14 DE DEZEMBRO DE 1962 1567
Numa época em que os temas relacionados com a juventude assumem tão grande acuidade, o problema delicado dos jovens inadaptados, das suas perturbações e desvios, tiveram naqueles documentos a sua verdadeira reforma depois de várias e fracassadas tentativas, feitas ao longo de quase meio século, tanto foi o tempo decorrido após a promulgação do Código de Protecção a Infância de 1911, que veio introduzir no nosso país os princípios informadores do moderno direito criminal de menores.
Opondo-se ao conceitualismo de ideias erradas e desumanas e ao consequente direito repressivo, punitivo e intimidativo, surgiu com a Lei de 1911 um direito de natureza preventiva, tutelar e eminentemente subjectiva que não considerava criminosos vulgares os menores de 16 anos, mas antes "produtos inconscientes do meio, da hereditariedade", devendo o seu "julgamento ser ditado mais pelo espírito ponderado do julgador do que pela letra inflexível dos códigos", como se salientava no preâmbulo da Lei de Protecção à Infância.
Colocados muito embora numa posição dianteira, o certo é que a evolução constante e profunda de que o direito criminal de menores foi objecto, a partir sobretudo da segunda guerra mundial, acentuando o desencontro entre a realidade nacional e os modernos conceitos científicos na matéria, tornou imperiosa e necessária a reforma e codificação da legislação posterior a 1911, confusa, prolixa e difusa, harmonizando-a com os modernos conceitos e conhecimentos adquiridos.
Foi precisamente a esta tarefa que se abalançou com ardor e firme determinação o Prof. Doutor Antunes Varela, conseguindo, com a valiosa e entusiástica ajuda dos seus mais directos colaboradores, levar a bom termo uma reorganização dos serviços de justiça de menores em moldes inteiramente novos.
Efectivamente, a reforma não se limitou apenas a simplificar, sistematizar e clarificar - o que já era muito se atentássemos nos numerosos, confusos e até contraditórios preceitos legais em vigor -, mas, como se lê no extenso e notável relatório, a "reexaminar muitos dos conceitos consagrados na lei à luz dos ensinamentos que nos facultam não só a doutrina, como a própria experiência dos nossos serviços".
Sempre coerente na actuação com as normas morais e religiosas que alicerçam a sua sã formação, o Sr. Ministro da Justiça inseriu no artigo 143.º da Organização Tutelar o princípio de se procurar revigorar e fortalecei-os laços familiares ou, como ele próprio esclareceu, de "aproveitar ao máximo e estimular todas as possibilidades de acção assentes sobre os laços de sangue".
Para isso se criou não só o regime de assistência educativa, que prevê a possibilidade de não separar o menor do seu meio natural - a família -, auxiliando e fiscalizando esta no exercício do seu múnus através dos serviços de assistência social", mas também se alterou a regulamentação do poder paternal, cuja inibição deixa de constituir uma consequência necessária da aplicação de certas medidas no menor, tendo apenas lugar quando na acção cível adequada se provem os fundamentos descritos na lei.
Mas muitos e variados foram os problemas tratados e resolvidos com o maior acerto e ponderação na reorganização dos serviços tutelares de menores. Sem fazermos a enumeração exaustiva, limitamo-nos apenas a citar o problema dos métodos educativos e dos sistemas pedagógicos dos internatos; da estruturação do semi-internato e do instituto, já entre nós ensaiado com êxito, e da semiliberdade, que, mais do que campo para uma melhor observação dos menores, constitui um estádio preparatório para o seu ingresso na vida livre.
Elaborada com um preocupante sentido prático e um justo equilíbrio entre os mais actualizados conhecimentos científicos e a adequação ao caso e fins em vista, a nova orgânica dos serviços tutelares de menores constitui um valiosíssimo e magnífico instrumento de trabalho de promissores resultados num campo vasto e difícil como é o da readaptação social dos jovens inadaptados, e queira Deus que efectivamente assim venha a acontecer, para bem da Nação e para honra e louvor do Ministro e colaboradores, que tão devotada e carinhosamente se abalançaram a obra de tão grande sentido social e humano.
Tenho dito.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Agostinho Cardoso: - Sr. Presidente: no mês de Março último, por duas vezes, nesta Assembleia Nacional, pedi providências ao Governo quanto à inexplicável demora na construção de silos para trigo e milho na ilha da Madeira.
A importância do problema e as graves consequências que da sua não solução podem advir levam-me a retomar o tema e a argumentação, aliás de tal simplicidade e evidência, que ninguém, até hoje, que eu saiba, lhe opôs quaisquer razões.
A Madeira tem hoje cerca de 300 000 habitantes. Produz trigo que corresponde ao consumo de cerca de dois meses e milho para cerca de dez dias em cada ano. Importa anualmente 20 000 t de trigo e 18 000 t de milho, ou sejam 38 000 t de cereal.
O trigo é importado sem preocupação de constituir-se reservas e depositado, pela Federação Nacional dos Produtores de Trigo, na firma moageira, que, evidentemente, não pode ter instalações e dispositivos para o seu tratamento e conservação, seja qual for o grau de humidade e as impurezas que contenha.
Mais grave ainda é o problema do milho. Não há armazenamento de milho na Madeira, e este constitui a base alimentar da sua população. Cada remessa que chega, em navio vindo de África, espera no molhe do porto, coberta por oleados, quando chove, que os grossistas a levantem, obrigatoriamente, a pronto pagamento.
Há vinte firmas importadoras. Não há um sistema de crédito organizado que proteja e caucione esta actividade e a sua limitada capacidade em capitais.
Cada remessa é por vezes totalmente consumida antes da chegada de novo carregamento, e, ao atracar novo navio vindo de África, cada firma importadora deve ter realizado o capital necessário para o seu contingente. E cada dia a mais sobre o molhe corresponde a encargos portuários.
Não há, portanto, habitualmente, nem reservas de milho, nem local de armazenamento para efectuá-las.
Ora o trigo e o milho constituem a alimentação basilar das camadas populares do distrito, de tal modo que uma interrupção ou atraso das suas ligações marítimas, isto é, do seu abastecimento de cereais feito por mar, redundaria em catástrofe, dadas as condições insulares desta região.
Por isso, a construção de silos tem constituído preocupação constante dos dirigentes da Madeira e dos que têm planificado e previsto os seus meios militares de defesa.
A instabilidade da situação internacional torna premente a organização de reservas de cereais para alguns meses, como há muito se impõe.
Até aqui, e sobretudo durante a segunda guerra mundial, a perfeita coordenação dos serviços da Junta Nacional.