21 DE NOVEMBRO DE 1964 3863
grande ideal, que não há gratidão que pague, mesmo que um padrão comemorativo fique a assinalar para sempre o simbolismo do facto, como é timbre das províncias erigirem-se aos chefes, de Estado que as visitam.
Insere-se nesta linha do pensamento social de Moçambique a gratidão em que ela ficou pela visita que lhe fez o Sr. Almirante Américo Tomás. E como não costumo fazer afirmações gratuitas, peco licença para lembrar a VV. Ex.ªs, consoante a necessidade de cada um, que a histórica frase «Aqui é Portugal» é uma cristalização moçambicana das frases sucessivas «Ali é Portugal», que o Sr. Doutor Oliveira Salazar sentiu e disse há três décadas, e «Aqui também é Portugal», que o general Carmona proferiu na foz do Zaire, constituindo a forma definitiva a expressiva e sentimental saudação com que a minha província acolheu festivamente há 25 anos o saudoso Presidente, ao desembarcar em Lourenço Marques.
Deve-se tão expressiva definição do ultramar, sentida do lado de lá, a uma encomenda de legendas para se espalharem pela cidade, por incumbência do então presidente da Câmara. Sr. Eng. Pinto Teixeira, ao espírito primoroso e invulgar do Sr. Dr. Braga Paixão, director, ao tempo, dos Serviços de Instrução da Província. Todos lhe devemos por isso e para sempre a fulgurante intuição de ter sabido cristalizar em singela beleza. os sentimentos mais puros da alma da província, de tal modo que aquelas primeiras palavras que o general, sorridente, leu, ao pisar a terra de Moçambique, as encontrou sempre em toda a parte, escritas rios cartazes que o saudavam, gritadas com entusiasmo nas grandes ovações que o aclamavam.
Cito o facto para afirmar que o tempo tornou histórica a frase e fez dela um slogan, isto é, uma constante do pensamento ultramarino, encontrando-se hoje correntemente divulgada em todo o mundo português.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Não será necessário chamar a vossa atenção para o sentimento possessivo c identificativo que ela traduz, e é da mais flagrante actualidade na hora que passa.
E nós, os ultramarinos, que nos orgulhamos de ter da Pátria uma outra e diferente ideia de grandeza e de valor e a queremos uma universalidade de direitos e deveres, com uma autêntica pragmática de factos, estamos convencidos de que vibrámos um .golpe mortal, com a filosofia toda que aquele conceito encerra, no separatismo marginal com que a metrópole tantas décadas nos considerou, na orgânica, constitucional como nos estilos de vida.
E eu, que pertenço à geração ultramarina que rompeu essa treva e lutou pela nova claridade nacional, com alguns êxitos e numerosos fracassos, aliás em termos de cultura, com o que aprendemos nas Universidades da metrópole acerca dos problemas do homem, do Mundo e da vida. e da problemática correspondente das pátrias, das nações, da humanidade, posso assegurar-vos que os trágicos acontecimentos que têm enlutado a Pátria nos últimos anos, com a traição internacional que levou à derrocada da Índia, a sentimental perda de ajuda, o bárbaro genocídio de Angola, a persistente tentativa de intimidação e sublevação das populações da Guiné, e as primeiras infiltrações terroristas em Moçambique, rios obrigaram a reivindicar uma activa tomada de posição e de responsabilidade no problema do futuro de Portugal.
Porque não há dúvida de que a Nação está gravemente ameaçada de esfarrapar-se, vítima de uma conspiração internacional de interesses materiais que se sente lesada com a unidade portuguesa e pretende fragmentá-la para
a dominar; por um lado, com o activismo comunista de fase primária, que substitui a luta de classes pela luta de raças como única forma possível de subverter as consciências para destruir a paz social: por outro, com o activismo capitalista anglo-americano, que fomenta com o seu dinheiro a luta- de raças no ultramar português para desalojar a metrópole, criar independências, ocupar os vazios económicos e sociais e criar as dependências definitivas de povos a governos, fracos, pobres e desarmados na aparência das independências ilusoriamente livres.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - A independência! Eu sei, é uma forma de mero equilíbrio geral, que a própria metrópole, com oito séculos de convívio internacional, não conseguiu ainda estabilizar, e foi, na minha tese, procurar ao ultramar para fugir ao sorvedouro político da Europa.
Mas o que é inquietante é que a conspiração dos opostos concorrentes e convergentes de que somos vítimas encontra ecos em esclarecidos e, incultos da metrópole, como em incultos e esclarecidos do ultramar, o que me não admira porque se vive, uma hora de desvairamento mundial, pletórica, de cobardias e acomodações, e de técnicas apuradas de deformação mental, e encontra sobretudo um ambiente favorável na continuada repetição dos nossos erros, que psicologicamente concorrem para o agravamento das situações, ou porque, fazemos o contrário do que dizemos, ou porque o que efectivamente fazemos de bom e de são não tem por vezes o imperativo amparo moral de ancedentes firmados numa impoluta linha de conduta
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Defeitos consideráveis da natureza humana ou deteriorações progressivas das instituições sociais, a que o Governo e as élites têm de estar excepcionalmente atentos, porque os mínimos deslizes provocam especialmente no ultramar perigosas reacções emocionais encadeadas, que são, acima de tudo. lesivas da dignidade da Pátria por causa da indignidade de alguns homens.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Já no limiar da velhice, a minha geração, que 30 anos foi disciplinadamente pioneira, numa teimosia inglória, pela integração nacional do ultramar, não em termos unilaterais metropolitanos, como tentam por todas as formas os que se apregoam o monopólio do patriotismo, em sinfónicas oratórias para que as suavidades melódicas dos discursos ensurdinem outros monopólios mais concretos e úteis: a minha geração moçambicana, que durante 30 anos não foi ouvida na reivindicação permanente de uma responsabilidade própria, e, portanto, uma posição de colaboração conjunta na gestão dos interesses nacionais, assiste consternada à prova real da sua razão de pensar como pensa, e verifica que a sua lunática teoria de outrora ainda apenas principia a ser timidamente realizada.
É certo que ao tempo não éramos mais do que um punhado de poetas sonhadores de ideal, tentando implantar na metrópole uma consciência de realidade quanto ao significado, valor e necessidade do ultramar numa expressão plenamente nacional da Nação, e não nos lamentáveis e ilusórios termos do império, em que colonialmente se expressou o militarismo da Ditadura, contra todas as tradições nacionais, porque Portugal foi sempre desde os alvores uma nação em firmas, mas uma nação civil e nunca um império que nunca existiu, para que nunca teve recur-