27 DE JANEIRO DE 1971 1467
do cinema? A Câmara Corporativa pronuncia-se inequivocamente neste sentido, como ao viu pela transcrição de parte do seu parecer atrás feita.
Julgo que há exagero nesta posição, pois todos sabem que, sob a designação de instituto ou de outra, se tornava e torna imprescindível promover uma remodelação da orgânica da Secretaria de Estado, criada recentemente, em sucessão do Secretariado Nacional da Informação, Bem que, ao mesmo tempo e como seria mister, se estabelecessem, com a amplitude adequada, novas e mais actualizadas estruturas departamentais.
Oro, o Instituto cuja criação o Governo propõe vai contribuir, em larga medida, para autonomizai convenientemente o estudo, o debate e na resolução dos problemas de cinema, cada vez mais complexos e cada vez mais diferenciados por características e implicações especificamente próprias.
Certo é que o Governo, na sua proposto, não se alargou, como devia, ao dar contextura e atribuições ao Instituto. Mas para essa falha a Comissão julga ter encontrado novas fórmulas, que se concretizam, por exemplo, em ampliar o elenco dos assuntos sobre os quais o Conselho de Cinema devo pronunciar-se e em dar mais equilibrada representação nesse Conselho e no Conselho Administrativo - é esta a designação que deve ter, e não a de comissão administrativa - aos diferentes departamentos e aos interesses económicos e profissionais das actividades cinematográficas, onde terão assento dois vogais daquele primeiro Conselho.
A Comissão ponderou ainda que não poderia levar às últimas consequências a ideia da autonomia e da separação do Instituto, pois, de contrário, levantaria um problema- adentro da- própria Secretaria de Estado, onde a Direcção-Geral da Cultura Popular e Espectáculos ficaria, com inconvenientes vários, m uma situação insustentável se fosse posta de parte nos assuntos relacionados com o cinema. Deixaria de ser Direcçao-Geral da Cultura Popular e Espectáculos para ser apenas direcção-geral de parte dias actividades de cultura popular e de alguns espectáculos. Quer dizer: para se resolver um problema, se acaso se resolvesse, criar-se-ia outro muito serio.
Não posso esconder que a Comissão ficou impressionada com a manifestação, tantas vezes de sentido unilateral, com que certos sectores assumiram posições nos debates públicos em volto dos problemas do cinema e do teatro. Convenceu-se » Comissão, pelo que viu e observou, de que não terá havido sempre uma explanação de pontos de vista e uma formulação de conclusões que tomassem em conta, de modo objectivo, os diversos interesses em jogo.
Referira-se que alguns sindicatos nacionais se manifestaram, claramente, contra a ideia de que o presidente do Conselho de Cinema ou do Conselho de Teatro fosse o presidente da Corporação, o que, ao mesmo tempo, os induziu a pedir se observasse, na representação corporativa, em tais órgãos, o principio da paridade.
Não podia ser outra a posição da Comissão, que não deixou - sem que se possa por em dúvida o seu espírito corporativo, nem o do seu presidente, que se honra de ser o criador, em nome do Governo, da Corporação dos Espectáculos e de outras - de meditar longamente naquela verdade enunciada já, nestes termos, no preâmbulo da proposta de lei de que derivou a Lei n.º 2086, de 22 de Agosto de 1956. ou o Estatuto Jurídico das Corporações:
«Se o interesse colectivo não é coincidente com o conjunto dos interesses individuais - pensando-o o individualismo cometeu o seu maior eiró-, não é menos certo que o somatório dos interesses dos grupos profissionais ou das categorias económicas não é igual ao bem comum».
Por isso, «o sistema corporativo só se manterá fiel à sua própria autenticidade doutrinária se conseguir superar, na prática, esse perigo. De contrário, colocar-se-á em posição falsa, idêntica àquela em que, por definição, assenta o liberalismo. Este divinizou o indivíduo. Importa agora que aquele não divinize a corporação, transformando-a de meio que é em fim que não pode ser».
Claro que, por maioria de razão, não poderia conceber-se que fossem sectores parcelares da organização corporativa a exercer um predomínio exclusivista, com esquecimento ou menosprezo dos outros sectores também interessados e com direito a fazerem-se ouvir.
Ainda no decurso da última campanha eleitoral, em discurso publicado, com outros, em livro, que, em 27 de Abril do ano findo, dediquei a Salazar «... à clarividência do seu génio, à grandeza da sua obra, à fecundidade 'do seu magistério . .» pude, ao responder a um candidato a Deputado das oposições, chamar a atenção para a necessidade do funcionamento da Assembleia Nacional, «cuja existência - disse-o então - está plenamente justificada entre nós, até na medida em que a sua alta função fiscalizadora e legislativa, quando exercida com eficiência e equilíbrio, muito pode concorrer, e tem concorrido, para corrigir ou evitar a visão unilateral ou sectorial e a política de representação dos interesses económicos e sociais institucionalmente materializada nos organismos corporativos e na Câmara Corporativa».
Tudo isto vem a propósito, pois foi à sombra desta orientação geral que a Comissão se inclinou para as soluções cuja consagração propôs à Assembleia. Aliás, a Comissão fez intervir nas suas reflexões outros aspectos que não poderiam ser ignorados, como este, muito importante, de os problemas do cinema estarem longe de ser exclusivamente económicos para que a presidência de órgãos de carácter público a ele ligados pudessem confundir-se, na generalidade da sua composição, ou da sua presidência, com outros de mera representação ou índole económica e profissional.
É possível se pense que fui longo de mais neste comentário, mas não me era dado restringir mais as minhas considerações. Todas elas foram debatidas pela Comissão e eu, como seu presidente, tinha o dever de as transmitir à Assembleia com fidelidade, tanto mais que visam a esclarecer a questão que, logo nesta base I, e em volta das palavras «na» e «junto de», pode suscitar-se, e se suscitou.
Não se julgue, porém, que a importância que atribuo ao problema resulta de se atribuir ou não ao Instituto Português de Cinema personalidade jurídica, porque o seu interesse há-de medir-se mais pelo espírito com que se escolha a solução e pelo sentido doutrinal e prático dessa mesma solução. É que poderia chegar-se a uma construção que conduzisse a personalizar juridicamente o Instituto e salvaguardasse, ao mesmo tempo, os princípios e os interesses que a Comissão pôs empenho em preservar. Simplesmente, isso envolveria uma transformação profunda de certas estruturas departamentais e dos próprios esquemas de base em que assenta a proposta de lei, o que não seria viável ou aconselhável fazer.
Aliás, ao consignar-se, na proposta de alteração, que a competência do Instituto deve exercer-se sem prejuízo das atribuições legais dos organismos corporativos, logo se marca a preocupação de acautelar estes nas prerrogativas que lhe pertencem e de os colocar na posição de prestígio que importa assegurar-lhes, sem, todavia, as afectar com a entrega de poderes inadequados à sua natureza e às suas finalidades.
Devo dizer que esta última alteração foi motivada por um alvitre do Sr. Deputado Pinto Balsemão, a quem.