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27 DE ABRIL DE 1960 771

tura do problema em causa. Todavia, ao mesmo tempo que estou dizendo da oportunidade d« estabelecer o debate, diria, e aliás disse já, que nem haveria nada a acrescentar, tilo claramente o problema se põe a todos os espíritos.
E então pergunto-mo se, a par da assistência moral que a minha intervenção quer representar, não poderei utilmente trazer mais um ou dois apontamentos sobre matérias conexas com o fundo da questão, e a estes acabo por vir.
Na apressada leitura que fiz, há pouco, dos jornais, porque não me foi possível assistir à sessão de ontem, verifiquei que, primeiro, o Sr. Deputado avisante encontrou uma relação directa de causa a efeito entre o mau estado actual das estradas e o enorme dispêndio feito na construção da Ponte Marechal Carmona, sobre o Tejo, em Vila Franca de Xira; o que o nosso colega Virgílio Cruz chamou a atenção para o facto do em duas outras grandes obras estar a Junta Autónoma de Estradas a investir quantias da ordem dos 400 000 contos em prazo que não excederá, decerto, quatro ou cinco anos, o que representa uma média de encargos vizinha dos 80 000 contos anuais, como mínimo, li se atendermos a que, segundo nos informa o sempre bem elaborado parecer sobre as Contas Gerais do Estado, relativamente a 1958, neste ano as despesas de conservação e reparação de estradas totalizaram 120 884 contos, e na média dos doze anteriores, de 1946 a 1957, inclusive, se estabeleceram no nível dos 103 000, não podemos deixar de sentir imediatamente, de facto, a enorme importância relativa das despesas concentradas pela Junta Autónoma de Estradas naquelas obras e deduzir que nisto se pode filiar a inevitabilidade do descuido de todos os serviços de conservação e reparação da nossa restante rede rodoviária. Não me parecer que, depois da experiência da imposição da portagem na Ponte Marechal Carmona, em Vila Franca de Xira, fosse razoável abalançar-se o Estado àquelas duas outras grandes obras sem estudar, com base na cobrança de portagem, um financiamento privativo especial que aliviasse as dotações normais. E, não querendo tomar por esse caminho, penso sinceramente que uma séria responsabilidade tomou, para com todos os usuários das estradas portuguesas, o Governo da Nação, pondo deliberadamente de banda, certamente por razões ponderosas, um meio de financiamento que tem hoje em dia a sua aceitação largamente justificada pela experiência alheia e por factos nacionais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, se nos quisermos debruçar sobre o que têm sido os rendimentos da portagem na Ponte Marechal Carmona, encontramos a importância de 3625 contos noa dez meses de Março a Dezembro de 1952 e verificamos o seu crescimento para perto de 11 000 contos em 1958.
Há, assim, um incremento constante de ano para ano nos rendimentos desta portagem. De facto, de 1953 para 1954 o rendimento aumentou de 16 por cento, de 1954 para 1955, 12 por cento, de 1955 para 1956 25 por cento, de 1956 para 1957 verifica-se um decréscimo no incremento, que ficou só com 12 por cento, e de 1957 a 1958 a subida foi de 8,5 por cento. Isto confirma a previsão formulada num dos estudos preliminares do II Plano de Fomento, onde se admite um rendimento médio de 1000 contos mensais.
Mas que o Governo não esperava tanto, nem coisa que se parecesse, dá-nos fé o facto de no Orçamento Geral do Estado para 1952, primeiro ano do regime de portagem, que, aliás, como se sabe e há momentos deixei perceber, só entrou em vigor passados os dois primeiros meses, havia sido prevista como receita apenas a verba de 590 contos!
A portagem da Ponte Marechal Carmona está em vias de se tornar um bom negócio para o Estado. Podemos, em primeiro lugar, perguntar se aquela portagem continuará indefinidamente - quod deos avertat! -, porque, sendo assim, a bondade do negócio atingirá o grau do exagero. Tenho, com efeito, uma nota fornecida pelo Ministério das Obras Públicas há meia dúzia de anos, sobre pergunta minha, na qual se diz que a perspectiva normal da duração da obra, quer relativamente à sua infra-estrutura, quer à estrutura metálica, implica um encargo de amortização da ordem de 2150 contos anuais. Se o rendimento da portagem tender no sentido em que se encaminha, acrescentando a esta verba outra de 1000 contos anuais, que é quanto atingirá, com bom arredondamento, a conservação, fiscalização e cobrança, pinturas, iluminação, etc., da ponte, vemos que fica uma margem larguíssima entre as receitas e os encargos efectivos, a qual nos faz pensar se o Estado Português, através desta portagem, não se irá aproximando dos senhores feudais que faziam negócio tão rendoso com as portagens nos seus domínios que a Santa Sé teve de expedir uma bula cominando a excomunhão contra aqueles que estabelecessem novas portagens. No entanto, confiamos em que, uma vez reembolsado o Estado do custo da ponte, esta imposição cessará, pois doutro modo ficaria como aquilo a que um grande jornal já lhe chamou - um imposto anacrónico.
Até 1958, calculando os tais 1000 contos anuais de encargos, a portagem rendeu ao Estado 43 000 contos.
Quer: com mais oito ou nove anos, ao nível actual, a ponte estará paga. Esperemos que nessa altura cesse a portagem.
A experiência mostrou a breve trecho que a operação poderia ter sido feita através de uma emissão de títulos amortizáveis por meio do rendimento da ponte. E fácil fazer as contas, pois as tabelas de amortizações andam por aí ao alcance de quaisquer mãos. Na realidade, é fácil verificar que, ao rendimento líquido de 11 000 contos por ano, a taxa de juro correspondente à amortização integral da ponte em 20 anos não seria inferior a 5 1/2 por cento, e se o prazo subisse apenas para 25 anos já a taxa coberta seria 6 1/2 , por cento. Nenhum dos prazos seria longo, e qualquer das taxas de juro seria generosa e aliciante dentro das condições que uma administração hábil e sã soube criar no País.
Já não é compreensível, por tudo isto, que se encetassem fibras como a auto-estrada Lisboa-Vila Franca ou a ponte da Arrábida sem se lançar mão a financiamentos privativos, a garantir por taxas de portagem.
Mais: os factos demonstram que, para as possibilidades dos organismos responsáveis pela conservação das estradai nacionais, era indispensável, teria sido primordial, evitar a concentração de encargos ordinários nessas duas grandes obras.
Porque, procedendo-se como efectivamente se procedeu, nem só a generalidade das estradas nacionais ficou do prejuízo. Um dos recursos a que destarte houve que lançar mão foi um empréstimo de 60 000 contos pelo Fundo de Desemprego, empréstimo que sem dúvida terá cerceado as comparticipações aplicáveis obras locais das aldeias, das vilas, das cidades, cuja utilidade e necessidade para o desenvolvimento e melhoria dos centros rurais nós aqui temos proclamado categoria. Todas estas obras tem estado a sofrer, a ser desfalcadas a favor da construção da ponte da Arrábida, empresa certamente louvável, mas penso que não por este preço.