3436 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 190
Quanto ao nosso caso, a hora regimental começou por ser às 15 horas. Mas, tendo a experiência mostrado que a essa hora raramente havia quorum, transferiu-se a hora regimental para as 15 horas e 30 minutos.
Como a prática estava contra a letra do Regimento, punha-se esta e em harmonia com aquela. Pouco tempo depois, porém, já nem a essa hora havia normalmente quorum para e início das sessões, começando quase todos a chegar meia hora depois, ou seja, às 16 horas. Por aqui se evidencia que somos eternamente retardatários, que nunca sabemos estar a horas. A emenda feita no Regimento, quanto à hora regimental, revelou-se medida perfeitamente inútil.
Quero também lembrar aos menos e aos mais retardatários que desejaria ter na sessão de hoje quorum suficiente para as resoluções que teremos de votar no final. Espero que os menos e os mais retardatários não sejam os primeiros a ausentar-se.
Posto isto, vai passar-se à
Ordem do dia
O Sr. Presidente: - Continua o debate sobre as contas gerais do Estado e as contas da Junta do Crédito Público relativas a 1967.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto de Araújo.
O Sr. Alberto de Araújo: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Mais uma Conta Geral do Estado se apresenta à apreciação da Assembleia Nacional. Todos os anos, até 15 de Dezembro, aprova esta Câmara a lei de autorização de receitas e despesas para o próximo ano económico e todos os anos também, no termo da sessão legislativa, aprecia a Conta Geral do Estado.
E tal esta regularidade que nem nos apercebemos já do que ela representa de esforço e de espírito de legalidade por parte da administração pública. Tudo é calculado com antecedência e possível exactidão, de maneira que a Conta, como resultado de gerência, corresponde, de uma mane rã geral, às cautelosas previsões do Orçamento. E se sempre se tem dito e proclamado que o Estado Português é um Estado de direito, as finanças públicas bem demonstram que todos os sectores da Administração estão sujeitos a uma ordem jurídica previamente estabelecida, que disciplina e limita a sua actividade.
Muito trabalho e perseverança foram necessários para atingir todos estes objectivos, e como homens, às vezes, se mostram desmemoriados dos serviços que outros homens lhes prestaram, convém sempre relembrar o que o saneamento das finanças públicas representou para que se abrissem perspectivas de salvação e de ressurgimento no espírito de um povo que, no fim do primeiro quartel deste século, parecia haver perdido a fé e a confiança no seu próprio destino.
A Assemblea Nacional não se limita a discutir e apreciar a Conta Geral do Estado. Sobre ela incide, anualmente, um parecer da Comissão de contas, do qual é relator o Sr. Engenheiro Araújo Correia, que a valoriza altamente, na medida em que aprecia toda a actividade económica e financeira da Nação e formula críticas e apreciações largamente documentadas e animadas de um alto sentido construtivo e nacional. Quem há longos anos, como eu, sob 2 a esta tribuna já lhe é difícil encontrar expressões novas de louvor para se referir ao parecer sobre a Conta Geral do Estado.
Decorrem as sessões legislativas, sucedem-se as legislaturas, o ponteiro do tempo não- pára na sua marcha cadenciada para o futuuro. Mas em cada ano que passa vai-se fortalecendo e renovando nesta Câmara o sentimento de viva admiração e reconhecimento pelo Sr. Engenheiro Araújo Correia, dada a continuidade, a persistência e a verdadeira devoção que tem posto no desempenho desta trabalhosa e pesada tarefa parlamentar, que se confunde com uma boa parte da sua própria vida.
Sr. Presidente: A Conta Geral do Estado é o espelho da própria Nação, do que ela pode contribuir, através do regime legal de impostos e taxas, para assegurar o funcionamento dos serviços públicos e a satisfação das necessidades gerais, revelando os sectores que, pelo desenvolvimento das matérias colectáveis e consequente aumento de cobrança, denotam melhores tendências de progresso e de crescimento. E a Conta Geral mostra também como o Estado aplica e distribui as receitas que cobra, as prioridades a que obedece, a natureza e a diversidade dos encargos a que tem de fazer face. Os povos são cada vez mais exigentes e as necessidades públicas cada vez maiores. Mas a capacidade tributária tem o seu limite e, atingido este, o Estado só pode obter maior volume de réditos através do aumento do produto nacional. Nos Estados mais evoluídos já se determinou a percentagem de aumento na cobrança das receitas públicas correspondente a determinado aumento no produto nacional. E procura estabelecer-se a relação ideal que deve existir entre o produto nacional e o total dos impostos cobrados.
Compreende-se, por isso, a relação estreita que existe entre o crescimento económico e o crescimento das receitas públicas, ou seja a absoluta dependência do sector financeiro do sector económico. E se é a economia que fornece ao Estado os recursos financeiros de que carece, é, por isso, do seu interesse fomentar ao máximo o crescimento económico como condição indispensável ao aumento das suas próprias receitas.
Sr. Presidente: Quero referir-me às intervenções que, em épocas passadas, tiveram nesta tribuna, na apreciação da Conta Geral do Estado, dois parlamentares ilustres: o Sr. Dr. Joaquim Dinis da Fonseca, já falecido, e o Prof. Diogo Pacheco de Amorim, felizmente ainda vivo.
O Dr. Dinis da Fonseca tinha sempre a preocupação de insistir para que não deixasse de observar-se a prática de elaborar a tempo a Conta Geral do Estado, a fim de ser apreciada oportunamente pela Assembleia Nacional, nos termos constitucionais. E numa das suas últimas intervenções, se bem me recordo, afirmava: «A batalha da Conta Geral do Estado está ganha, mas ainda pode ser perdida ... Estou certo que se fosse hoje vivo, diria que a batalha da Conta Geral do Estado está definitivamente
O Sr. Prof. Pacheco de Amorim insistia particularmente na necessidade de se estar atento à posição da balança de pagamentos do País, dada a sua influência directa no volume das reservas cambiais e, portanto, no valor e na estabilidade da moeda.
O Sr. Engenheiro Araújo Correia, no seu parecer, chama sempre também a atenção para a balança de pagamentos, que é, afinal, a síntese de que o País paga e o País recebe dos outros países em consequência da sua actividade económica e financeira no plano externo.
E compreende-se a importância do problema. Se a Nação tem hoje uma moeda forte e estável, aceite em todos os mercados, isso advém de termos podido acumular reservas em ouro e divisas que asseguram a sua convertibilidade.
O problema não é nosso. E de todas as nações, e mesmo as mais ricas e poderosas, que julgavam dispor de recursos inesgotáveis susceptíveis de resistirem aos embates mais duros e violentos, tiveram de arrepiar caminho