentemente a preferível. Os artigos 3.º, 4.º e 5.º dizem respeito às relações interuniversitárias: criação, nas Universidades e escolas, superiores, de institutos, cursos e conferências para o estudo da língua, literatura e história de ambos os países; bolsas de estudo instituídas por cada Parte contratante a favor de nacionais da outra que desejem «prosseguir estudos ou investigações destinados a completar a sua formação técnica»; equivalência de títulos, graus ou diplomas académicos, «inclusive para efeitos de exercício profissional». Nenhuma objecção a Câmara opõe à doutrina destes artigos. Trata-se de formas de cooperação clássicas, estudadas e previstas nos congressos e conferências que se têm ocupado das relações interuniversitárias, em especial no Third Congress of the Universities of the Empire (Oxford, 1926) e na Conférence Internationale d'Enseignement Supérieur (Paris, 1937). É de notar que o artigo 4.º não distingue - e muito bem - entre Universidades e outras escolas ou serviços públicos, porque não é só nas Universidades que se faz investigação científica ou se completa a especialização de técnico». Quanto ao artigo 5.º, convém observar - já- esta Câmara o fez respectivamente à Convenção com a Grã-Bretanha - que uma coisa é a equivalência de escolaridade e de diplomas, lugar comum nesta espécie de estatutos internacionais, outra - porque envolve problemas estranhos à cultura - à autorização aos naturais de um país para exercerem noutros países determinadas profissões. Entretanto, convém esclarecer que o estipulado neste artigo não envolve qualquer compromisso formal, deixando a cada uma das potências signatárias o estudo das condições e medida em que «poderá ser reconhecida a equivalência». O artigo 6.º estabelece a extensão extra-universitária e
extra-escolar do intercâmbio. Não se estimula apenas a troca de professores e estudantes, quer dizer, daqueles que vêm expressamente para ensinar, investigar ou aprender; alarga-se o âmbito das relações científicas e literárias; prevêem-se as «viagens de contacto» dos visiting professors, o convívio internacional de artistas, de escritores, de altas personalidades representativas da cultura do espírito, que precisam de conhecer-se para conviver e de conviver para colaborar. Refere-se este artigo a uma forma de colaboração discriminada, que parece repugnar à natureza dos acordos intelectuais propriamente ditos: o «estudo em comum dos problemas respeitantes aos territórios ultramarinos». Dir-se-á - e efectivamente se disse - que o primeiro passo para o estudo em comum destes problemas teria sido a aplicação pura e simples do próprio estatuto aos territórios do ultramar. Com efeito, este instrumento é restritamente metropolitano, ao contrário, por exemplo, do Acordo Anglo-Belga de 1946 e do Acordo Belgo-Norueguês de 1951, que incluem já nas suas estipulações a aplicação aos territórios ultramarinos. Nada, porém, impede as Altas Partes contratantes de tomarem ulteriormente sobre ú assunto as resoluções que lhes pareçam oportunas. Quanto à pretendida impertinência da matéria no texto de um Acordo cultural, convirá não esquecer que no ultramar também - há cultura. O artigo 6.º limita-se a reconhecer de jure uma colaboração que já há muito tempo existe de facto. Que têm sido senão criação de ciência e convívio de sábios a Convenção Sanitária de 1927; a Conferência de Bruxelas de 1928; a benemérita cooperação dos dois Institutos de Medicina Tropical, de Lisboa è de Antuérpia; as jornadas internacionais africanas de Gand, onde peritos portugueses e belgas cordealmente se encontram; a frequente troca de visitas entre figuras relevantes da cultura ultramarina - o Prof. Norberto Laude, reitor da Universidade Colonial de Antuérpia, e o Prof. Mendes Correia, director do Instituto Superior de Estudos Ultramarinos, o Prof. Van der Berghe, director do Instituto de Investigação Científica da África Central e o Prof. Fraga de Azevedo, director do Instituto de Medicina Tropical de Lisboa? Nada, pois, a Câmara opõe ao preceituado no artigo 6.º, na parte respectiva ao estudo em comum do» problemas do ultramar. Restam os artigos 7.º e 8.º, porque o artigo 9.º inclui apenas as disposições escatocolares usuais (ratificação, vigência, denúncia). O artigo 7.º estatui sobre a» restantes formas de expansão da cultura que as Partes contratantes se comprometem a facilitar: conferências, concertos, difusão do livro, exposições de arte, rádio,