4366 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 179
tins de Carvalho, que veio a ser completado, e de maneira primorosa, pelas declarações doutíssimas e esclarecedoras feitas à Revista Portuguesa de Farmácia pelo ilustre autor e subscritor do projecto, quer o parecer da Câmara Corporativa e a declaração de voto do Digno Procurador, Prof. Pinto Coelho, quer ainda, e já num plano extra-oficial, os trabalhos de alguns ilustres professores universitários (cabendo-me destacai, e faço-o com grande aprazimento, pela simpatia, estima e admiração respeitosa que me merece o seu autor, o estudo crítico do parecer, pleno de saber profundo, de equilíbrio, de inteligência e de isenção, que não exclui o calor e o entusiasmo que o Prof. Doutor Guilherme Braga da Cruz põe sempre na defesa das justas e boas causas que precisam de o ter como patrono sério, esclarecido e competente), são documentos valiosíssimos para uma tomada de posição responsável no problema em debato sobre a propriedade da farmácia.
No estudo crítico do Prof. Braga da Cruz o assunto encontra-se tratado de maneira tão exaustiva e profunda que estamos em crer não ter ficado escaninho algum da questão onde a inteligência crítica do autor não tivesse entrado e esclarecido as dúvidas que porventura ali se pudessem esconder.
Este problema da propriedade da farmácia, reacendido em Outubro de 1962 com o aparecimento do um projecto de proposta de lei da autoria do Ministro Martins de Carvalho, em que se preconiza a manutenção do regime jurídico instituído pelo Decreto-Lei n º 23 422, de 29 de Dezembro de 1933, criou um estado emocional pouco propício à sua discussão serena, desapaixonada e construtiva.
Bastará refém que se chegou ao ponto de os partidários da tese da livre propriedade da farmácia apresentarem como argumento de peso contra a lei vigente o facto, singularmente estranho, do essa lei não sei cumprida, ela que estabelecia a orgânica mais apropriada à moral da profissão farmacêutica e à saúde pública, que ao Estado, como árbitro do interesse geral, incumbe defender, como prescreve o artigo 6.º, n.º 4. º, da Constituição Política Como se o desrespeito pela lei, lamentavelmente tolerado pela Administração, pudesse constituir argumento válido contra a bondade de um diploma que consagrou o princípio da defesa da saúde pública e do prestígio social e técnico da profissão farmacêutica, sobrepondo-o, como de interesse público que é, ao que representa interesses particulares!
Diz-se ainda, contra o regime estatuído pelo Decreto-Lei n º 23 422, que fazer reviver as suas normas será dar prioridade aos interesses de classes - a classe farmacêutica- sobre os interesses da família -os filhos de farmacêuticos que não tiram o respectivo em só -, dado que as suas normas inovadoras já se mostraram de há 30 anos a esta parte de todo o ponto divorciadas dos mais elementares princípios da moral e da equidade!
Isto se afirma um tanto levianamente, pois esquece-se que as normas do Decreto-Lei n º 23 422, mais do que o de um. simples «dar prioridade aos interesses de classes sobre os interesses de família», teve antes um bem mais elevado propósito, de interesse público, a salvaguardar no exercício da actividade farmacêutica - o da defesa da saúde pública
Feito este parêntesis, paia evidenciai quanto a paixão tem obnubilado as intelegências ao abordar este problema, vamos prosseguem.
O ponto fulcral da questão é o de saber se o direito de propriedade da farmácia deverá ser concedido apenas o só aos que possuem diplomas passados pelas nossas escolas superiores e Faculdade de Farmácia ou se, pelo contrário, ele poderá ser extensivo a qualquer indivíduo desde que a direcção técnica esteja confiada a um diplomado com o curso de farmacêutico.
E assim, surgem, frente a frente, as duas teses principais - a da indivisibilidade da propriedade da farmácia e da respectiva gerência técnica e a da livre propriedade da farmácia na sua mais actualizada formulação
A primeira tese tem os seus defensores, como é óbvio, entre todos quantos pretendem que se alcancem os seguintes objectivos de interesse público salvaguarda da saúde pública, necessidade de fomentar a preparação de técnicos farmacêuticos e o interesse concomitante de prestigia a profissão farmacêutica e dignificar o em só de Farmácia ministrado nas nossos escolas superiores.
Na segunda tese alinham os que vêem na farmácia uma pura a actividade mercantilista por serem apenas proprietários e, portanto, vendo os problemas pelo prisma de negócio, contrariamente aos diplomados em Farmácia, que, por portadores de uma deontologia e de conhecimentos técnicos, sentem o peso da responsabilidade profissional o têm o seu escrúpulo deontológico.
Das razões aduzidas pelos partidários das duas posições, podemos tirar a conclusão seguinte ou o debate das razões apresentadas é feito a partir dos estudos sobre a saúde pública, e então não há duvida de que a solução do problema pende para o lado dos autores da tese da indivisibilidade da propriedade da farmácia e da sua gerência técnica, ou, pelo contrário, a saúde pública se apresenta como figura de menor grandeza, é relegada para plano secundado, e então já terá cabimento a tese da livre propriedade da farmácia
Ocorre, porém, perguntar mas a tese da livre propriedade da farmácia não prosseguiu, tal como a outra, as exigências da saúde pública desde que essa livre propriedade se]a condicionada pela obrigatoriedade legal de uma efectiva e permanente direcção técnica qualificada.
Embora teoricamente tal não custe a aceitar, o que é certo é que na prática, a fórmula sugerida não satisfaz pois que com ela não se garante a liberdade, independência e responsabilização da direcção técnica, além de também não evitar a formação dos grandes trusts ou concentrações capitalistas, sempre aptas e prontas a lançarem os seus pouco escrupulosos e absorventes tentáculos ao rendoso sector dos produtos medicamentosos. Ora isto, além do mais afigura-se-nos como desmoralizado e perigoso para os nossos irmãos doentes e sofredores, que tantas protecções, cuidados e desvelos devem ter a rodeá-los nas suas miséria e nas suas dores, por deixá-los à mercê dos potentados económicos, sempre dominados pela ânsia ... do lucro e que facilmente podem dominar o mercado dos medicamentos e especular com o seu preço e qualidade.
E dizemos que na prática tal fórmula não resulta porque são do nosso conhecimento pessoal e directo casos em que a gerência técnica das farmácias só nominalmente se diz por força da tabuleta que ostentam com o nome do director ou da director, pois que aqueles a quem ela incumbe, limitam-se a receber no fim do cada mês uma importância por lhes darem o nome, e que só não clarificaremos de ... e indigna porque tal gerência ou direcção técnica não se faz, não se exerce efectivamente, constituindo uma pura ficção nalguns casos consentida de bom grado pelos proprietários não farmacêuticos e noutros até por eles imposta, pois não lhes convém e por isso mesmo não vêem com bons olhos a presença efectiva e permanente farmacêutico na oficina de farmácia de que é gerente técnico