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2462 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 137

papel da mulher no êxodo rural. No entanto, em alguns países da Europa a sua intervenção tem sido decisiva. Também já se escreveu que a mulher no mundo rural é muitas vezes uma doméstica sem salário, uma associada sem autoridade, uma co-herdeira abusivamente despojada. As condições arcaicas de vida são mais pesadas para a jovem do que para os seus irmãos. Traduzem-se, por vezes, numa servidão, numa humildade, sendo-lhe negado o acesso a um mínimo de cultura ou, até, à realização do sonho de um lar independente.
O ambiente em que decorre a vida rural é ainda caracterizado por toda a sorte de carências no domínio das infra-estruturas essenciais à vida colectiva. Agua e esgotos, estradas e caminhos, transportes e comunicações, iluminação e energia, equipamento sanitário e assistencial, primam pela ausência.
A miragem de uma vida melhor é ainda enriquecida, para os candidatos ao êxodo, com as grandes atracções dos novos meios. Nas motivações económicas, está a sedução do progresso técnico; nas motivações sociais, à regularidade no trabalho, melhoria nas remunerações e benefício da segurança social acrescem as possibilidades de instrução e promoção profissional dos filhos, da alimentação mais fácil e variada, da habitação com maior conforto, enfim, de diversões mais acessíveis e frequentes. E, mesmo, quando o sonho se desfaz nos bairros da lata, na prostituição, no desemprego, na tuberculose, o homem continua apegado à grande sedução, persiste em permanecer.
Sr. Presidente: Em 1960 a população activa agrícola da metrópole representava 43,6 por cento do total da população activa; em 1965 tal percentagem deve ter baixado para 37,2 por cento.
Dir-se-á que isto representa progresso. A Itália passou de 49 por cento em 1936 para 24 por cento na actualidade ; a França dispunha em 1962 apenas de 17 por cento da população activa na agricultura; os Estados Unidos e a Inglaterra não iam mesmo além de 8 por cento e de 4 por cento.
Em termos gerais isto é exacto. Uma análise particularizada revela, contudo, entre nós, muitas dificuldades.
Aquilo a que estamos assistindo não é apenas um êxodo agrícola - isto é, uma transferência, para outros sectores de actividade, de trabalhadores até agora mais ou menos subempregados na agricultura - , mas, antes, um êxodo rural, com a criação, por exemplo, em regiões do Nordeste, de pequenos desertos.
Se o decréscimo de activos na agricultura pode ser saudável, num processo de desenvolvimento económico, ele é, entre nós, «catastrófico pela forma como se verifica, pura fuga a condições de vida de miséria, e não dispensa de mão-de-obra pela criação de novas evoluídas estruturas».
O êxodo agrícola, acompanhado de uma reestruturação do sector, será uma oportunidade para a valorização dos verdadeiros profissionais agrícolas, mas o êxodo rura-L indiscriminado só tem conduzido, entre nós, à ruína dos campos.
Podem sumariar-se, aos níveis demográfico, económico-financeiro, social e político, consequências deste processo de «desertificação» que afecta o continente.
Partiam populações das idades activas e,- sob o ponto de vista qualitativo, mais habilitadas ou empreendedoras. Ficaram os velhos e as crianças, mas até o número destas será cada vez mais reduzido, por uma inevitável quebra na taxa de natalidade.
A estrutura profissional empobreceu. Da construção às actividades artesanais, para não falar do pessoal mais qualificado que apoia as poucas indústrias locais, é um mundo de carências, afectando não só a produção, como estrangulando o consumo.
A pequena poupança local morreu e a descapitalização, em variados sectores, tomou o lugar do investimento. Em alguns meios será milagre para a fiscalidade encontrar matéria colectável que permita evitar uma redução no volume global dos impostos arrecadados.
A crise da família começa a não ser uma imagem de retórica pessimista e o abaixamento do nível moral e do sentimento religioso não pode deixar de preocupar os que acreditam residir nestes valores a grande reserva da Nação Portuguesa.
Quem lê diariamente os jornais pasma como começam a ser possíveis, num povo bom e generoso como o português, coisas tão extraordinárias como certa criminalidade que alimenta o sensacionalismo informativo.
Destruiu-se a vida local e, nesta agonia, pereceram classes sociais que historicamente exerciam nesses meios uma função moderadora, docente e até assistencial.
Concentraram-se serviços públicos nos grandes centros e, talvez, para encontrar uma compensação, eliminaram-se no rural. Os agrónomos, atrás de secretárias, na cidade, informam papéis, em vez de no campo prodigalizarem assistência técnica aos agricultores.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Os veterinários ocupam-se dos cães das senhoras ricas e ociosas, esquecendo o fomento pecuário. Os médicos dedicam-se à psiquiatria, novo eldorado para uma profissão que se enobrecera na memória de um João Semana.
E quando hoje se procura um presidente de câmara, um provedor de Misericórdia, sei lá, um mestre para a banda local, resignamo-nos ao contributo da cidade, aceitando uma administração comandada à distância ou feita à custa de uma rápida visita semanal.
Não creio, Sr. Presidente, que a falta de animadores e de elites locais seja das coisas mínimas que afligem a actualidade portuguesa.
Mas poderá evitar-se o êxodo rural?
O problema não se põe em termos absolutos, consistindo antes em saber como obstar à debandada, realizando um desenvolvimento equilibrado das várias regiões do País.
De há anos que na Assembleia Nacional se tem insistido pela necessidade de definir e executar, com persistência, uma política agrária.
A lavoura portuguesa acumulou prejuízos, queimou reservas e, no estado de exaustão em que se encontra, os custos humanos e materiais da recuperação serão bem pesados.
Não, vou deter-me na extensa problemática das dificuldades para as quais é costume pedir solução: preços dos produtos agrícolas; esquemas de comercialização; assistência técnica e financeira; crédito e seguros agrícolas; reconversões culturais; correcção de estruturas agrárias; possível hidráulica agrícola; pequena mecanização; esquemas associativos; formação profissional; industrialização dos produtos agrícolas ...
O projecto do III Plano de Fomento, ao considerar a elevação da taxa média de crescimento do produto agrícola para 3 por cento, revela, relativamente à estagnação em que se tem vivido, um propósito de renovação. Mas, à modéstia desta taxa de crescimento de 3 por cento, quando comparada com as previstas para-os outros sectores, acresce a dúvida sobre se a hierarquia de prioridades e dotações programadas permitirão mesmo alcançar tal objectivo.