8 DE FEVEREIRO DE 1969 3139
a consideração deste aspecto leva-nos ao problema da dobragem dos filmes estrangeiros, pois que não só desta maneira se evitaria o mal a que nos referimos, como ainda se contribuiria para a redução do perigo de serem levados pela imagem visual ao campo da fixação intelectual um sem-número de erros ortográficos n de sintaxe de que são pródigas as legendas dos filmes.
Se se encontram inconvenientes de técnica, ou outros, julgo superar esses inconvenientes o bom uso que assim se podo fazer da nossa língua e da sua expansão nas terras do ultramar e até nas colónias de portugueses radicados pelo Mundo.
Também aqui se aplicam as considerações que deixei expressas quando aos cuidados que devem ser exigidos aos apresentadores da rádio e aos organizadores de textos, na certeza de que não basta uma tradução à, letra, sendo de exigir que essa tradução revele bons conhecimentos de português e não bons conhecimentos da língua vertida. Estas considerações levam-nos muito naturalmente ao campo das traduções. Foi esse um dos aspectos sobre o qual se debruçou com muita preocupação o I Simpósio Luso-Brasileiro sobre Língua Portuguesa, reunido em Coimbra no ano de 1967. Ali foi sugerido que em cada um dos países de língua portuguesa fossem, criadas escolas de tradução, procurando-se evitar que dessa maneira versões feitas comercialmente tornem em confusa linguagem os textos vertidos.
Um aspecto que deve ser motivo bastante de preocupação é o que se prende com a correspondência exacta do sentido a verdade científica das publicações traduzidas, as quais são de grande necessidade, dado que o conhecimento do pensamento e dos progressos obtidos no campo da ciência e fia arte nos países estrangeiros se torna cada vez mais indispensável para o estudo, a evolução e a convivência.
O Sr. Duarte do Amaral: - Muito bem!
O Orador: - Essas publicações, para corresponderem ao seu objectivo, terão de ser traduções apuradas, na forma e na expressão, a fim de que possam ser compreendidas e na exactidão da verdade científica cumpram a sua finalidade. Põe-se assim a necessidade de considerarmos que nas traduções de obras de carácter científico não basta que o tradutor seja um conhecedor sério da linguagem da origem e da própria linguagem, tornando-se indispensável que possua o mínimo de conhecimento científico relacionado com o assunto da obra. É este um caso que se põe desde já à consideração das empresas editoras, pois somente a elas cumpre velar pela verdade e pela correcção que devem ser postas nessas traduções, cuidando de escolher pessoa competente, a quem terão necessariamente de pagar melhor e conceder mais tempo. O prejuízo aparente que lhes advém será compensado pela escolha e deferência do público, mas muito principalmente, e julgo poder ainda apelar para este aspecto da questão, pela satisfação ética de ter contribuído para uma melhor formação e informação do seu público.
Sr. Presidente: Um jovem aluno de uma das nossas Faculdades dizia-me no outro dia que era difícil estudar determinada disciplina em virtude de não haver sebenta e ser dispendiosa, em tempo e dinheiro, a consulta de livros especializados. Pensara resolver a questão levando para a aula um pequeno gravador a fim de assim poder reter as exposições do mestre, as quais repetidas em casa o ajudariam a estudar, mas, tivera uma grande desilusão. Fora o facto que ao reproduzir a exposição no sossego da sua sala de estudo, com alguns companheiros de trabalho, verificara que na exposição os pontapés na gramática
eram tais e de tal ordem que tudo se perdia na confusão sintáctica.
Este facto, que encontra justificação na medida em que o interesse científico poderia superar o cuidado na exposição, sem que daí se conclua falta de cultura linguística do mestre, é sem dúvida, indicativo do pouco cuidado e interesse posto na correcção da linguagem. O facto repercute-se então nos jovens, que já de si mal preparados e com tendência para um desleixo que julgam estar na moda, fazem gula em falar mal e sem sentido, substituindo nomes, tempo e lugares pela mesma expressão, que sendo pobre monossílabo passa a ser de significado ilimitado na sua paupérrima linguagem. Expressões tais como "pá", "coiso", "mais ou menos", definem, invocam completam e baptizam.
No Brasil, ao verificar-se do mesmo modo este desinteresse pela língua-mãe, foi determinado que dos exames vestibulares de quase todas as Universidades e escolas superiores fizesse parte a prova de Português. Ali, e nas Faculdades de Medicina, Direito, Economia. Serviço Social, Administração Pública, Odontologia, Ciências Sociais, História, Ciências, Matemática, Educação Física, etc.. a prova de Português é eliminatória.
Para além destas providências, o Governo Brasileiro determinou ainda que nas escolas secundárias, até ao fim dos cursos se reservasse para a disciplina de Português maior número de aulas semanais do que para qualquer outra disciplina.
Ora, cá pela nossa casa, as coisas não vão melhor do que nos tempos em que o Governo do país irmão achou por bem introduzir tais determinações nos planos de estudo. Os alunos chegados ao limiar das Faculdades revelam o mais lastimoso primarismo, não só a escrever, mas também ao falar, facto que compromete as suas faculdades de compreensão, do assimilação, de raciocínio e de expressão, assim como o seu êxito futuro na própria profissão. (Gonçalves Viana.)
Para além de falta de cultura, esto facto nivela ainda falta de civismo. Falta ao nível da inteligência, ao nível da arejada consciência, ao nível da clara vontade e do limpo propósito: falta ao nível da educação como educação p onde o instinto não chega. Isso e uma excessiva positivação da vida ó quanto, em última e primeira análise, detectamos na base das desatenções e maus tratos, verdadeiros tratos de polé . . . de que a língua é objecto, (Carlos de Soveral.)
Uma das causas desta indisciplina, principalmente no período da escolaridade da nossa juventude, encontrou-a o Dr. Gomes Branco quando num dos seus artigos diz:
Igualmente o latim simbolizava estudo persistente, esforço, trabalho, desejo de se aperfeiçoar e de vencer. Na realidade, o latim clássico é uma língua rica de formas, vasta no vocabulário, de índole sintáctica bem diferente das línguas mais correntes entre nós. Por tudo isso o seu estudo exigia capacidade intelectual e desejo de a utilizar. O esforço que pedia, aliado à aparente inutilidade, muito concorreu para o seu afastamento dos cursos gerais. Ora a orientação, que cedeu no caso do latim, corre o risco de ceder noutros casos do ensino e da educação. O modo como hoje se estuda e disso claro sintoma. Muitos estudantes procuram quem os substitua no esforço de inteligência, e, sobretudo, de vontade, que a escola lhes pede. E será essa substituição possível?
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - É tempo bastante para que também nós, e com razão, tratemos de providenciar no sentido de cui-