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12 DE MARÇO DE 1969 3431

tualmente sob a arbitragem do Estado, conduzindo a regras obrigatórias para todos os interessados, uma vez que o Governo venha a homologá-las, depois de submetidas ao contraste de inquérito público.
A negociação colectiva entre representações idóneas - e, no quadro português, qual é hoje mais idónea do que a corporativa? - constitui certamente o melhor processo de garantir a justa harmonia dos interesses das partes, quando de alguma das bandas estas são muito numerosas ou cada elemento de per si não dispõe do poder de sustentar livremente os seus termos no trato.
A equidade do negócio requer a equivalência das posições, a igualdade de força contratutal; de outro modo, ele arrisca-se a ser falseado, um dos intervenientes não recebendo tanto quanto é capaz de valer para o outro, o que entrega. Ora, provavelmente a maior fonte de desigualdades de força contratual nos mercados de bens reside na multiplicação dos elementos da oferta, ou da procura, perante número de elementos da outra parte suficientemente pequeno para se unirem, determinada ou tacitamente, e ditarem eles as condições das trocas. Surgem, assim, os conluios dominadores, os cambões, impondo as suas regras, fixando unilateralmente preços, explorando os mercados no maior proveito próprio e com mitigada consideração dos interesses alheios. A história económica, sobretudo a dos tempos modernos, enche-se a descrever as acções e reacções assim desenvolvidas.
Autores bem conhecidos se têm dedicado a examinar os problemas do domínio dos mercados pelas diferentes forças económicas e empresariais, parecendo generalizar-se o reconhecimento de que não há hoje mercados realmente livres, mesmo fora dos sectores onde tão frequentemente os estados intervêm para restabelecer equilíbrios. A teoria do efeito dominante, de François Perroux, se eu a conheço é porque toda a gente a conhecerá; e como não é menos sabido, o economista norte-americano Galbraith sustenta que nos meios modernos de há muito a livre concorrência está substituída pelas compensações que entre si estabelecem os poderes económicos. A mais recente obra deste tão considerado autor - digo considerado, sabendo que, todavia, não é universalmente acatado; mas quem o é? -, a sua análise do estado industrial moderno, de um modelo que, sendo o do seu país, prefigura tendências gerais, esforça-se de novo na demonstração de que os mercados contemporâneos são comandados pelas empresas com força para tanto, reduzindo a independência de acção daqueles de quem compram ou a quem vendem. E lá diz: «este comando dos mercados é a contrapartida da grande dimensão, e grande dimensão relativamente ao mercado comandado»; e exemplifica: um pequeno empresário, compre ou não compre, venda ou não venda, a sua decisão não tem significado apreciável para o cliente, que irá a outro. Mas a decisão de uma grande empresa, essa pode ser vital para quem a abastece ou dela se fornece.
Galbraith ainda frisa outro ponto, que interessa ao meu caso, e por isto refiro. O comando dos mercados no sentido da estabilização de preços e de quantidades é essencial à economia da empresa moderna, que exige grandes investimentos de capitais e tecnologia, impossíveis sem alguma segurança de remuneração. Aqui terá particular sabor uma nota relativa à agricultura:

Mesmo a agricultura moderna, ainda que fora do sistema industrial, não pode acomodar-se efectivamente de variações radicais de preços, e todos os países com agricultura altamente desenvolvida se têm encaminhado para lhe regularem os preços ... E a consequência da segurança nos preços e correlativa capacidade de planear tem sido o grande acréscimo de investimentos dos lavradores em capitais e tecnologia, o resultado sendo que os ganhos de produtividade nos últimos anos têm sido consideràvelmente maiores na agricultura do que na indústria. Mas, sendo os lavradores muitos, não têm a possibilidade de regulação não governamental dos preços que caracteriza o sistema industrial...

Estas generalidades relembradas, acho que já posso voltar ao meu projecto.
Ele destina-se, precisamente, insistirei, a dar força no mercado às produções agrícolas transaccionadas por grosso com poucos, mas fortes, compradores. Destina-se a suprir o defeito do número que incapacita os agricultores isolados de participarem eficazmente na regulação de tais transacções, dando-lhes poder contratual, não que sobreleve ao actualmente dominante, mas que se lhe equipare para equitativos entendimentos.
É relativa novidade a entrada da agricultura em mercados concentradores dos seus produtos para os valorizarem pelo acondicionamento, pelo armazenamento ou pela transformação industrial. E nestes mercados é frequente depararem-se à multidão dos lavradores frentes unidas de compradores tão pouco numerosos, que, se não são associados, são, pelo menos, facilmente entendidos.
As consequências destas situações, e como em diversas circunstâncias elas se têm manifestado em prejuízos dos produtores de matérias-primas agrícolas, e portanto detrimentais para a própria produção, são já bastante conhecidas; mas, porque são recentes, ainda não foi erguido um sistema geral de as evitar.
É o que julgo poder-se conseguir, na melhor equidade para as partes, por via de disposições como as que venho propor.
Elas pouco ou nada têm de originalmente meu.
Qualquer coisa de bastante neste sentido vem a ser pedido ao Ministério da Economia, pela Corporação da Lavoura, desde há cerca de dois anos; e o Sr. Ministro, no seu discurso aos leiteiros madeirenses, em 7 de Fevereiro último, argumentou substancialmente a favor da necessidade de defender «a oferta de uma produção agro-florestal, pulverizada e financeiramente débil, frente a uma procura industrial concentrada».
S. Exa. opinou então - e quero declarar-me calorosamente de acordo, pois penso o mesmo há muito tempo - que não é próprio da lavoura defender o valor dos seus produtos, transformando-se em actividade comercial ou industrial. Repito, também assim penso; a saída, embora já muito preconizada, contém o risco de afastar lavradores da lavoura sem os inserir eficazmente no fabrico ou na venda.
Não, do que os lavradores precisam é da remuneração justa dos seus dinheiros e trabalhos; e para tanto têm de adquirir poder contratual nos mercados. É o meu fim!
Que, em matéria de preços, sou de opinião que é tempo de lhes introduzir um conceito além do de mera remuneração: o conceito de adequada participação no valor final, o conceito de aquinhoar do bolo. É a reinvindicação permanente do operariado; tem também de ser reivindicação dos fornecedores de matérias-primas.
Sem o comércio distribuidor ou a indústria transformadora, elas de nada valeriam, talvez; mas sem elas o comércio ou a indústria não poderiam auferir os seus lucros, sem dúvida.
Esse conceito o incluo no meu articulado, convicto de ser oportuno.
Como é oportuno, e lá está, considerar o afeiçoamento da produção aos requisitos de qualidade e quantidade dos mercados.