1916 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 102
que, através dos tempos, se têm sabido manter fiéis à sua pátria de origem.
Embora dentro de outro prisma, mas impossível de dominar de momento, o problema da emigração constitui unia grave hemorrogia de mão-de-obra de valor verdadeiramente preocupante; ao menos, que se olhe pelos emigrantes, de modo a que estes não se sintam abandonados e deprimidos e, consequentemente, mais permeáveis a certos amparos, conservando-se vivo dentro de si o sentimento da saudade e do desejo de regresso à Pátria que não os esquece.
Tudo pode ter uma certa ligação, e não deve, quanto n, mim, deixar de se associar uma acção cultural, de que necessariamente irão beneficiar as comunidades portuguesas espalhadas no Mundo, a uma acção material e espiritual a conceder àqueles que podem vir a engrossar, de futuro, os núcleos de portugueses definitivamente radicados no estrangeiro, mas sem despeites ou desilusões por nós próprios consentidas.
Os congressos das comunidades portuguesas espalhadas no Mundo, realizados no corrente ano em Moçambique e em 1964 em Lisboa, vieram esclarecer dúvidas e abrir perspectivas que a todo o transe convém manter. Isto, claro está, quanto ao primeiro aspecto da questão.
Grandes verbas deverão ser investidas para o efeito, mas não creio que o resultado a obter não constitua compensador empate do numerário despendido, visto estar em jogo outro capital bem mais importante e que urge acompanhar, o capital humano e espiritual de uma nação que queremos ver eternamente continuada, a atestar o esforço de uma raça que soube espalhar pelo Mundo o fulgor dos seus indiscutíveis méritos.
Perdoe-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, o ter-me alongado demasiadamente, mas estes dois casos, entre tantos outros, pareceram-me de relevante interesse, e por isso vivamente me impressionaram ao analisar e ao meditar sobre o esforço enorme de quem deseja garantir o progresso, a homogeneidade e o futuro da Nação.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Melo Giraldes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito embora a proposta de lei em apreciação mereça o meu total apoio, não quis deixar de aproveitar a oportunidade que a sua discussão nos oferece para tecer algumas considerações sobre o projecto do novo Plano de Fomento, que, confesso, aguardei com o maior interesse, como Deputado pelo círculo de Castelo Branco e como lavrador, pois contava que, a determinar o volume e distribuição dos indispensáveis apoios técnicos e financeiros, nele viria encontrar, implicitamente definida, a política agrária que constituísse para a lavoura caminho de salvação e lhe devolvesse a confiança e o ânimo para tomar esse caminho e reconquistar o lugar que lhe compete na economia do País e das regiões, como a que aqui tenho a honra de representar, que por largos anos ainda terão na exploração da terra a principal fonte de receita para se manter e desenvolver.
Não quero com isto dizer que esperava os remédios que permitissem vida desafogada a uma agricultura sem dimensão nem capacidade técnica e financeira, mas sim um certo número de medidas que, no seu conjunto e no seu acordo, estabelecessem o ambiente em que a agricultura, praticada em empresas técnica e económicamente bem estruturadas e dirigidas, pudesse oferecer ao capital e trabalho nela investidos condições equiparadas às das outras actividades.
. Ora, nesse aspecto, o projecto do III Plano de Fomento não me satisfaz, apesar do volume das dotações com que é contemplado o sector agrícola, segundo objectivos globais cuja validade é indiscutível, mas que, para serem atingidos, carecem de um princípio geral que é necessário reconhecer e aplicar como fundamental de toda a política agrária - a rentabilidade da actividade agrícola e dos empreendimentos que se lhe destinam.
As medidas preconizadas no projecto do III Plano de Fomento em relação à agricultura orientam-se principalmente para o acréscimo do produto.
Mas este acréscimo, para que se verifique, tem que interessar ao produtor, e para isso é indispensável que corresponda a um acréscimo de lucro que esteja garantido contra a desvalorização a que habitualmente está condenado o produto sempre que é oferecido numa abundância que não precisa de exceder muito as necessidades do momento para correr os riscos de aviltamento de preços, deterioração, taxas ... que acabam por anular, e por vezes transformar em prejuízo para o produtor e em descrédito para a organização de coordenação económica, o que deveria constituir benefício para todos e finalidade a atingir.
Na verdade, e conforme se afirma no projecto, no continente português continua deficitária, frente à procura interna, a oferta de alguns produtos, entre os quais o azeite, carne de bovinos, leite e lacticínios, lãs, etc.
No entanto, num ano de contra-safra como o de 1966-1967 o azeite teve menos procura que nos anos de safra abundante e o público teve que comer óleo pintado de azeite ordinário, enquanto o azeite melhor teve que esperar pelo início da nova campanha para encontrar cotação; importa-se carne, porque a que se produz não chega, e, ao mesmo tempo, perdem-se toneladas de carne em gado que emagrece, ou não engorda ao ritmo económicamente aconselhável, por não haver capacidade frigorífica para receber as carcaças na altura mais rendosa para o criador; falta leite numas zonas do País, enquanto noutras não se produz, apesar das condições favoráveis locais, porque não existe a organização que concilie as necessidades de umas com as possibilidades de outras e permita que todo o leite alcance o preço da tabela; e a lã, apesar de, como se diz no projecto do Plano, não acompanhar a procura interna, teve de 1966 para 1967 uma quebra no preço de cerca de 30 por cento.
Estas anomalias do mercado e uma política de tabelas, importações e condicionamentos e outras intervenções, que se processa apenas em atenção ao interesse momentâneo do consumidor e sem consideração pelo resultado económico da actividade agro-pecuária, nem conjugação com o ritmo normal das variações da oferta è procura ao longo dos anos, é natural que desorientem o produtor e o coloquem em permanente estado de dúvida e descrença quanto às vantagens de um aumento de produtividade.
O problema está, fundamentalmente, na ausência de uma política agrária definida, orientada para a rentabilidade do sector agrícola, que não pode conseguir-se num sistema assente unicamente em bases técnicas e a que falta uma estrutura de comercialização eficiente, indispensável à valorização dos produtos.
O Governo assim o reconhece ao apontar o sistema deficiente de comercialização como um dos óbices ao desenvolvimento do sector agrícola.
No entanto, e com excepção da fruticultura, em nenhum dos restantes empreendimentos relacionados com os produtos agrícolas é considerada qualquer dotação para comercialização.
E essa falta é grave e pode comprometer o êxito das outras medidas, reduzindo ainda o já modesto ritmo de