DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 79 268
O Orador:-Sr. Presidente: creio ter sublinhado bem os méritos que, a meu aviso, teve o incidente, mas não me parece que deva concluir sem uma outra referência. Sem desejar conhecer do fundo das divergências que possa haver entre o ângulo de visão da Junta Nacional do Vinho e da organização corporativa da lavoura, sem pretender discutir as razoes que a uma e a outra assistam, e correndo embora o risco de as minhas palavras serem levadas à conta de camaradagem, queria ainda salientar a elegância de atitude e procedimento tanto do nosso colega Mário de Oliveira...
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-... presidente da Junta do Vinho, como do meu colega Caldas de Almeida, presidente da Corporação da Lavoura.
Com dirigentes da envergadura destes estamos todos de parabéns e podemos ficar todos tranquilos, pois se a Junta Nacional do Vinho prosseguir, com a colaboração de todos os interesses, no sen caminho em defesa da nossa economia vinícola, a Corporação da Lavoura dá-nos a inteira garantia de presença viva e activa em guarda da nossa lavoura, que bem carecida está de quem a defenda com entusiasmo, coragem e fé, mas também com equilíbrio e justiça.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador:-Hoje usei da palavra para louvar. Fi-lo com inteira satisfação, como, mais frequentemente, contrariado, tenho de criticar. A culpa não me pertence.
Hoje pude louvar.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Urgel Horta: - Sr. Presidente: sempre, através de uma existência que já não é curta, tenho demonstrado, nas mais variadas circunstancias, a admiração e o respeito que bem merecem os que, no campo social e político, no sector das ideias ou no domínio das actividades, abrangendo letras, artes ou ciências, fizeram demonstração plena como personalidades de altas dimensões, com reconhecido direito á consideração pública e à homenagem dos seus pares.
Jamais fugi às responsabilidades em que assenta a minha acção, orientada no sentimento do dever e firmada no conhecimento dos factos, que dão cansa e motivo às razoes em que se fundamentam as afirmações merecidamente laudatórias que do alto desta tribuna, como Deputado da Nação, na espontaneidade e na sinceridade do meu sentir, encerram homenagem devida a magníficos e meritórios atributos de varões ilustres que no Porto tiveram o seu berço. E, ontem como hoje, eu sigo tranquilamente o meu caminho.
Sr. Presidente: estão decorrendo com notável brilho, interesse e sentido as comemorações centenárias do nascimento do Prof. Ricardo Jorge, comemorações que culminarão, na sempre leal é mui nobre cidade do Porto, com a inauguração da sua estátua, talhada em bronze e assente no granito. Na praceta que se situa em frente do Hospital de S. João, onde ficará devidamente instalada a Faculdade de Medicina do Porto, que sucedeu à velha Escola Médico-Cirúrgica, de tão gloriosas tradições, ali permanecerá, na perpetuidade de continuas gerações, a rememorar o mestre eminente, extraordinária figura de cientista, que tanto e tão. bem soube trabalhar e honrar a sua terra, a terra onde nasceu e se formou, dando aos novos grande exemplo e inigualável lição de amor pelo seu semelhante.
E a cidade do Porto, que orgulhosamente conta o Prof. Ricardo Jorge no número dos seus filhos mais dilectos e mais ilustres, aguarda, com natural anseio, o dia em que, com nobreza e dignidade, possa eloquente e sinceramente demonstrar mais uma vez, como noutras o tem feito, o reconhecimento de insuperável gratidão e admiração por quem tanto soube honrá-la, prestigiá-la e defendê-la.
Mas, Sr. Presidente, para enaltecer a memória de um homem dotado de um espirito da mais elevada cultura, estendendo a sua generosa acção aos mais diversos sectores, numa intensa e constante actividade intelectual, não se torna necessário apoucar vivos sentimentos de respeito, afecto, gratidão e admiração de uma cidade, como é o Porto, pelo imaginativo artificio descritivo de incidentes apagados há muito da memória dos velhos; incidentes que a não diminuem nem deslustram, visto que o Porto soube sempre, através das suas entidades responsáveis e da sua população, acolhedora e honesta, manter a maior admiração para com aqueles que, como o Prof. Ricardo Jorge, devotadamente trabalharam pelo seu progresso e pelo seu engrandecimento material e moral. E o velho mas sempre nobre aldeão, o Porto, como em hora infeliz foi apelidado, soube sempre responder, com altivez e orgulho, àqueles que, esquecendo um passado aqui vivido, não aprenderam ali, na fidalguia do seu proceder, lições de humanidade, de dignidade e de respeito que ele soube dar aos seus detractores.
Sr. Presidente: é bem cabida e bem oportuna esta minha intervenção, relembrando Ricardo Jorge, na hora conturbada e desmoralizadora que atravessamos, em que aos valores do espirito e da cultura pretende sobrepor-se um materialismo sórdido, diminuindo e avassalando os grandes princípios orientadores da vida das nações, que, à sombra da civilização ocidental e cristã, se criaram e educaram. E aqueles que, como Ricardo Jorge, gastaram a sua existência, uma vida inteira, despendendo generosamente energia e consumindo inteligência em persistente combate pelo bem, pelo progresso e pela conservação da humanidade dentro do espirito que a criou, são inteiramente dignos de ser lembrados e justamente enaltecidos.
Sr. Presidente: bem o merece o mestre insigne, professor e investigador eminente, higienista e sanitarista de projecção mundial, que atingiu pelo saber as culminâncias da posteridade, como elemento, sempre activo, que ao estudo e à aplicação das ciências dedicou um grande quinhão da sua existência, o maior, dando-lhe toda a generosa grandeza do seu esforço criador e realizador, em harmonia com a sua inteligência, nas mais úteis manifestações de amor pela sociedade em que viveu.
E foi ainda admirável cultor das letras, inconfundível crítico de arte, grande filósofo, notável conferencista e polemista, detentor de uma enorme bagagem de conhecimentos que o tornaram autoridade indiscutível na vastidão das mais diversas matérias. Mas nas derivações da sua atenção, em permanente vigília, e da sua actividade, em movimentação ordenada e constante, ele foi, acima de tudo, e assim o afirmou sempre,- verdadeiramente médico, dedicando ao ensino, à investigação e à assistência, nos seus mais variados ramos, um labor intenso e fecundo, que se estendeu até aos últimos anos da sua longa existência.
Na cátedra ou na tribuna, no laboratório ou no hospital; na investigação ou na assistência, utilizando os seus inigualáveis recursos, conservou-se sempre dentro da actualização de conhecimentos, princípios e métodos exigidos ao meticuloso, honesto e proficiente desempenho das altas funções que exerceu, no País e no estrangeiro, com o mais reconhecido saber e a mais distinta competência.