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7 DE FEVEREIRO DE 1968 2377

ensino liceal. E porquê? Em primeiro lugar, porque ao cabo de uma licenciatura, que normalmente leva cinco anos, se exige ao candidato, a par do curso de Ciências Pedagógicas, um estágio com a duração de dois anos. Além de o estágio não ser remunerado, as dificuldades para nele entrar têm sido de tal monta que chegam a desencorajar não só licenciados com altas classificações, como até os mais optimistas. Basta ler-se o artigo 202.º do Decreto n.º 36 508; normalmente provas escritas de duas horas e provas orais de uma hora, imediatamente seguidas de dois interrogatórios de meia hora cada um, o que, na prática, perfaz as duas horas. E tudo isto, e para mais, sem programas previamente estabelecidos. Veja-se, apenas, como exemplo, o que diz esse artigo 202.º para os candidatos ao 3.º grupo. Provas escritas:

1) Exposição em inglês sobre um assunto de literatura inglesa, com elementos dados e sem qualquer auxílio (duas horas);
2) Prova idêntica à anterior relativa à língua alemã (duas horas).

Provas orais:

1) Leitura, tradução e análise linguística, literária e ideológica de um trecho de autor inglês moderno, sem qualquer auxílio (uma hora), seguidas de dois interrogatórios, em inglês, sobre o mesmo objecto e sobre literatura inglesa (meia hora cada um);
2) Prova idêntica à anterior, relativa à língua alemã;
3) Análise linguística, literária e ideológica de um trecho de escritor português (uma hora), seguida de um interrogatório sobre o mesmo assunto e sobre literatura portuguesa (meia hora).

Tudo isto, como já se disse, sem programas estabelecidos; e, como os assuntos são interdependentes, na prática os interrogatórios são de duas horas. Que eu saiba, não conheço concurso de provas públicas onde se exija tanto a candidatos que já possuem uma licenciatura. Resultado: entre 1947 (data da última reforma e estatuto) e 1965, ou seja em dezoito anos, não foram admitidos ao estágio, ou por falta de vaga, ou por terem reprovado (e estes são a grande maioria), tanto como 646 licenciados, dos quais 216 homens e 430 senhoras. Entretanto, e em igual período, concluíram o Exame de Estado 636 licenciados, sendo 218 homens e 418 senhoras, o que, no total e na prática, dá uma percentagem de reprovações superior a 50 por cento. Havemos de concluir que, tratando-se de indivíduos já licenciados, e por consequência., com uma certa preparação, representa uma percentagem excessivamente alta. Além disso, e isto é ponto que reputo da maior importância, no exame de admissão ao estágio há apenas a preocupação de aquilatar do grau do saber do candidato a professor, da sua cultura e erudição, mas quanto às qualidades pedagógicas, nada. E, se os primeiros são de grande importância, as segundas não o são menos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Num ensino com as características do liceal parece-me que um professor, a par de sabedor da matéria que ensina, tem de possuir, sobretudo, qualidades pedagógicas apreciáveis, aquelas qualidades que tanta vez nascem com o verdadeiro professor, pois só assim o ensino ministrado terá aquele rendimento desejado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De que servirá um mestre profundamente culto e erudito se, falando de cátedra, não consegue manter a disciplina e não desce ao raciocínio dos alunos, não lhes adivinha as dificuldades, não lhes transmite aquele muito saber devidamente ordenado, simples e acessível? Que utilidade terá tal professor? Ele próprio, não obstante a sua erudição, acabará por se sentir, dentro da sua profissão, um falhado, um frustrado. E daí o desentendimento que se gera algumas vezes entre alunos e professores. Ora, eu também sei que essas qualidades pedagógicas serão devidamente apreciadas (ou deviam sê-lo) durante o tempo de estágio. Mas pergunta-se: quantos, de entre aquele grande número de licenciados que vimos há pouco, não dariam valiosos elementos no magistério se a entrada no estágio não tivesse as características que tem? Além disso, dois anos em regime de bolsas, ou então sem qualquer provento - é outro motivo de deserção. Facilite-se ou acabe-se com o exame de admissão; reduza-se para um fino lectivo bem aproveitado a sua duração; e paguem-se ao estagiário as aulas que dá, não só como estagiário, mas também admitindo-se como professor eventual, e teremos dado um passo decisivo no meio de aquisição de novos e válidos elementos para o professorado.
Porém, independentemente das enormes dificuldades, que nos oferece o estágio, a grande carência de professores é sobretudo devida ao problema económico. Exigir uma licenciatura de cinco anos, depois um estágio de dois anos, e mais as ciências pedagógicas, e ainda com a agravante de durante vários anos andar a peregrinar de liceu em liceu até se estabelecer definitivamente, e sem ter um ordenado que o recompense de tanto sacrifício, de tanta canseira e incompreensões, havemos de concordar que não é nada aliciante. Neste campo as lamentações, as queixas, são profundamente justas e fundadas. Dê-se ao professor do liceu um ordenado compatível com aquilo que dele se exige e com a função de magna importância que ele tem na sociedade, onde possa viver decentemente com a família. Que ele tenha ainda o necessário para adquirir aqueles livros e revistas tão úteis à sua permanente actualização, pois o professor não pode estagnar, não pode cair na rotina.
Além disso, não se nos afigura justo que um professor efectivo com 30 e mais anos de serviço ainda receba o mesmo ordenado que tem aquele que completa os 20 anos. Daí a necessidade imperiosa de mais uma diuturnidade. Além de ser, indubitavelmente, mais uma compensação de ordem moral, dar-lhe-á também direito a ter na velhice uma aposentação que lhe permita encarar essa última etapa da vida sem apreensões de qualquer espécie. E isso é muito importante.
Depois, por que não lançar também mão das horas extraordinárias? Se são concedidas aos das ilhas adjacentes, se são permitidas aos professores do ensino técnico, por que não aos do ensino liceal no continente? E certo que seria mais uma sobrecarga de trabalho, mas também se sabe que muitos deles têm de se valer das lições particulares para poderem suprir económicamente aquilo que o Estado não lhes dá. Por que não as horas extraordinárias, mais que não fosse, em regime facultativo, para os do quadro do respectivo liceu? Seria mais uma importante compensação, sabido como é que as horas extraordinárias são as mais bem pagas.
Estou certo, Sr. Presidente, de que, se o problema do estágio for devidamente revisto, como atrás ficou exposto; se se subir, pelo menos, uma alínea em relação aos actuais ordenados; se se acabar para sempre com essa injusta posição de professores agregados e se se aumentarem para três as diuturnidades, além da concessão de horas extraordinárias, estou certo, ia a dizer, de que se resolveria