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4054 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 204

Na, verdade, penso que se poderão encontrar ao todo uns dois ou, no máximo, três ramos de actividade médica, em que casos especiais e excepcionais poderão beneficiar de recursos que não possuímos Não creio que tal montante de doentes se traduza em encargo importante para o Estado, mas é evidente que a existência ou a criação de um fundo especial ou de disposições legais para esse fim deverá atender a princípios essenciais.

É, com efeito, fundamental que o doente tenha realmente necessidade de ser tratado fora do Pais. Isso pressupõe, antes do mais, o conhecimento das possibilidades técnicas do meio nacional, que não pode ser deixado ao critério de um médico às vezes afastado da especialidade em causa ou, pior ainda, deixado ao acaso dos conhecimentos e influências de leigos.

A solução é muito simples. Todo o doente, supostamente naquelas condições, apresentaria na instituição oficial de assistência mais próxima um relatório passado pelo médico responsável pela sugestão. Automaticamente o caso seria apreciado por uma comissão ou conselho médico nacional da especialidade em causa, o qual, verificando a impossibilidade de tratamento no País, escolheria o centro mais apropriado no estrangeiro. Se a situação tivesse remédio em Portugal, o doente seria acolhido no centro qualificado mais próximo da área da sua residência.

A constituição desses conselhos médicos deveria englobar especialistas reputados dos três centros universitários da metrópole e dos principais hospitais centrais. Tais conselhos deveriam ser amplos na sua constituição, ainda que para a apreciação de cada caso se reunissem obrigatoriamente apenas os três membros com as maiores qualificações profissionais, um por cada centro, cabendo-lhes o direito de ouvirem as opiniões de parte ou de todos os restantes membros ou mesmo de colegas alheios ao conselho.

As vantagens de tal orientação transcenderiam as da simples economia.

O Sr. Agostinho Cardoso: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Estou a ouvir com imenso interesse as suas considerações e a concordar com elas. Apenas há um pequeno pormenor a considerar: seria necessário que esses conselhos, que se pronunciariam acerca da ida ao estrangeiro ou não dos doentes ou acerca do seu internamento em estabelecimentos portugueses, tivessem, em primeiro lugar, um prazo obrigatório para darem a sua opinião, para não acontecer os doentes morrerem antes da decisão; em segundo lugar, que fosse assegurado, imediatamente a seguir ao parecer, o internamento.

O Orador: - Muito agradecido, Sr. Deputado, e concordo plenamente com essas sugestões, que viriam a aperfeiçoar este possível sistema.

Tenho verificado, com surpresa, que grande número de emigrantes, por vezes já razoavelmente radicados e do, minando até as línguas dos países em que foram labutar, vêm a Portugal com o objectivo de ouvirem um médico português. E tenho-os inquirido sobre essa atitude. Há de tudo - maior, confiança em nós, inadaptação ao meio hospitalar local, dificuldades de encontro psicológico médico-doente, etc.

Para mim, porém, há dois aspectos que contam mais ainda que tudo isso: são o prestígio nacional e a força negativa que o recurso ao estrangeiro representa para o progresso de certos sectores da nossa medicina.

Quanto ao primeiro aspecto, pude experimentar sentimentos de vergonha e de revolta mais que uma vez, ao ver que éramos na Europa o único País com um tipo de exportação lamentável - exportação de doentes -, que nos colocava ao lado dos países recém-nascidos em África.

Não é raro que a médicos caibam as culpas por desconhecerem inconsciente ou conscientemente o que se faz no seu próprio país, porventura na cidade ou no hospital onde trabalham.

O prestígio do País é profundamente abalado por tal tipo de exportação, mormente quando as situações atingem foros de ridículo, pela banalidade dos casos ou por motivos ainda mais tristes, nenhum dos quais passava despercebido à observação de médicos e enfermeiras, cujo conceito teórico da nossa pátria já não era nada favorável.

Relembro a situação de um doente que se deslocara a Londres para um exame, cuja técnica nascera e se desenvolvera largamente no nosso país, onde existiam centros que a praticavam com frequência muito maior do que o hospital que ele procurara no estrangeiro.

Do segundo ponto, direi que é lamentável ver sair do País dinheiro que não terá outro rendimento senão o do momento, quando o tem, e que, transformado em subsídios de investigação, já teria rendido muito no arranque, organização e expansão de sectores necessitados. Não são raros aqueles médicos que têm imposto a si próprios imensos sacrifícios materiais e pessoais, intelectual, física e moralmente, prescindindo de proveitos que lhes seriam fáceis de obter, para dedicar o melhor esforço da sua vida a um projecto de evidente utilidade pública nacional.

O Sr. Pinto Machado: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pinto Machado: - Em relação às considerações que V. Ex.ª está fazendo, devo dizer o seguinte: quanto a estrutura que propõe para os doentes que necessitam de uma assistência médica particularmente diferenciada, estou de acordo com ela nas suas linhas gerais.

Não tenho a experiência hospitalar de V. Ex.ª Gostaria de partilhar do seu optimismo, no sentido de que os nossos hospitais estão aptos a proporcionar a assistência médica, incluindo, evidentemente, a cirúrgica, altamente especializada que muitos desses casos a que V. Ex.ª se refere efectivamente requerem.

Creio que em certas situações médicas, como, por exemplo, de patologia hemática, ou de doenças malignas, ou ainda de imunopatologia e de tantos outros sectores, n ida dos doentes lá fora não será sempre por desconhecimento dos médicos - que são eles muitas vezes, como V. Ex.ª referiu, que enviam os seus doentes lá fora e alguns até são professores universitários -, como não será sempre por exibicionismo nem por um legítimo descargo de consciência - a consciência de se ter feito quanto era humanamente possível.

Creio que, efectivamente, há situações em que nós não estamos aptos a realizar uma assistência médica hospitalar eficiente, que envolve até uma estrutura de serviços, com full-time hospitalar, que não temos. Mas, independentemente destes casos, há um outro que é importante considerar: apesar de em muitos aspectos termos já felizmente inegável capacidade - estou a pensar, por exemplo, em cirurgia cardíaca, com circulação extracorporal -, o tempo de espera dos doentes é tão grande que, do ponto de vista prático, não interessa nada que a intervenção se faça. Isto porque, quando chega a vez de