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24 DE JUNHO DE 1971 2173

pensável, ou por evidente, ou pelo significado puramente genérico e doutrinário do seu conteúdo, como por exemplo «o direito à vida e integridade pessoal» e o «direito ao bom nome e reputação». Estes mesmos, todavia, também carecidos, no rigor dos princípios, de regulamentação quanto às garantias jurisdicionais de exercício e protecção, que igualmente terá lugar na lei ordinária.
Poderá ainda dizer-se que a Constituição, nalguns casos, além de remeter pura e simplesmente para a lei ordinária, deverá estabelecer certos limites a essa lei, sempre que a natureza e configuração dos direitos porventura o imponha.
É exacto, e assim sucede efectivamente na Constituição Portuguesa, pois há certos direitos que são nitidamente o complemento de outros ou limites fundamentais impostos à sua regulamentação. Seja o caso dos direitos enumerados nos n.ºs 8.º, 9.º, 10.º, 11.º e 12.º do artigo 8.º - Não ser privado da liberdade pessoal, nem preso sem culpa formada; não ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare puníveis o acto ou omissão, etc. -, que são claramente complementares, além do mais, dos direitos enumerados nos n.ºs 1.º 2.º e 4.º - O direito à vida e integridade pessoal; o direito ao bom nome e reputação; a liberdade de expressão de pensamento, etc.
O mesmo sucede com as limitações impostas também à (regulamentação dos direitos, liberdades e garantias nos §§ 2.º, 3.º e 4.º do artigo 8.º - garantias contra o exercício da liberdade de expressão de pensamento; contra a prisão sem culpa formada; ou o abuso do poder através da providência do habeas corpus.
Poder-se-ia ir mais longe nestes limites constitucionais à regulamentação da lei ordinária?
É possível, mas é duvidoso. Até porque a concepção desses limites varia consoante o condicionalismo eoonó-mico-político e não conviria a ninguém uma demasiada rigidez na sua enumeração, como sucede a tudo quanto fica no texto constitucional.
De resto, toda esta dúvida quanto à liberdade de movimentos da lei ordinária, na regulamentação dos direitos, liberdades e garantias individuais, envolve uma suspeição para os órgãos legislativos, o principal dos quais é, entre nós, a Assembleia Nacional..
Dir-se-ia que quando é constituinte, a Assembleia é idónea para estabelecer aqueles limites; mas quando não é constituinte, já é suspeita nessa intervenção pela via da lei ordinária. Recuso-me a aceitar essa lógica.
E não se diga que, além da Assembleia, também o Governo tem funções legislativas, já que, por um lado, isso seria transferir a suspeição para esse órgão (considerando-o menos idóneo na regulamentação dos direitos individuais) e por outro confessar a impotência da Assembleia que detém não só o poder ide não ratificar como de revogar os diplomas do executivo, afirmando-se a fragilidade de tal poder, sempre que estivesse em causa a regulamentação governamental.
Quase se é levado a pensar que a Assembleia pretende num desesperado acto de coragem estabelecer, agora que é constituinte, limites que depois, como legisladora ordinária, não tem coragem para o fazer.
Continuo a não desejar acompanhar na sua lógica este raciocínio.
E assim termino: Nada há em princípio a opor à enumeração dos (direitos, liberdades e garantias que figuram na Constituição, até porque, como se diz no § 1.º do artigo 8.º «a especificação destes direitos, liberdades e garantias não exclui quaisquer outros constantes da Constituição (v. g. o direito à emigração) ou das leis»; alguns destes direitos, liberdades e garantias têm de ser regulamentados, sob pena de ineficácia ou inexistência; essa regulamentação, em termos gerais, deve ser confiada à lei ordinária.
Se a regulamentação, tal como se encontra estabelecida na lei ordinária, não é a mais conveniente, está nas nossas mãos, como sempre ficará para futuro, o seu ajustamento. Se o não fizermos, só de nós próprios nos poderemos queixar. A Constituição não tem culpa.
O segundo ponto que hoje desejava abordar refere-se à isopolitia luso-brasileira..
E também aqui começarei por recordar palavras já transcritas no parecer da comissão eventual: constitui a equiparação do estatuto dos brasileiros ao dos cidadãos portugueses, aspiração antiga, para a qual foram já dados alguns passos inteiramente conformes com o espírito constitucional e as exigências da «Constituição efectiva» sempre favorável à comunidade luso-brasileira. De ponderar, outrossim, a reciprocidade que idêntica atitude tomada pelo Brasil nos impõe.
Ao contrário do que sucede com a questão anterior, não há a este respeito quaisquer divergências entre as iniciativas revisionistas ida Constituição. Todos estão de acordo com a proposta governamental que alguns desejariam fosse ainda um pouco mais longe, aproveitando o clima de aproximação existente nas relações luso-brasileiras.
E como poderia ser de outro modo se esse clima corresponde a uma realidade histórica e a uma vivência sociológica tão profundas que nunca se deixaram vencer mesmo quando, por eiró ou maldade dos homens, a aparência política parecia configurar imagem diferente.
Até porque, para além da dualidade dos Estados, o Brasil e Portugal nunca deixaram de constituir uma comunidade que na identidade da língua, das religiões e das raças tem muito de nacional e de unitário.
Festejemos, pois, essa comunidade e demos-lhe o assento constitucional que merece à semelhança dos nossos irmãos da outra banda do Atlântico, cidadãos como nós da grande comunidade luso-brasileira.
Pelo sangue, pelo interesse e pelo espírito me orgulho dessa cidadania, que só não é dupla cidadania porque será uma só de um lado e Ide outro do grande mar.
O terceiro aspecto a encarar, nesta análise da problemática revisionista da Constituição, relaciona-se com o processo de designação do Chefe do Estado.

O Sr. Cunha Araújo: - Muito bem!

O Orador: - Quisera eu que a discussão se mantivesse sempre na lógica e na serenidade das premissas.
Pela minha parte vou tentá-lo.
E as premissas, em meu entender, são estas: Não está em causa a legitimidade conceituai e teórica dos dois sistemas de designação do Chefe do Estado postos em confronto: a eleição por sufrágio orgânico e a eleição por sufrágio directo dos cidadãos.
Ambos os sistemas têm consagração em mais do que um diploma fundamental (o que prova a sua aceitação doutrinária) e ambos (tiveram consagração nos nossos textos constitucionais, inclusive na actual Constituição (o que igualmente abona a sua validade).
O que se discute, portanto, não é saber se um é mais válido do que o outro, no plano puro da teoria e da doutrina.