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808-(38) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 100

Letchworih comprova, na defesa dos alimentos e drogas, nos métodos para evitar a má nutrição e subalimentação e a medidas tendentes a defender o homem dos agentes causadores da doença. Calcula-se que bastante mais de 50 por cento da diminuição da mortalidade de um país europeu, aliás de mau clima, foi devido ao progresso realizado neste aspecto nos últimos cinquenta ou sessenta anos. E o caso do Rio de Janeiro e de zonas sezonáticas no Oriente e na Europa ilustra de maneira clara a influência dos meios preventivos.
Não foi possível coligir os elementos precisos para discutir, com a minúcia e base necessárias, as repercussões da falta ou imperfeição do que nesta nota se designa por meios protectores ou preventivos. Diversos inquéritos já foram tentados no sentido de determinar a sua influência, mas parece não terem sido ainda feitos estudos minuciosos com a devida coordenação. Contudo, não pode sofrer dúvidas já o facto de que o desenvolvimento da tuberculose em Lisboa e noutras cidades deriva de alimentação insuficiente e das condições de moradia em que vive grande parte da população - concentrada na promiscuidade de quartos acanhados, sórdidos, sem luz nem sol, sujeita a perigosos contágios; que o sezonismo está a alastrar por virtude da indiscriminada e improgressiva cultura dos arrozais; que a grande maioria de casos do febre tifóide deriva da insuficiência e contaminação das fontes; que variadas doenças resultam das estrumeiras, que são viveiros de moscas e outros insectos; que a má nutrição e subalimentação causam por todo o País o raquistimo, a pelagra, o béri-béri, o escorbuto, a cárie dentária, as anemias e outros males; que a falta de vacina ainda dá lugar a epidemias de varíola; que as condições de trabalho de muitos estabelecimentos industriais atacam a saúde do operário e diminuem o seu rendimento; numa palavra, que a sociedade seria melhor protegida se houvesse sensível progresso nos meios protectores da sua saúde c preventivos da doença.
Qualquer reforma dos serviços da saúde e da doença tem de considerar os meios protectores Por outras palavras, isto quer significar que o problema da saúde em Portugal não se resume apenas à construção de mais hospitais e melhoria nas suas instalações, ao alargamento de clínicas às zonas mais atrasadas, ao estabelecimento de sanatórios, dispensários, preventórios, centros assistenciais ou de saúde e outros métodos de debelar ou curar a doença. Tem de ir mais ao fundo. Tem de destruir as causas que provocam as doenças, quer elas sejam de natureza física e geral, como a remoção de estrumeiras e lixos, a protecção de fontes, os esgotos e outras, quer elas sejam de natureza mais individual, como a vacina, a propaganda dos perigos da subalimentação e má nutrição.
Só um plano de conjunto, a executar dentro de certo número de anos, em que colaborem as entidades oficiais - do Governo Central e das autarquias locais -, todo o corpo clínico, os jornalistas e as estações radiodifusoras, o professorado de todos os graus, mas especialmente o primário, o clero e todas as pessoas de boa vontade, na agricultura e na indústria e em outras formas de actividade, só um plano verdadeiramente nacional pode levar a resultados definitivos na melhoria da saúde em Portugal.
Ora, isto não depende apenas dos chamados serviços da saúde, nem do próprio Estado. Desviar em cada ano cada vez maiores quantias para a cura da doença é uma medida necessária, mas aleatória ou temporária, porque, enquanto não forem destruídas as causas fundamentais que originam a doença, hão-de afluir aos hospitais doentes cada vez em. maior número, pois a população tende a aumentar e as causas que destroem o contágio ou geram a doença persistem inalteráveis ou agravadas.

A necessidade de um largo inquérito

32. Quase todos os anos, desde que se iniciou a elaboração destes pareceres, os serviços da saúde têm merecido uni lugar de relevo dentro dos estreitos limites de espaço consentido pelo grande número de assuntos que é mister examinar na apreciação das contas do Estado. E que a saúde pública interessa ao País e a todos os seus habitantes por muitos motivos. Pode julgar-se que esta insistência, bem acentuada, sobre as vantagens de tornar mais eficientes os serviços da saúde, por melhor organização e reforço apreciável das verbas orçamentais, resulta da natural tendência do espírito ou cultura de quem escreve, Realmente a saúde pública tem para o economista unia importância fundamental, porque o custo da doença e as perdas de trabalho útil dela derivadas representam na economia das nações modernas uma percentagem sensível nos rendimentos globais, e, por consequência, no seu bem-estar material. Mas a insistência sobre o reforço das verbas e a eficiência dos serviços provém essencialmente do exame da vida portuguesa no seu aspecto político e sanitário, tanto nos meios rurais como citadinos, sobretudo nos primeiros.
O estudo de vários relatórios, alguns bem interessantes e profundos, e de elementos contidos nos anuários estatístico e demográfico em vários opúsculos e inquéritos editados pela Sociedade das Nações e outras entidades sobre higiene e sanidade, e o exame cuidadoso da estatística portuguesa, que, pelos censos de 1930 e 1940. especialmente o último, e outros meios, fornece dados de grande interesse e valor sobre demografia e diversos assuntos relacionados com a saúde, permitem ajuizar do grande passo andado nesta matéria.
Foram indicadas nos pareceres das contas de anos anteriores as condições nacionais da mortalidade geral e infantil e compararam-se com as de diversos países do Ocidente. Discutiram-se também ràpidamente as causas que maior influência podiam ter no estado sanitário, como a habitação nas cidades e províncias, a necessidade de zonas de protecção para nascentes e fontanários, a existência de estrumeiras, os perigos do sezonismo, que irradia dos centros arrozeiros pelos ranchos migratórios para zonas indemnes, as deficiências e desequilíbrio da dieta nacional, bastante em calorias no Sul, onde faltam porém os alimentos protectores, falha de alimentos energéticos no Norte, embora pareça haver suficiência de vitaminas. Propuseram-se diversos alvitres, que poderiam beneficiar, sobretudo, a saúde das populações rurais, pela melhoria da habitação e a defesa das águas, e destruir outras causas fundamentais que tendem a perturbar o estado sanitário do País.
Discutiram-se largamente na Assembleia Nacional as propostas sobre assistência social e organização hospitalar e foram convertidas em leis. Mas uma e outra, embora com possibilidades legislativas de largo alcance, nunca poderão ir ao fundo do problema.
Já se escreveu muito sobre este assunto. Entrevistas, discursos, artigos em revistas especializadas e na imprensa diária têm chamado a atenção da opinião pública sobre questão tão importante para o futuro da raça portuguesa. No intuito de coligir de fonte oficial os elementos essenciais à boa compreensão e ao esclarecimento da actividade desenvolvida pelos poderes públicos e de fixar o que existe e o que há feito, o relator destes pareceres apresentou 1 na Assembleia um longo questionário e requereu, nos termos constitucionais, resposta às questões formuladas. Era seu objectivo dar conhecimento ao País, por intermédio do parecer das

1 Ver Diário das Sessões de 30 de Janeiro de 1945.