28 DE JANEIRO DE 1955 (441)
tado. Entra-se em plena liberdade de produção e comércio de vinhos. Abastarda-se o produto. Apresenta-se possivelmente pela primeira vez o problema do escoamento dos vinhos do Douro não exportados, quando sobrevêm a grande crise do oídio.
Uma dezena de anos depois, estamos em 1862, novo fiarei o cai sobre o Douro, mas este de afeitos bem mais funestos. Instala-se a filoxera. A produção diminui de ano para ano com o desaparecimento dos vinhedos, que quase se extinguem. Mas -facto estranho- a importação aumenta: os preços baixam, exportam-se em grande quantidade vinhos de outras regiões pela barra do Porto como se do Douro fossem, a qualidade avilta-se. O comércio exportador passa momentâneamente por um período de relativa prosperidade, enquanto que o Douro se debate na mais negra miséria.
Passada uma vintena de anos descobre-se finalmente o processo de se reconstituírem vinhedos imunes à filoxera. Aos poucos e timidamente refazem-se as vinhas no Douro. Quando novamente o Douro começa a produzir verifica amargamente que a exportação baixou e que os pregos oferecidos pelo comércio não permitem viver.
É precisamente nesta altura que João Franco, o grande recursor, a quem rendo as minhas sentidas homenagens, dá um golpe de mestre no liberalismo económico que norteava a política vitivínicola. É novamente a política da qualidade que orienta este ramo da nossa economia. Entre outras medidas tomadas para defesa da qualidade aponto: a delimitação da região do Douro, a defesa da marca Porto, e a proibição, por três anos, do plantio das vinhas nos terrenos abaixo da cota 30 m compreendidos nas bacias hidrográficas nos nossos principais rios.
O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª sabe informar-me se efectivamente se respeita essa disposição de não plantar abaixo dessa cota?
O Orador: - Em 1908 eu era ainda muito novo, mas estou informado de que a política de João Franco infelizmente não se manteve, e V. Ex.ª sabe a razão por que isso sucedeu.
Em resumo: a nossa história prova que no problema de exortação de vinhos o abandono da política da qualidade conduz sempre, ao fim dum certo tempo, a um depauperamento do sector económico em jogo.
Felizmente para o meu puniu de vista, estou bem acompanhado. Recordo algumas das resoluções tomadas recentemente pelo Office International du Vin. O comité insiste sobre:
Uma selecção de cepas e de solos; redução dos rendimentos excessivos incompatíveis com a qualidade; instituição da declaração obrigatória das colheitas: fortalecimento do contróle e da repressão das fraudes e finalmente limitação e se necessário for. proibição de novas plantações.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: justificada a política que perfilho, passo a abordam problema do plantio.
Em plena economia liberal é do livre jogo dos factores económicos que resulta o equilíbrio entre factores opostos. Se um deles não tiver condições de existência, acaba por ser destruído pelo outro. O vencedor fortalece-se e enriquece com os despojos do vencido.
A plantação não condicionada vai pôr face a face as vinhas das várzeas e as vinhas de encosta. Os trunfos da encosta são a qualidade, os da várzea a quantidade e o baixo preço de custo. Se tal luta se travasse em plena economia liberal, a vitória da várzea era certa, pelo menos momentâneamente. A grande propriedade da várzea. com a sua preponderância notória e potente força económica, em breve destruiria a propriedade de encosta. Felizmente, há muito que não impera o liberalismo económico e portanto, em teoria pelo menos, não deve ser de recear tal destruição.
Sr. Presidente: para esclarecimento do problema do plantio e seu futuro condicionamento vou passar em revista, muito por alto, o que entre nós se tem feito nessa matéria. Não me refiro novamente às medidas tomadas por Pombal e João Franco. Só indico alguma legislação mais recente.
A Lei n.º 1891, de 23 Março de 1935, além da proibição do plantio, manda, no seu artigo 5.º, arrancar l0 por cento das vinhas em plena produção situadas em terrenos de várzea e de cota igual ou inferior a 50 m. As disposições desta lei são logo atenuadas pelos Decretos-Leis n. os 25 270. de 18 de Abril de 1935, e 27 283, de 24 de Novembro de 1936.
Finalmente o Decreto-Lei n.º 38 525, de 23 de Novembro de 1951, permite as plantações nas várzeas à razão de 20 000 cepas por requerente e sem limite de quantidade, se o requerente declarar que as destina à produção de uvas de mesa. Além disso, permite a legalização de todas as videiras plantadas sem autorização, mediante o pagamento de 1$ por cepa.
Em resumo: do ponto de vista prático, tudo se +assa como se estivessem num regime de livre plantio, pois aqueles indivíduos que legalmente não puderem plantar mais de 20 000 pés têm ainda o recurso de plantar sem limite, se es uvas se destinarem a mesa. Além disso, como atrás foi dito, podem plantar qualquer quantidade sem pedido de autorização. Pois, querendo, podem legalizar a plantação. Lembro que no Douro a plantação oscila entre 4$ e 20$ por pé.
Não admira que neste conjuntura, caracterizada pela livre plantação e condicionamento de. preços de vinho, se apoderasse da lavoura a febre da plantação. E esta tanto maior quanto menor fosse o custo do plantio. Torna-se evidente que este regime se não podia manter. Toda a lavoura se apercebam que mais tarde ou mais cedo as autorizações de plantio viriam a ser suspensas. Por isso toca a plantar com a maior rapidez, enquanto é tempo. Era fatal a grave crise em que se começa a debater a viticultura nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: queixo-me amargamente de se não ter seguido uma política firme neste sector tão importante da nossa economia. Parece-me que, se tivesse havido a coragem de traçar e seguir com coerência uma política, essa só poderia ser a da qualidade. Mas, se porventura é a política da qualidade que, sem aparecer à luz do dia, dita as directrizes, peço que o declarem abertamente, para que as vinhas de encosta saibam que estão condenados á morte- morte inglória, que só traria prejuízos à Nação. Vantagens desta brutal destruição não as vejo. Só se se considerar vantagem o facilitar a concentração da propriedade vitícola. Tornar-se-ia mais fácil, depois de destruídas as vinhas de encosta. Concentrar toda a produção de vinho em cerca de cem grandes unidades de 20 000 pipas cada.
O Sr. Amaral Neto: - Isso tornar-se-ia possível?
O Orador: - Este programa utópico é monstruoso do ponto de vista social. Não merece, pela fantasia que encerra, que percamos mais tempo na sua apreciação.
Sr. Presidente: permito-me lembrar ao Governo a necessidade do numa futura revisão dos problemas da