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1118 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 110

O uso das transfusões em doentes do foro médico também aumentou e, com os progressos da técnica de fraccionamento de plasma (E. J. Cohn), foi possível isolar fracções com notável interesse para o tratamento de substituição de certos defeitos da coagulação sanguínea.
Certamente que no futuro estas fracções poderão entrar no uso corrente.
O fraccionamento trouxe reais vantagens: isolaram-se a gama-globulina e ti albumina, (fracção IV) e, além destas, substâncias de importante acção coagu-lante local, como o fibriuogénio purificado, a espuma de fibrina com trombina e o filme de fibrina. A aplicação de albumina vai sendo cada vez mais corrente na terapêutica dos estados de choque; tem também todo o interesse o seu emprego em situações de hipopruteinemia, como na cirrose hepática, no síndrome nefrótico e no edema por deficiente nutrição. A vantagem do seu emprego sobre o do plasma reside em eliminar a possibilidade de aparecimento da hepatite de soro homólogo.
Hoje em dia, quando nos situamos num plano de paz, verificamos já que as exigências de sangue são notáveis: em França, Aujaleu e Laporte (1953) falam de 420 000 l anuais, o que corresponderia a l milhão de dadores, cada um dando sangue uma vez por ano.
Se é certo que num país em guerra as reservas existentes e a produção quotidiana não poderão suprir as necessidades então verificadas por melhor que seja a organização existente, também é verdade que, quanto mais eficazes forem os serviços de transfusão em tempo de paz, menos difícil será acudir a essas necessidades aumentadas.
Por estes factos, em quase todos os países o problema tem sido abordado por intermédio de programas nacionais de sangue.
A estas razões comuns a todos os países e que por si sós bastariam para rever também o assunto em Portugal juntam-se entre nós outras, as que se encontram referidas no preâmbulo do projecto e que conferem ao referido assunto uma acuidade muito particular.

II Exame na especialidade

2. No projecto da proposta de lei n.º 521 o Governo estabeleceu as bases que considerou necessárias para a resolução de um grave problema - pôr à disposição da população sangue humano em quantidades suficientes para fins terapêuticos.

As múltiplas aplicações do sangue e a gravidade das situações clínicas em que este é praticamente a única arma eficaz ao nosso alcance dão, em face das quantidades de que hoje podemos dispor, um carácter nacional ao problema.
Se as exigências de sangue são já tão importantes na paz, muitíssimo maiores serão, como se disse, durante a guerra. Há então que acudir ás enormes necessidades das forças combatentes e às da própria população civil, multiplicando-se os acidentes em que é preciso ministrar sangue.
Na terapêutica dos acidentes pelos bombardeamentos atómicos prevê-se ainda um maior emprego de sangue e seus derivados, já porque se depara com grande número de estados de choque, em especial em virtude de traumatismos e queimaduras, já porque há necessidade de combater as consequências das acções ionizantes sobre a medula óssea. Além disso na terapêutica anti-infecciosa destes indivíduos a par do tratamento antibiótico preconiza-se hoje o emprego da gama-globulina.
Numa guerra moderna as tropas combatentes e a população civil precisam, pois, de ter u sua disposição, quantidades excepcionalmente grandes de sangue. Isto exige uma notável eficácia dos serviços civis de transfusão; mais um motivo para estar justificada a proposta de criação de um Instituto Nacional de Sangue.

Mas exige-se mais: uma perfeita concatenação dos serviços de sangue civis e militares, a existência de planos maduramente estudados para a sua aplicação em caso de guerra.
Exige-se, portanto, a elaboração de um programa nacional de sangue.
O problema poderia ser desde já completamente equacionado. Para tal seria necessário propor a criação de um organismo num plano superior ao do Instituto e do Serviço de Transfusão do Exército,, com atribuições de supervisão dos problemas do sangue e, como tal, coordenador dos blocos civil e militar.
Deve-se ponderar, porém, que, em face da gravidade da situação actual, urge montar e pôr a funcionar o organismo técnico para que a população possa dispor da quantidade de sangue de que necessita. Este é, sem duvido, o ponto essencial da questão.
As demoras inevitáveis a que conduziria a constituição do referido organismo e os morosos trabalhos preliminares necessários para a coordenação dos blocos militar e civil viriam retardar o começo do funcionamento do Instituto Nacional; afigura-se-nos que no estado actual este resultado envolveria uma certa gravidade.
A criação de um Conselho Superior, que continuamos a considerar imprescindível, poderia sei levada a efeito mais tarde, quando o Instituto já estivesse em pleno funcionamento. Então, no estudo dos planos de coordenação já se podia contar com dois valores reais, que seriam os resultantes do funcionamento do Instituto Nacional de Serviço de Transfusão de Exército.
Sem dúvida que o organismo chave da eficácia de um programa nacional de sangue é o Instituto cuja criação o Governo propõe.
Se por um lado as necessidades já actualmente existentes exigem o rápido funcionamento deste organismo, por outro, o mesmo funcionamento rápido se lhe impõe para que no mais curto lapso de tempo o referido Instituto se encontre em condições de acudir ws necessidades de sangue que podem resultar de uma guerra, alteração da ordem pública ou outra calamidade nacional.
A Câmara é de parecer que a existência de um Conselho Nacional de Sangue funcionando como órgão de Instituto terá todas as vantagens no momento actual como órgão coordenador, sem os inconvenientes apontados atrás.

3. Uma questão de fundo não se encontra explícita no projecto. Deve ficar bem expresso que desde a colheita à utilização terapêutica do sangue e derivados se trata de uma sucessão de actos médicos e que, portanto, só podem ser executados por licenciados em Medicina ou sob a sua inteira responsabilidade. Isto encontra-se em legislações estrangeiras. No quadro de princípios resultantes de um inquérito feito pelo coronel Dr. J. Julliard afirma-se que a «responsabilidade do sangue e seus derivados deve ser confiada a médicos».

Se este ponto é suficientemente claro, outro se nos afigura mais complicado, a saber: se o acto de injectar sangue pode ser levado a efeito por qualquer médico ou apenas por médicos qualificados pelos serviços de transfusão.
Apesar das sérias razões que se possam aduzir não é possível infringir o princípio básico de que se não pode opor limites ao exercício profissional do médico.