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2 DE MARÇO DE 1968 2583

Temos perante nós em exame as contas públicas de há dois anos, iluminadas por mais um daqueles pareceres do nosso ilustre colega Sr. Engenheiro Araújo Correia, sempre aliando a incansável minúcia da análise à permanente sabedoria dos seus prudentes juízos.

Ali nos é chamada vivamente a atenção para o contingente equilíbrio da balança de pagamentos, na insuficiência das exportações e no exagero das importações, apenas garantido por duas fontes ora tão caudalosas como inseguras: as remessas dos emigrantes, as entradas de turistas.

Ali se aponta, com a fria mas irrebatível eloquência doa números, o peso enorme nas aquisições ao exterior de mercadorias que poderíamos criar cá; ali se denuncia «a comodidade, isto é, a facilidade de importar o que não há» como altamente gravosa, por induzir à inércia e poder trazer surpresas e sacrifícios; ali se observa com razão que o agravamento nas importações de produtos de origem vegetal é resultado da crise agrícola; ali se acusa como não fazendo sentido o aumento da importação de oleaginosas.

Detenho-me neste ponto. Do valor da importação de oleaginosas, cujo montante em 1966 - 791 492 contos - tanto preocupou o nosso respeitado e autorizado colega, que repetidamente se lhe refere, sempre com reprovação ou mágoa, mais de três quartas partes foram pagas por amendoim e gergelim, quase tudo comprado a inimigos; pelo contrário, vem do ultramar português a maioria enorme das oleaginosas para fins industriais, todavia de pouco peso em tamanho acervo.

Saberá, porém, o ilustre relator das contas, saberão os Srs. Deputados que com ele hajam notado e lamentado esta sangria de dinheiro, que ela ainda se agravou consideravelmente no ano imediato e só por causa das oleaginosas e óleos alimentares?

Comparando os dois anos que findaram em Novembro de 1966 e de 1967 (pois não pude, à data de colher notas, obter informações mais recentes), encontro de um para o outro mais de 250 000 contos - mais de um quarto de milhão de contos, notai bem! - de agravamento destas importações, a saber:

(VER A TABELA NA IMAGEM..)

De modo sucinto, mas sobre dados firmes, espero ter evidenciado esta tríplice verdade:

1.ª O olival português é importante riqueza fundiária e factor considerável do produto nacional;

2.° O abastecimento metropolitano em gorduras alimentares repousa muito principalmente sobre o binómio azeite + óleo de amendoim;

3.º Dependendo o primeiro termo deste binómio da produção interna e o segundo de importações susceptíveis de tomarem grande vulto, e quanto maiores em maior proporção provenientes de territórios estranhos que não se nos mostram favoráveis, o fomento da produção de azeite contribuirá de modo substancial:

a) Para o desenvolvimento interno;

b) Para a segurança do abastecimento;

c) Para a redução do desequilíbrio das balanças do comércio e dos pagamentos ao estrangeiro.

Eis a luz a que deve ser examinada a política do azeite.

Sempre o Governo -honra lhe seja! - esteve atento aos problemas da produção oleícola e do abastecimento de azeite, cuidando de ajudar os lavradores e servir o público consumidor, e nesta sequência creio-o apetrechado para enfrentar qualquer crise, ao menos nos primeiros embates.

Mas há situações novas a requererem atenção nova - nos actos, só não nas doutrinas-, e em função delas deve ser reorientada a política.

Não será que engrenagem importante do mecanismo está a falhar, ou os factores mudaram radicalmente, se contra uma das directrizes mais afirmadas vemos precisamente mais depreciado o azeite de mais fina qualidade? . . .

Para mim, as situações novas resumem-se essencialmente a duas: encarecimento da produção e concorrência, e mistura, do óleo de amendoim, artigo essencialmente estrangeiro hoje em dia.

Comecemos por aqui.

Foi muito tempo costume menosprezar o óleo de amendoim, e talvez nos começos as suas condições de fabrico ou apresentação o justificassem, mas creio que a nossa indústria o prepara hoje de forma perfeitamente satisfatória, segundo a sua natureza.

Dessas primeiras impressões resultou, todavia, longo descrédito, que por muitos anos lhe manteve baixo o consumo, apenas alentado pelo mais favorável preço. Aliás, para sustentar esta relativa barateza foi necessário algum tempo subsidiá-la, facto que lembrarei somente em abono da ideia de que sem iniquidade os subsídios podem, se necessário, inverter-se.

Gradualmente, foi, todavia, o óleo entrando nos usos, por vezes em misturas fraudulentas animadas pelas diferenças dos preços, mas o primeiro grande surto de produção e consumo verificámo-lo em 1956, quando foi pela primeira vez autorizada a sua mistura com azeite para venda ao público, a fim de suprir a escassez resultante de uma universalmente baixa colheita, que nos afligiu a nós e aos demais países oleícolas.

Foi grande a celeuma provocada por esta legalização do que antes era condenado, e aqui na Assembleia essa ressoou em vivo debate, que sancionou, porém, a medida.

De que ela se pode justificar tivemos a contraprova em 1963, em que a mistura foi somente insinuada aos retalhistas, com o resultado de longas bichas à porta das mercearias, esperando serem servidas do azeite escasso, mas preferido sempre ao óleo.

Por isto, talvez, foram menos vivas as reacções quando em fins de 1965 voltou a ser instituída a mistura como prática legal, criando-se a entidade nova do «lotado corrente» de azeite e outros óleos directamente comestíveis.

Como nestes prepondera o óleo de amendoim, veio-lhe daqui grande favor, rapidamente acelerado por artifícios que substituíram o lucro da fraude pelo lucro do lote em proporções não sonhadas pelo legislador.