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20 DE JANEIRO DE 1972 3057

b) Ou a consecução de um escopo lucrativo, isto é, de obtenção de lucros para distribuir pelos seus componentes.

Estão no primeiro caso tanto as pessoas colectivas que visam um fim desinteressado ou altruísta como aquelas que se destinem à realização de um fim egoísta dos seus associados, quando o interesse a prosseguir seja de natureza ideal ou o fim a atingir seja de natureza económica, mas não lucrativo.

Ao segundo grupo pertencem as sociedades.

Segundo o nosso direito, a sociedade, em sentido técnico, caracteriza-se, além do mais, como o agrupamento de pessoas que, por contrato, se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de uma fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade (artigo 980.º do Código Civil).

O exercício de certa actividade económica e a repartição dos lucros resultantes dessa actividade são, assim, os elementos diferenciadores das sociedades em relação a qualquer outro tipo de associação de pessoas.

E a sua diferenciação não é de somenos importância, visto serem diversos os respectivos regimes jurídicos.

E nestes avulta desde, logo a forma do seu reconhecimento, isto é, a forma pela qual uma dada pessoa colectiva adquire personalidade jurídica.

E que, enquanto o reconhecimento das sociedades se unifica por mero efeito da lei, onde que cumpridas certas formalidades, o das demais resulta de acto individual e discricionário da Administração.

Para o efeito, dispõe o Código Civil que os associações que não tenham por fim o lucro económico dos seus associados adquirem pura validade jurídica pelo reconhecimento, que é individual e da competência do Governo ou do seu representante no distrito (artigos 157.º e 158.º).

For sua vez, o Decreto-Lei n.º 39 660, de 20 de Maio da 1950, estabelece os termos desse reconhecimento, que consiste, fundamentalmente, na aprovação dos estatutos.

Temos, pois que apenas as sociedades, isto é, aquelas pessoas colectivas que se caracterizam pelo escopo do exercício de uma actividade económica e de repartição dos lucros assim obtidos adquirem personalidade jurídica, independente da vontade da Administração.

Estão neste caso as sociedades cooperativas, previstas no nosso Código Comercial.

Mas para que se trate de uma sociedade cooperativa aí prevista e regulada não bosta que se lhe dê esse nome. E preciso, antes de anais, que o respectivo substrato analisado quer no seu elemento pessoal ou patrimonial, quer no seu elemento teleológico - e neste avulta, como viram, a realização de qualquer actividade económica lucrativa -, corresponda aquele guid real que a lei quis sujeitar a tal regulamentação.

Do mesmo modo que ninguém pensará estruturar a sociedade de cultura e recreio" de qualquer bairro de Lisboa segundo as normas dos sociedades, só porque assim se designa, não é lícito fazer intervir as regras da constituição das cooperativos nas associações que porventura adoptem a designação dê cooperativas, mas de cujo substrato concreto resulta não corresponderem à definição legal dessas sociedades.

Quanto a, estas valerá, necessariamente, o regime jurídico das associações, que importa, além do mais, o reconhecimento individual da administração, através da aprovação dos respectivos estatutos.

Dificuldades já se podem suscitar; porém, quando, dados os fins que visem prosseguir, se apresentarem com uma natureza por assim dizer híbrida, prosseguindo, ao mesmo tempo, intentos económicos e fins não lucrativos. Fazendo funcionar os princípios normativos que informam o nosso sistema jurídico, parece-me que nenhuma dúvida pode trazer o entendimento de que o funcionamento de tais sociedades há-de ser regulado de conformidade com as regras jurídicas predispostas ao fim principal e prevalente que se propõem, sem embargo da necessidade do duplo reconhecimento - normativo e por concessão -, quando aquele fim for de natureza económica, dado os interesses públicos qua, apesar disso, podem estar em jogo.

E aqui está, Sr. Presidente e Sr s. Deputados, porque iniciei estos minhas considerações com a afirmação de que o decreto-lei em discussão era, no rigor dos princípios, desnecessário, uma vez que não trazia nada de novo ao direito vigente.

As soluções que expressamente consagra já, afinal, resultavam da lei.

Mas outra conclusão se impõe se se considerar a sua oportunidade, num plano de política, em função de certas realidades concretas.

É que, como VV. Ex.ªs com certeza não desconhecem, apareceram por aí e ameaçavam multiplicar-se, a par de autênticas sociedades cooperativas e de outras, apesar de tudo informadas pelo verdadeiro espírito cooperativo, várias associações, designadas, constituídas e a funcionar segundo o esquema legal das sociedades cooperativas, mas que, para além do nome, nada têm que

Entrou-se no abuso de quem quisesse furtar os estatutos de uma qualquer associação a aprovação administrativa, simularia um reduzido capital, inventava um vago e incerto fim económico, escondido nos múltiplos fins ideais a que se propunha e, pronto, apresentava-se no notário ti constituir uma sociedade cooperativa anónima de responsabilidade limitada.

Os exemplos estão para aí dispersos na 3.ª série do Diário do Governo e só não percebo é como pessoas de boa formação jurídica acham correcto tal procedimento.

É claro que tais sociedades nada têm que ver com o desenvolvimento económico do País, e a formação de capital e o aproveitamento da pequena poupança.

E se admitirmos mesmo que é louvável o fim de todas elas, este não justificará os meios para o conseguirem, desde que ilegais.

De resto, na prática, algumas dessas associações têm-se aproveitado do seu rótulo cooperativo para levarem a cabo acções contra interesses públicos que ao Estado importa defender e acautelar.

Podia, pois., o Governo utilizar os seus poderes para, ou com medidos policiais ou administrativas ou até mesmo judiciais, pôr termo a todas essas "sociedades", cuja inexistência, por vicio de forma nu sua constituição, era de mais evidente.

Preferiu, porém, dar-lhes a oportunidade de se manterem e de passarem de uma existência ilegal a uma vida legal.

É este, quanto a mim, o verdadeiro valor formal do decreto-lei em discussão.

Não percebo, por isso, a especulação e o barulho que à sua volta por aí se fez.

Quem não deve não teme, diz o povo com a sua sabedoria.

É de presumir, portanto, que os clamores levantados por banda de algumas dessas "cooperativas" sejam o eco de consciências pouco tranquilas.