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4364 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 179

sérias indicações e contra-indicações; que "as receitas médicas podem conter lapsos cujas consequências só o técnico pode evitar ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... e que este com a sua oficina formam um todo incluído no processo da saúde pública. Não é, evidentemente, um simples estabelecimento comercial, como qualquer outro, mesmo considerando o predomínio actual das especialidades sobre os manipulados..

Sei também, Sr. Presidente, que o direito de propriedade é um direito natural comum a todo o homem, mas não considero razoável o aproveitamento desta realidade como argumento contra a tese que adoptei e estou defendendo.

Além do mais, a todos está garantido pela Constituição o direito de se diplomarem em Farmácia e, consequentemente também, à posse da respectiva oficina. Se se imiscuem na equação presente as impossibilidades naturais, humanas e materiais, de cada um, também elas têm de ser consideradas impeditivas no direito a qualquer outra propriedade a que se refere o direito natural de todo o homem.

Ao proprietário não farmacêutico entendo que nada o deve impedir de manter na sua posse a farmácia que herdou; penso, Sr. Presidente, que não se lhe pode tirar o direito de se meter dentro dela; de ver e rever os medicamentos; de alterar as posições das embalagens; de embelezar, para seu próprio deleite, o diverso mobiliário; e que, enfim, não se lhe pode tirar o direito de a vender para a transformar em capital de maior rentabilidade. Mas o que não compreendo é que a abra ao público e sofismàticamente a incorpore no sistema da saúde pública.

E só porque o génio, eterno, de Pascal permanentemente me recorda que o coração tem razões que a razão desconhece; enfim, só por razões de ordem sentimental, a que sou tão sensível, poderei aceitar um período transitório, perfeitamente determinado, para certos direitos que foram adquiridos através da complacência da regulamentação em vigor.

Perdoe-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, que um leigo em matéria de jurisprudência se dê à liberdade de raciocinar por si, em autêntica roda livre, glosando, à sua maneira, a letra e o espírito do artigo 2167.º do Código Civil, sem se lembrar de que, com a irreverência da sua incorrecta dialéctica, está, com certeza, a ferir a puríssima sensibilidade de um jurisconsulto notabilíssimo e consagrado como o é V. Ex.ª

Dei-me a este atrevimento, Sr. Presidente, absolutamente dominado pela convicção de que a verdade está contida nesta tese superiormente defendida e aprovada pela legislação portuguesa, desde 1461, especialmente pelo Decreto n.º 23422, de 29 de Dezembro de 1933; pela legislação dos mais desenvolvidos países de cultura latina; pelo profundo estudo do eminente mestre de Direito Doutor Guilherme Braga da Cruz sobre propriedade de farmácia e, até e finalmente, pelo parecer da Câmara Corporativa.

É nestes válidos e seguros fundamentos que, na realidade, essencialmente me baseio na defesa do princípio da indivisibilidade entre a propriedade da farmácia e o respectivo gerente técnico.

É verdade - e isto deixa-me, de certo modo e até certo ponto, perplexo - que o parecer da douta Câmara Corporativa, depois de aprovar esta tese de indivisibilidade, cai, como refere o Prof. Braga da Cruz, na incoerência de criar tantas e tão amplas, excepções que, na prática, transforma o princípio, inicialmente aprovado, num autêntico regime de livro propriedade.

Esta particularidade é, Sr. Presidente, posta a nu pelo eminente Prof. Braga da Cruz nos seguintes casos cujos títulos passo a referir:

A) A excepção em favor de herdeiros não descendentes e dos legatários (n.ºs 22 a 26 do parecer, da Câmara);

B) A excepção em favor dos herdeiros legitimários descendentes e do cônjuge (n.ºs 27 a 33 do parecer da Câmara);

C) A excepção a favor da locação (n.ºs 34 a 35 do parecer da Câmara).

E devo ainda referir a apreciação crítica do mesmo mestre de Direito aos contributos positivos dados pela Câmara Corporativa, contra a posição que inicialmente tomou, para a estruturação prática de um regime de livre propriedade da farmácia, e que resumo transcrevendo só os títulos dos diversos capítulos, e que são os seguintes:

A) A chamada "excepção imposta por razões financeiras" (problema das sociedades farmacêuticas) (n.ºs 36 a 39 do parecer da Câmara);

B) A possibilidade de cada um ser proprietário "do número de farmácias que desejar" (n.º 46 do parecer e base III do articulado proposto pela Câmara);

C) Um regime transitório que não força, praticamente, a qualquer transição (n.ºs 58 a 62 do parecer da Câmara);

D) O exercício da farmácia pelos médicos e "profissionais afins" (n.ºs 66 a 69 do parecer da Câmara).

Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não contesto, que algumas excepções são justas e dignas de atenção; não contesto sequer que certos direitos adquiridos merecem respeito, em período transitório; mas considero intolerável que se escancarem as portas e até as janelas para o livre trânsito de todas as mistificações.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em todas estas vem sempre a já tão discutida garantia do gerente técnico responsável. E sofisma. Sr. Presidente, porque em muitos casos nem sequer reside na localidade da sua oficina; sofisma, porque em muitos outros só vai à farmácia de quando em quando; sofisma, porquê não passa de um empregado dependente do critério, essencialmente comercial, do proprietário, seu amo e senhor; sofisma, porque não tem liberdade deontológica; sofisma, porque não está real e integralmente incorporado com a sua oficina para melhor servir a saúde pública; sofisma, porque a ética do técnico é dominada pela ética do comerciante, seu patrão. Mas de forma alguma, Sr. Presidente, se conclua das minhas palavras que a honestidade é um privilégio do técnico farmacêutico e uma anomalia no comerciante.

De maneira nenhuma as minhas palavras têm tal significado.

Quando muito, julgue-se - isso sim - que cada um tem um conceito diferente de honestidade, de harmonia com a formação escolar que recebeu.

E o que é honesto para o comerciante pode não satisfazer absolutamente as ansiedades deontológicas do técnico responsável.

Vozes: - Muito bem, muito bem!