2378 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 131
um dos mais graves problemas do nosso ensino: o da carência de professores. Carência que se traduz nos seguintes números, bastante sintomáticos:
Em 1947-1948, para uma população de 10429 alunos masculinos, havia 574 professores efectivos do 1.º ao 9.º grupo, bem como contratados do quadro de Canto Coral e Educação Física. Em 1965-1966, para uma população masculina de 31 320 alunos, ou sejam três vezes mais, havia tanto como 612 professores efectivos. Um aumento apenas de 38 professores efectivos. Isto em dezoito anos!
No que diz respeito à parte feminina, o quadro é o seguinte: em 1947-1948 o número de alunas matriculadas era de 7780 e o inúmero de professoras efectivas de todos os grupos, mais as contratadas de Canto Coral e Educação Física, era de 197. Em 1965-1966 o número de alunas matriculadas foi de 34 698 e o número de professoras efectivas foi de 358. Um aumento de 161 professoras para uma população escolar que, neste espaço de tempo, quintuplicou.
Evidentemente que, perante uma tal falta de professores devidamente qualificados, houve necessidade de lançar mão de professores eventuais, isto é, professores sem o estágio, na maior parte dos casos sem cadeiras pedagógicas, a grande maioria licenciados, mas infelizmente muitos deles apenas licenciandos ou com frequência de algumas cadeiras universitárias e até um número já bastante considerável tendo como habilitações o 7.º ano do liceu ou equivalente!
Mas os números são mais elucidativos e não necessitam de muitos comentários.
Assim, em 1947-1948 o número de professores de serviço eventual (não agregado) do 1.º ao 9.º grupo foi apenas de 5. E o número de professoras em idênticas circunstâncias foi de 18. Em 1965-1966 esse número subiu para 266 professores e 765 professoras licenciadas, havendo a acrescentar mais 61 professores e 197 professoras sem licenciatura, mas com frequência de algumas cadeiras universitárias, e ainda mais 85 professores e no professoras cujas habilitações foram o 7.º ano dos liceus ou equivalente ou até habilitações inferiores. Isto para o 1.º ao 9.º grupo e de Canto Coral, Educação Física e Lavores Femininos.
Ao todo prestaram serviço nos liceus da metrópole, Portugal continental e ilhas adjacentes tanto como 1484 professores de serviço eventual em 1965-1966.
Quero, todavia, dizer, por uma questão da mais elementar justiça, que um bom número desses professores cumpre o melhor que pode; que muitos deles são tão bons como os melhores, e que há que facilitar, por todos os meios, a sua entrada nos quadros efectivos do ensino liceal. Além disso, grande parte deles já trabalham há 5, 10 e 15 anos e não é justo não lhes dar uma oportunidade de fácil acesso. Evidentemente, refiro-me, àqueles que já deram provas cabais de serem autênticos professores. Infelizmente, também, um número bastante elevado, talvez a maioria, por aquilo que nos é dado saber, está longe de atingir o nível e o rendimento desejado. Na maior parte dos casos são indivíduos que se acolheram de passagem no ensino liceal, na esperança de conseguir melhor emprego; por conseguinte trabalham sem qualquer estímulo, sem vocação, sem brio profissional, sem amor. Do magistério pouco ou nada sabem e apenas esperam a resolução momentânea do seu problema económico - se é que chega a ser resolução -, pois nas férias, como, aliás, os agregados, não recebem qualquer provento, o que, diga-se de passagem, mas bem acentuadamente, é uma flagrante injustiça. E injustiça porque enquanto o Estado obriga os estabelecimentos do ensino particular a pagar aos seus professores no tempo de férias, o liceu não paga àqueles que se encontram em circunstâncias absolutamente idênticas aos daquele ensino.
Por tudo o que foi dito e pela eloquência dos números poder-se-á avaliar a gravidade da situação. Urge fazer um estudo em profundidade da questão e dar-lhe uma solução imediata. Os professores do ensino liceal merecem que o Governo se debruce atentamente sobre os seus problemas, eu ia a dizer sobre os seus aflitivos problemas e anseios, e querem ter aquele lugar de decência e de prestígio a que a delicadeza e a importância das suas funções lhes dão incontestável direito.
Carência de professores; falta de edifícios, disse eu no princípio destas considerações. Eu sei que uns são dependentes dos outros, isto é: de que nos servem belos e magníficos edifícios se não há professores? Mas uma coisa também é certa: é que a esta explosão escolar, chamemos-lhe assim, que se tem verificado nos últimos anos, não é lícito que se lhes negue lugar nos liceus, ou até que se lhe dificulte por qualquer meio a entrada, pois, com bons ou maus professores, efectivos ou eventuais, licenciados ou não, todos os alunos têm o direito de ser atendidos. E assim quase se tem feito. Acontece então que liceus construídos para uma população escolar de 800 a 1000 alunos estão funcionando com 3000 e tal. Podemos bem imaginar os problemas que se levantam com edifícios assim superlotados, em que todas .as salas acabam por se transformar em salas de aula, com turmas enormes, e em que os professores muitas vezes se têm de valer da fotografia para conhecer os alunos, e em que os reitores mal contactam com os professores e estes mal conhecem os colegas. Do exposto se vê que todos saem verdadeiramente prejudicados: os professores, porque não têm o ambiente propício para o trabalho, ao mesmo tempo que reconhecem que esse trabalho nunca poderá ter o rendimento desejado; os alunos e as famílias, descontentes, criticam com e sem razão o liceu; e, no fim e ao cabo, a causa do ensino acha-se altamente desprestigiada. De 1947-1948 a 1965-1966 apenas se construíram mais oito liceus, sendo três femininos e cinco masculinos com secção feminina. O número é mais do que diminuto, se atentarmos no grande aumento da população escolar. Felizmente este problema está a ser encarado de frente, pois há vários outros edifícios em construção. Porém, muitos mais haverá ainda a edificar, se quisermos, na realidade, possuir um ensino oficial em condições.
Finalmente, temos os programas e, intimamente relacionados com eles, os planos de estudo.
A necessidade de uma adequada estruturação de todos os programas do ensino liceal é premente. Há que modificá-los, que actualizá-los e, sobretudo, que simplificá-los. Vejamos o que se passa com as Ciências Naturais do 2.º ciclo - um exemplo entre muitos.
Sabemos a função excepcionalmente formativa e educativa daquela disciplina, e não a negamos. Todavia, achamos excessivo exigir a alunos de 12 e 13 anos o conhecimento da anatomia completa do coelho, do pombo e de muitos outros animais. A cristalografia é outro quebra-cabeças. Por outro lado, o programa de História está cheio de minúcias e de pormenores, que só servem para lançar o tédio e a fadiga intelectual nos alunos. O programa de Física no 3.º ciclo é de tal ordem extenso que tem de ser dado em velocidade. Isto são exemplos ao acaso, além de muitos outros que haveria a citar. Entretanto há tempos a mais para certas disciplinas (exemplo, Inglês do 2.º ciclo) e a menos para outras