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1 DE JULHO DE 1971 2323

No § 2.º a proposta do Governo procurou restringir ao mínimo os termos em que pode ser admitida uma discriminação de tratamento em razão do sexo, a qual, aliás, deixou de ser reportada especificamente à mulher.
A Constituição tem de se ir adaptando à evolução dos tempos. Aliás, em meu entender, a fórmula da proposta não compromete, de maneira alguma, a unidade da família, de resto expressamente afirmada no § 3.º «elemento estrutural da Nação» e constitucionalmente regulada nos artigos 12.º e seguintes.
O que se não podia deixar de afastar era a possibilidade de normas hoje aberrantes, como o preceito do Código Penal que pune a abertura de correspondência do marido pela mulher, mas não a desta por aquele, ou a que permite ao marido denunciar os contratos de trabalho da mulher.
Quanto à chefia ida família - poder funcional que está na preocupação de todos nós -, essa está expressamente prevista no artigo 19.º da Constituição.
A comissão não aceitou já a supressão Ida referência à natureza como fundamento de diversidade de direitos e deveres para os indivíduos de sexo diferente, por considerar que, se, em alguns casos, as discriminações estabelecidas na lei serão injustificadas, noutros têm perfeita razão de ser: basta pensar na prestação do serviço militar e no exercício de funções que envolvam, por exemplo, a utilização de grande força física.
A comissão incluiu ainda entre os privilégios proibidos aqueles que se baseiam na religião. Não parece haver objecção legítima neste ponto, embora a proibição de discriminação por motivos religiosos conste já do n.º 3.º do artigo 8.º
Também não se considerou conveniente a supressão da parte final do preceito - «e quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos as (diferenças) impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas». Não se trata aqui de uma restrição às proibições previstas na primeira parte da disposição, mas de uma limitação suplementar ao legislador ordinário.
O chamado princípio de igualdade perante a lei significa que o legislador deve tratar igualmente o que é igual e desigualmente o que é desigual. Ao proibir certos privilégios, a Constituição exclui expressamente que determinados critérios (nascimento, religião, sexo, raça, etc.) fundamentem discriminação de tratamento. Para lá disso, desigualdade das situações que fundamentem regimes jurídicos iguais ou desiguais, mas esses juízos terão de possuir um mínimo de racionalidade.
Como se diz na parte final do actual § único do artigo 5.º e do § 2.º da proposta, as diferenças quanto aos encargos ou vantagens dos cidadãos terão de ser impostas pela diversidade das circunstâncias ou pela natureza das coisas. Neste aspecto, o princípio da igualdade perante a lei, ou melhor, da igualdade da lei para todos, significa a proibição do arbítrio do legislador, como hoje é reconhecido pela jurisprudência e pela doutrina dos países jurìdicamente mais evoluídos.
Por uma curiosa intuição, o nosso texto constitucional antecipou-se em tal ponto a essa doutrina e a essa jurisprudência. Não é por isso aqui que deve ser alterado.
Por tudo o que foi dito, a votação do texto, tal como consta do parecer, corrobora posições claras da comissão, cujo fundamento não foi abalado por nenhum argumento.

O Sr. Cunha Araújo: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cunha Araújo.

O Sr. Cunha Araújo: - Aberto o precedente, em consequência de um audacioso golpe de desrespeito ao nosso Regimento, a propósito da discussão deste artigo 5.º, embora não goste de «agredir os caídos», não posso deixar sem o meu mais vivo repúdio as suspeitas contra a legitimidade dos votos aqui emitidos ontem, tão infelizmente referidas pelo Sr. Deputado Oliveira Dias, que, ao que me tem parecido, se devia encontrar entre os que mais respeitosamente tinham obrigação de acatar o princípio democrático de que emanou.
Associo-me, por isso, às considerações dos Deputados Júlio Evangelista e Camilo de Mendonça.
Quanto à matéria do artigo em discussão, dou-lhe a minha inteira aprovação na especialidade.

O Sr. Alberto Meirelles: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Meirelles.

O Sr. Alberto Meirelles: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, não obstante sentir ainda as fortes limitações que uma crise momentânea, espero, me trouxe, mas que não me fizeram, penso eu, perder totalmente a lucidez, para um esclarecimento -que julguei ser devido - ao Sr. Deputado Roboredo e Silva.
As dúvidas que pôs, sempre atento às necessidades, aos imperativos da defesa nacional que estão no seu espírito, parece-me não serem fundadas, neste caso.
O § 2.º define e refere a igualdade perante a lei, num dos aspectos que foi, historicamente, dos mais discutidos e dos mais debatidos: a, igualdade dos cidadãos perante os cargos públicos. O provimento nos cargos públicos que, através dos tempos, como VV. Ex.ªs sabem, foi objecto de privilégio fundado em muitas espécies de coisas, de circunstâncias, deixou de o ser, e bem, no nivelamento social. Pois é isso exactamente que a Constituição, na esteira, de resto, da Constituição de 1911, traz neste artigo 5.º, § 2.º: é a igualdade dos cidadãos perante o provimento dos cargos públicos, isto é, o direito do cidadão perante esse cargo; não é pròpriamente uma restrição que sucede quanto ao sexo - não -, é o entender que o direito de ser provido nos cargos públicos, e bem, nega qualquer privilégio de nascimento, de raça e até de religião, de sexo ou de condição social, é evidente, mas ressalva, quanto ao sexo, as diferenças de tratamento justificadas pela natureza. Não é um privilégio que estabelece quanto ao sexo, é o reconhecimento da inconveniência, no estado actual da sociedade, pelo menos, e do entendimento que temos das coisas, de certos cargos serem providos a indivíduos do sexo feminino.
Não que sejam menos aptos para eles, pois cada vez mais a mulher se vem revelando mais apta para o exercício de cargos públicos, alguns apenas, e eu lembraria principalmente aqueles que estão na órbita do Sr. Deputado Roboredo e Silva. Nós não consideraríamos, por ora, possível que uma senhora fosse comandante-chefe das Forças Armadas, ou chefe ido Estado-Maior Naval. Poderá ser um génio capaz de o ser. Pois é essa discriminação que se faz quanto à natureza do sexo, as diferenças de tratamento são justificadas por essa natureza. É ,isso apenas, porque me parece, e repito, que, de qualquer maneira, se se estabelece um privilégio para a mulher, não se repõem as coisas da natureza no seu lugar próprio e, de qualquer maneara, também se impedirá que a mulher seja chamada a prestar, eventualmente, o seu serviço nas forças armadas, de acoplo com a natureza e o sexo.