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19 DE MARÇO DE 1960 475

em que as escolas políticas e do pensamento em geral não estavam sistematizadas, e os grandes oradores de há 2000 ou 200 anos, que podiam falar muito, tinham assim necessidade de lançar as bases e os princípios em que assentavam as suas conclusões.
Hoje em dia parece-me ser fácil entrar numa matéria, pressupondo no auditório o conhecimento de umas certas bases ideológicas que podem ser ou não as do orador e que lhe permitirão dispensar-se de muitos desenvolvimentos introdutórios.
Se é verdade que para exposições de casos de pormenor complicado os 45 minutos são curtos, também não é menos verdade que, apesar da sua própria refutação às ideias que apresenta para depois melhor as defender, o Sr. Deputado Paulo Gancella de Abreu admite que o Sr. Presidente da Assembleia tem sempre o poder de limitar o Deputado que se estenda de mais. Ora parece-me que é mais difícil ao Presidente, num uso discricionário da sua autoridade, por muito esclarecida que seja na razão e bom senso, cortar a palavra a quem tem o direito regimental de a usar sem limites de tempo do que conceder algum prolongamento a quem está limitado a prazo determinado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Temos a experiência frequente dessa possibilidade, e nem se me diga que mal fica à Assembleia, tendo votado no Regimento um certo prazo, assistir impassível de vez em quando à sua ultrapassagem. A Assembleia fez a sua própria disciplina. Parece-me que, por consentimento mútuo e acordo tácito, pode algumas vezes, sem quebrar o espírito da lei que construiu, esquecer-se em casos irrelevantes da sua letra. Não é preciso estar a fazer depender tudo do Presidente, até porque nem sempre se poderá contar com Presidentes de tanta distinção e com tão altas qualidades de simpatia e compreensão das nossas limitações como V. Ex.ª sempre tem demonstrado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Com tamanha autoridade perante a Assembleia, adquirida pela gentileza do trato, a todo o tempo, sem que qualquer de nós se lembre de discordar, pode V. Ex.ª aconselhar os oradores a encurtar as suas considerações, como consentir que nelas se alonguem. A prorrogação discricionária do tempo de fala é talvez contrária à letra do Regimento, mas é perfeitamente conforme com a nossa aceitação e razão.
Por outro lado, quando o prazo é ilimitado, talvez o exemplo citado pelo Sr. Deputado Cancella de Abreu sirva para nos desagradar, e não serão só exemplos de outros espíritos e outras épocas.
Ainda hoje, em altas assembleias de nações amigas, se pode falar durante 20 horas e ler até trechos da Bíblia, a fim de evitar que um adversário tome a tribuna ou para esperar inúmero determinado de adeptos.
Atentos os dois inconvenientes, estou em crer que mais vale prepararmo-nos intelectualmente e disciplinarmo-nos para a defesa concisa dos nossos pontos de vista do que arriscamo-nos a que algum de nós, tomado pela paixão da causa que queira defender, volte a trazer a esta Assembleia atitudes de obstrucionismo, que poderão ser tacticamente legitimadas por autêntica e honesta intenção, mas que, no entanto, não convirão nunca à boa marcha dos negócios parlamentares.
Estão assim expostas as razões que me levam a não Soder aderir à posição do Sr. Deputado Paulo Gancella e Abreu, que, todavia, me habituei desde a entrada nesta Casa a respeitar e a ouvir como mestre em assuntos parlamentares e exemplo dos novatos, como eu era então.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Pedi novamente a palavra para agradecer ao Sr. Eng.º Amaral Neto as suas amáveis e generosas palavras, o que faço muito penhoradamente.
E aproveito a oportunidade para dizer que propus também e eliminação do § 1.º do artigo 47.º, por se tratar de uma das tais disposições antiquadas.
Tinha mesmo caído completamente em desuso.
Por aquele parágrafo, o Deputado que pedia a palavra sobre a ordem do dia devia declarar se queria usar dela a favor ou contra, a fim de o Presidente poder, quanto possível, alternar o debate.
Seria uma forma de controlar e equilibrar a discussão e atenuar os inconvenientes que pudessem advir da demora da contradita às opiniões expressas unilateralmente.
E isto podia ter importância, nomeadamente quando o objecto da ordem do dia era de natureza política, ou quando o Governo punha no resultado da votação a questão política, e, por esses motivos, as paixões se exacerbavam.
Agora não sucede assim, não só porque não há representações de partidos, mas também porque o artigo 112.º da Constituição torna inoperante na sorte do Governo o resultado das votações políticas.
Acresce que agora os Deputados expõem as suas opiniões e os seus votos sem subordinação a partidos ou grupos e é muito frequente, no mesmo discurso defendem e atacam os actos da Administração e do Governo ou propostas deste. E nestas circunstâncias, se fossem obrigados a cumprir o § 1.º do artigo 47.º, não poderiam declarar se falavam a favor ou contra, pois sucediam ambas as coisas simultaneamente!
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

O Sr. Paulo Rodrigues: - As considerações tão brilhantes formuladas pelo Sr. Deputado Amaral Neto dispensam-me de fundamentar agora mais amplamente as posições da Comissão do Regimento, que assim posso formular, em síntese: quanto à eliminação do § único do artigo 46.º e à eliminação do § 1.º do artigo 47.º, a Comissão nada tem a opor; quanto ao limite de tempo, a Comissão lamenta não poder aderir às propostas do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu sobre o assunto.
Afigura-se-lhe, salvo o devido respeito, que a intenção de evitar o obstrucionismo não é o único fundamento da consagração de um limite de tempo para uso da palavra, que, embora em termos variáveis, nos aparece repetida em todas as sucessivas edições do Regimento.
Quer dizer: mesmo nos termos em que se processa actualmente a actividade parlamentar, não deve deixar de facultar-se ao Presidente o apoio de uma disposição expressa do Regimento para marcar limites, com a tolerância que entender, mas para poder marcar limites, ao tempo de uso da palavra.
Por isto a Comissão mantém quanto a este ponto as suas propostas.
Devo esclarecer que isto não obsta, pela nossa parte, à aceitação da proposta do Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu no sentido de passar de 15 minutos para 30 minutos o limite de tempo de uso da palavra antes da ordem do dia. Aquilo que a Comissão não pode aceitar é que deixe de marcar-se limite de tempo.