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15 DE FEVEREIRO DE 1968 2453

Este episódio, decerto modo cómico, tem, contudo, como os filmes de Charlot, a sua faceta trágica, que não me passou despercebida e me avivou até o meu sentimento de profunda admiração por tantas professoras e professores que, arrostando com dificuldades imensas que a obsoleta remuneração lhes impõe, se esforçam, apesar de tudo, por prosseguir no exercício da sua nobre missão e por cumprir o melhor que podem e sabem.
Não tive, por isso, coragem de fazer sentir àquela professora, nem ao director de ciclo, o efeito deseducativo da sua insólita e infeliz oferta.
Mas estas e outras erradas atitudes de certos agentes de ensino, quaisquer que sejam as atenuantes possíveis, e que com muita frequência chegam ao meu conhecimento, dificultam extraordinariamente a acção educativa dos pais, que à luz da doutrina cristã, e tendo sobretudo presente o 4.º mandamento, desejam incutir sempre nos seus filhos o tão necessário respeito pelos seus pais e pelos seus professores.
Em contrapartida, chegam ao meu conhecimento com não menos frequência atitudes pouco louváveis de alunos que põem à prova a paciência, a bondade e a firmeza dos professores, reagindo estes de forma a merecer toda a minha consideração e admiração.
E enquanto se não dá o milagre do aparecimento dá uma associação de pais com voz activa na educação estatal, preconizo ao menos que cada liceu procure estabelecer um maior contacto entre professores e encarregados de educação e uma mais íntima colaboração entre uns e outros, de cuja acção conjunta tem de resultar a educação dos alunos.
Todos os anos, quando preencho os documentos para a matrícula dos meus filhos, tenho a ingenuidade de pensar que aquele contacto é, pelos liceus, desejável, tão grande é o interesse que os impressos manifestam em saber o meu nome, a minha morada e o meu número do telefone. Mas, ano após ano, verifico que se trata apenas de burocracia repetida e inútil.
Em Agosto do ano passado tive a paciência de elaborar uma pequena estatística sobre o assunto, que depois mandei ao Ministério da Educação Nacional, por me parecer curiosa.
Soube mais tarde que também no Ministério a acharam curiosa, mas ... ficaram por aí. Por isso, já calculo que para o próximo ano o sistema se manterá. Verificara eu que, para fazer a inscrição de três filhos no mesmo liceu, um no 1.º ciclo e dois no 2.º ciclo, tive de escrever, nos vários impressos que lá entreguei, 51 vezes o meu nome, 71 vezes a minha morada 68 vezes o meu número de telefone e 38 vezes a minha profissão.
Isto, além de todas as outras indicações relativas àqueles três filhos ou a mim próprio, que só tive de escrever uma ou duas dúzias de vezes, o que não merece, por isso, referência especial.
Parecia-me que bastaria haver em cada liceu um ficheiro geral dos alunos, de cujas fichas constassem todos os elementos necessários sobre o aluno e o encarregado da educação.
Mas esta ideia antiburocrática tem, com certeza, muitos opositores.
Não há dúvida nenhuma de que há quem coleccione papéis ou indicações inúteis com o mesmo entusiasmo que outros coleccionam selos ou peças de louça da Companhia das índias.
Mas ao menos que esse gosto pessoal se não cultive à custa do tempo e do trabalho dos outros.
No caso que acabo de referir, coube-me preencher, além do mais, todas as folhas das cadernetas dos professores e nelas colar, evidentemente, as respectivas fotografias.
É uma norma do liceu que, quero crer, se não fundamenta numa exigência dos professores.
Só não escrevi as faltas e as notas, mas se o sistema se mantiver para o ano não terei dúvida em fazer, se mo pedirem, o trabalho completo. Teremos todos, naturalmente, menos preocupações durante o ano lectivo.
Srs. Deputados: Embora alguns reitores e professores, com verdadeiro sentido da sua missão, vejam no pai do aluno o principal responsável pela sua educação, na qual transitória e especificamente o liceu colabora, o que na prática se passa, e dia a dia se observa, leva-me a considerar conveniente que se recorde à generalidade dos responsáveis pelo ensino liceal (visto que é deste ensino que estamos a tratar) que nós, pais e encarregados de educação, não somos meros contratantes que, mediante o pagamento de importâncias legalmente estipuladas, e de outras estabelecidas por decisão dos Exmos. Reitores, adquirimos o direito de serem ensinadas aos nossos filhos as matérias programadas.
A nossa posição é bem diferente e tem de ser entendida como realmente é e atrás se referiu.
E também não é aquela a posição dos liceus. Leccionar matérias programadas é interpretação erradamente rígida da simplicista definição de ensino, que se lê nalguns dicionários.
O ensino dos liceus, para além de uma cultura mínima de base, deve constituir para o aluno um continuado exercício para o raciocínio e, fundamentalmente, uma bem orientada preparação para a aplicação presente e futura da sua inteligência e da sua memória.
O curso dos liceus acaba; o curso superior, que pode seguir-se, também acaba, mas a necessidade de estudar acompanha-nos pela vida fora.
Por isso, para além da missão educativa que os professores devem ter sempre, como base da sua função docente, é preciso ensinar aos alunos a estudar.
Infelizmente, esta preocupação só raramente se revela e por isso, na generalidade dos casos, o estudo torna-se mais penoso e menos proveitoso para os alunos, recaindo sobre os pais, directa ou indirectamente, a tarefa que no liceu devia ser realizada.
Creio bem que já nos bastaria, e isso, sim, compete em primeiro lugar aos pais, a árdua luta diária contra a onda de irresponsabilidade que atinge em regra os adolescentes, o que, agravada com as múltiplas solicitações da hora presente a que estão sujeitos os nossos filhos,- os leva lamentavelmente a estudar menos do que devem, daí resultando numerosas reprovações de que todos somos vítimas.
Sublinho, pois, uma vez mais: sem um perfeito entendimento entre a escola e a família, de que ambas, por se completarem, só podem beneficiar, correm os jovens riscos graves que deviam evitar-se.
Tanto pode a escola destruir, sob o domínio do espírito materialista, o que os pais instilam na alma dos seus filhos, como pode a família, por carência educativa ou maus exemplos, destruir o que penosamente o professor se esforça por construir.
Srs. Deputados: Vou terminar.
Em presença do que tem sido analisado e preconizado neste debate, é-me lícito desejar e prever que no futuro:

A escolha do local de construção dos novos liceus, mercê da carta escolar quase ultimada, obedecerá mais às necessidades escolares das regiões e menos a razões políticas;
As novas condições de admissão, promoção e remuneração dos professores tornarão a carreira docente mais atractiva e prestigiada;