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1350 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 66

O Orador:-Compreende-se: no problema da Itália pode até a Igreja estar a proceder não totalmente de acordo ...

O Sr. Camilo de Mendonça: - Não falava pròpriamente na Igreja italiana, falava na Igreja universal.

O Orador: -V. Ex.ª refere-se concretamente ao Papa, não?
Se é isso, evidentemente que não me compete a mim julgar da atitude do Papa, mas apenas explicitar aquilo que julgo ser a atitude da Igreja, segundo os documentos conciliares que citei.
Demais, o problema, em Itália, parece-me ser o da existência, também, de uma norma concordatária que não foi revista nem denunciada.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Sabemos que, quer o Papa, quer os bispos italianos, empenharam-se, por todos os modos, junto da Assembleia italiana dos deputados católicos ou soi-disant católicos, no sentido até de conseguirem que o problema fosse plebiscitado, para evitar que o voto de permissão do divórcio fosse consumado no Parlamento.

O Orador: - Compreendo até que a Igreja, ou melhor, os católicos enquanto tais, porque os católicos são livres, inclusivamente na sua acção política, procurem obviar a que o divórcio seja consagrado na legislação civil. Simplesmente, o que se passa na Itália é o que se passa na quase generalidade dos países, visto que eu creio que a República Dominicana tem uma Concordata semelhante à nossa. Nos países que não admitem o divórcio, ele não é admitido para ninguém. E parece-me que o sentido da luta da Igreja é precisamente esse: que não seja consagrado, na lei civil, um instituto que ela reputa nocivo. Certo. Simplesmente, no nosso caso não: no nosso caso o Estado reconhece como bem adquirido o divórcio e, portanto, ou o reconhece a todos ou não o reconhece a ninguém.
Que se ponha o problema do divórcio, eu compreendo perfeitamente. Que se discuta, que se abra uma controvérsia sobre se se deve manter ou não, inteiramente certo. Agora o que já não compreendo, nem do ponto de vista do Estado, nem do ponto de vista da Igreja, é a actual situação em que há uma desigualdade entre portugueses, fundamentada no seu credo religioso.

O Sr. Camilo de Mendonça: - Parece-me que, por uma questão de coerência, se as pessoas têm uma fé, não têm de lastimar-se, mas sobretudo que a Igreja não pode senão propugnar que se mantenha a actual situação relativamente ao casamento católico e procurar obter o mesmo para o divórcio consentido pela lei civil.

O Sr. Almeida Cotta: -A Igreja, parece-me a mim, não admite o divórcio. Mas o Estado, e o Estado Português particularmente, porque tem diversas profissões religiosas, admite o divórcio.
Para os católicos não há constrangimento algum, porque o católico também não admite ele próprio o divórcio. O casamento não é um contrato como qualquer outro, mas sim um sacramento.

O Sr. Valadão dos Santos: - Deixar de ser católico?

O Sr. Almeida Cotta: - Se deixar de ser católico, pois ainda assim fica na situação de poder recorrer a dissolução do matrimónio pelas vias canónicas.

Ora, um problema que V. Ex.ª Sr. Deputado Sá Carneiro aqui abordou, e que é o da existência ou não da Concordata (parece-me que o abordou, para depois se desviar para um problema de ordem civil), é que me parece bastante importante. E desejaria apenas fazer uma consideração a este respeito, que é a seguinte: a Concordata é um acordo, como V. Ex.ª sabe, e, talvez, para se raciocinar sobre um acordo, não seja indiferente ouvir as portes interessadas. Não é apenas o Estado, mas é também a igreja católica.
V. Ex.ª pôs dois pontos. Em primeiro lugar, a questão de os católicos não terem de se queixar, porque aceitam a indissolubilidade do casamento.
Por outro lado, também não é indiferente saber-se o que pensará a tal respeito a consciência religiosa do País, porque podemos estar a fazer considerações que não correspondam em nada ao pensamento da sua maioria esmagadora.
Esta matéria é muitíssimo delicada, Y. Ex.ª sabe-o muito bem, porque, além de jurista eminente, parece ser também um grande teólogo, riqueza de que o Porto cê pode justamente ufanar (risos).

O Orador: - Muito obrigado pelas suas palavras amáveis.
Todos temos de ser grandes teólogos, se somos católicos e queremos ter uma fé adulta. Parece-me evidente que não podemos ficar ao nível do catecismo da primeira comunhão.
Eu já tinha dito atrás ... Possivelmente não fui claro, e daí a observação de V. Ex.ª E que, realmente, eles têm a obrigação moral de perfilhar na sua vida a indissolubilidade, mas ninguém, nem o Igreja, nem o Estado, podem impor aos católicos que não pequem.
Ora, qual é o sentido da proibição concordatária? Não é obstar à dissolução do casamento, porque ele, para a Igreja, ó sempre indissolúvel. E note V. Ex.ª que nos países que não têm nos seus institutos civis a separação, os católicos, - para resolverem uma situação dramática familiar, podem recorrer ao divórcio sem ficarem privados da Igreja, com uma única forma que têm, civil, de legalizarem uma separação. O que a Igreja condena, em termos de falto grave, que afasta de comunidade eclesial, é o segundo casamento, porque esse não atenta também contas a indissolubilidade, atenta, sim, contra a unidade, porque constitui adultério com escândalo.
Portanto, qual é o sentido da norma concordatária?

O Sr. Almeida Cotta: - Desculpe V. Ex.ª, mas eu não o acompanho nesse raciocínio.

O Orador: - Acredito que sim, mas eu só precisava que V. Ex.ª me desse licença de terminar.

O Sr. Almeida Cotta: - O sacramento do matrimónio é, por sua natureza, indissolúvel.

O Sr. Albino dos Reis:-Indissolúvel é o contrato.

O Sr. Almeida Cotta: -Vem dar no mesmo. Quer dizer, não se pode ...

O Sr. Albino dos Reis: -E necessário não confundir o sacramento, que é de ordem religiosa, de ordem espiritual, com um contrato que é puramente civil.

O Sr. Almeida Cotta: - Pois bem. O contrato puramente civil é ou pode ser transitório e o sacramento é eterno.