O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3 DE FEVEREIRO DE 1968 2369

me compete aqui dizê-lo como Deputado, mas apenas trazer aqui o facto político de um mal-estar generalizado, e de há. muito, sobre a forma como se processa o ensino liceal. Procurarei apontar algumas das razões desse mal-estar.
Como todas as estruturas, a do ensino liceal assenta em linhas mestras, cuja verificação tem de ser feita periodicamente, para que não sofra tanto dano toda a estrutura. Apenas a duas dessas linhas de política de ensino me vou referir, por serem, em meu entender, as de mais forte influência na solidez do conjunto: a preocupação de uma cultura de base em extensão e profundidade e a aliciação de homens para a função docente.
Do ponto de vista dos encarregados de educação, os programas estão sobrecarregados de matéria, exigindo dos alunos, exactamente na crise da puberdade, um esforço mental a que muitos se recusam. E, apesar disso, o desenho interessa apenas uma hora por semana no plano do 2.º ciclo, preparação insuficiente para quem pretende seguir preparatórios em que se exige tal matéria ou para despertar gosto por ela e definir assim um futuro. E, apesar disso, o ensino do latim faz-se apenas depois do 5.º ano, exigindo-se, porém, neste ano uma articulação do ensino da língua portuguesa com as raízes da língua latina, apresentada com mais ou menos minúcia, conforme a formação do professor.
Todos sabemos, porém, que o que falta a muitos alunos não é tempo, nem inteligência para abarcar a ciência da pilha de livros da sua preparação liceal; o que sobretudo lhes falta é método de estudo, é disciplina de estudo. Com a nossa mentalidade de adultos, apesar da preparação especial que alguns tenhamos, nós não podemos avaliar, na sua totalidade, a perturbação de espírito de um criança que, saída da instrução primária, mergulha num mundo de outras e mais responsáveis exigências. Ela deve ser como o náufrago perdido entre ondas. Generalizada a psicose de que assim é, por extensão do mar da sabedoria, antes mesmo da efectivação da matrícula nos liceus, já os pais asseguraram aos filhos a presença diária do chamado «explicador», isto é, daquele que há-de ser o acompanhante dos filhos durante o estudo, o verdadeiro preceptor, o que orienta, o que conclui.
Mas como a procura é maior que a oferta, cada um desses preceptores se equipara aos professores e assim se duplica a confusão no espírito dos alunos e cada um, à deriva, se agarra à tábua que melhor serve à sua maneira de ser. O fracasso da maioria é uma defesa contra a perturbação em que os professores, os explicadores e os pais os mantêm para além da perturbação natural de quem entra num mundo novo e de que eles, na melhor das boas-fés, os procuram salvar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não sei mesmo se não haverá já explicadores de explicadores. Parece-me que sim. Assim, não há dinheiro que chegue aos pais para a educação dos filhos, nem tempo que sobeje aos filhos para a convivência com os pais ou com as crianças da sua idade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tão atarefado se anda hoje aos 11 anos como depois aos 30 já com encargos de família, em busca de proventos. E a mocidade passa sem ter brincado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A preocupação que resulta da verificação de não terem as crianças tempo para brincar leva o pedagogo a procurar introduzir no currículo dos programas escolares tempo para brincar. E os pais, que entendem que na escola os filhos estão para estudar, aceitam naturalmente mal que a escola perca tempo e o faça perder, no seu entender, claro, às crianças. E temos assim outro binómio de forças, entre as quais a criança continua a ser joguete. De um lado, a escola a atender à necessidade lúdica da criança; do outro, os pais no receio de que essa actividade distraia os filhos do que têm por essencial. E, no meio, a criança a ouvir: agora estuda, agora brinca, estuda, brinca, e sem coragem para mergulhar no estudo e sem vontade de brincar, quando a mandam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As brincadeiras das crianças, para serem verdadeiramente salutares ao espírito, têm de ser criadas e dirigidas por elas próprias, segundo códigos secretos que escapam aos adultos. Decerto que a escola deverá proporcionar tudo aquilo que concorra para a formação dos jovens que lhe são entregues, mas deve igualmente dar-lhes a possibilidade de encontrarem fora do programado pela escola os meios de mais completamente se realizarem. O problema não é de fácil solução, porque admite controvérsia válida dos vários ângulos sob que se encare. Trago-o aqui apenas para vincar a sua pertinência.
Sob o ponto de vista dos alunos, muita da matéria a aprender, pela minúcia de que se reveste, exige enorme esforço de memorização, dando assim aos psitacistas melhor oportunidade de êxito. Os jovens são muito sensíveis, como sabemos, a tudo o que represente injustiça, e isto de sobrepor a memória às outras faculdades tem o sabor de uma injustiça feita às qualidades que mais valorizam os homens, como sejam a capacidade de raciocínio e a inteligência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pelo mesmo motivo, eles não compreendem que se dê prevalência às provas orais ao findar do curso geral. Pode um aluno, com provas escritas em que deu suficiente notícia do seu saber, ficar reprovado por ter nas provas orais, por circunstâncias alheias ao seu conhecimento da matéria, dois resultados negativos. Ele não é julgado pelo conjunto das provas, nem pela média das provas, mas por duas provas orais, as mais sensíveis às contingências de tempo, de lugar e de pessoas.
Prevê ainda a lei que o aluno possa terminar o curso geral com duas deficiências, uma em cada secção, que podem ter sido motivadas por uma dessas tais contingências da prova oral, mesmo com provas escritas suficientes. Aqui, porém, é uma média que se considera, mas a dos resultados orais, mas quantos alunos não vêem assim alterado o rumo da sua vida, por não poderem seguir o curso da sua predilecção? Pois se no 7.º ano se admitem já dois exames de repetição na época de Outubro, porque não permitir a tentativa de anular uma das deficiências em nova época, se for de continuar tal modalidade selectiva?
A importância que se dá às provas orais, quando em tempos idos eram as escritas que prevaleciam, pois até duas eram consentidas em cada exame para se escolher a melhor, provoca nos próprios alunos uma inibição que a frequência das aulas não contraria, porque nessas aulas o professor mal tem tempo para expor a matéria e quando