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6 I SÉRIE - NÚMERO I

a oficial da Torre e Espada. E esta foi a sua única condecoração.
Com o Marechal Saldanha participa na Batalha de Almoster, carnificina entre liberais e absolutistas, que com a Convenção de Évora Monte fez exilar D. Miguel e entregar o trono a D. Pedro IV e à Rainha D. Maria.
Retomou os seus estudos, beneficiando do «perdão de acto» concedido aos vencedores, e matriculou-se em Coimbra no 3.° ano de Direito, curso que conclui em 18 de Novembro de 1836.
Depois da Revolta de 9 de Setembro de 1836, que impôs uma Constituição feita pela Nação, em vez da outorgada pelo Rei, logo em Março de 1837 José Estêvão é eleito pela primeira vez deputado por Aveiro às Constituintes, proferindo em 5 de Abril, na sua estreia parlamentar, o seu primeiro discurso conhecido por «Profissão de Fé», o qual deveria ser durante um quarto de século de actividade política intensa, a sua cartilha, da qual muito pouco ou nada se desviaria.
A política de José Estêvão foi uma única durante a sua vida pública - a felicidade, a prosperidade e o engrandecimento do seu País; a sua doutrina uma só - a máxima liberdade compatível com a instrução do povo e com a segurança social; o seu partido o mesmo de sempre - a democracia; a sua divisa - o progresso e a civilização.
O que dizia com a palavra respeitava-o com o exemplo.
Proclamava então o jovem e tão ouvido tribuno: «A minha convicção é forte e enérgica; e quando o espírito se enche de uma convicção destas, ainda que as ideias que as formam se possam chamar perigosas, ainda que pareça imprudência pronunciá-las, ainda que o silêncio seja um dever, esse dever cumprido deixa o remorso de uma falta cometida.»
«E preciso que cada um de nós respeite as opiniões dos outros, para que as suas sejam respeitadas; eu respeitá-las-ei todas, combatendo aquelas com que não combinar e espero que as minhas sejam respeitadas, sem deixar de ser combatidas.»
«Se, pois, nós reconhecemos e definimos o principio da soberania popular; se nos sujeitarmos às suas consequências; e se exercermos, por delegação especial essa soberania - inquestionavelmente estão reunidos em nossas mãos os poderes do Estado e temos direito a distribuí-los e dividi-los como melhor nos parecer.»
«Se considerarmos os fins e natureza das associações políticas, achamos que é indispensável que nelas haja julgados, execução e leis; isto é, poder legislativo, judicial e executivo.»
«Juiz só, a julgar só; um rei só, com ministros responsáveis a executar só; uma câmara só, a legislar só; eis a minha monarquia; eis o meu Governo representativo.»
«O Rei reina e não governa», dizia ainda José Estêvão.
E mais adiante dizia: «Eu empenho, pois, todos os poderes do céu e da terra, na profunda e grata convicção de que o povo português há-de caminhar sempre na estrada do progresso e da liberdade, debaixo dos auspícios da ordem e da civilização.»
E continuava: «E com esta minha exposição talvez alguém diga que sou republicano; se o fosse havia de dizê-lo, porque o nome não tem fealdade; mas eu não sou republicano, nem esse nome é de apetecer no nosso país. Eu amo os tronos, porque vejo neles um princípio inocente na organização social e os danos que eles têm feito não vêm deles, mas do erro de os cercar de direitos terríveis que lhe são funestos.»
Estes foram os princípios gerais defendidos pelo homem a quem esta Assembleia hoje presta homenagem. O parlamentar que após a sua morte, pela primeira vez na Europa, teve a sua cadeira um mês coberta de crepes. Os inimigos combateram-no, mas depois da sua morte curvaram-se respeitosamente e homenagearam-no.
Não eram só os seus extraordinários dons naturais, a presença, o gesto, a voz e ainda a sinceridade e o tom convicto da sua palavra que as páginas dos Diários das Câmaras não traduziam, pois isso morre sempre com os oradores; o próprio texto era muitas vezes apenas uma reprodução deficiente, confusa, infiel e ininteligível das suas orações, porque ele nunca as revia. Todos os que o ouviam estavam presos e suspensos dos seus lábios e até os taquígrafos se surpreendiam a si próprios, escutando o grande orador e esquecendo-se das suas notas...!!
O seu génio tribunício, o temperamento impetuoso, o seu feitio combativo e o ardor da sua fé, arreigados ao seu sentimento patriótico, debitaram para o seu monumental espólio literário das melhores peças oratórias que até àquela data se ouviram nos parlamentos mundiais.
As intervenções mais notáveis foram: os discursos do «Porto Pireu» em 1840, em que José Estêvão respondendo ao discurso da coroa e ao seu emulo da oratória, Almeida Garrett dizia: «Para bem descrever o País é preciso ser digno dele, e não tomar por ponto de perspectiva as rivalidades conterrâneas e as rixas da vizinhança; é preciso observá-lo pelas lutas da verdade e não pelo prisma das facções».
Quanto às campanhas parlamentares em favor das estradas e caminhos de ferro, como foi já aqui referido, o seu primeiro projecto foi rejeitado, mas a sua luta não teve tréguas e, na Legislatura de 1857, o grande orador deu mais um testemunho do estremado afecto que sempre o prendeu à cidade de Aveiro, porque às suas solicitações e ao seu incansável desvelo, e somente a ele, Portugal teve caminhos de ferro mais cedo e essa via entre Lisboa e Porto viria a passar junto da sua querida terra natal.
A questão do barco francês Charles et George apreendido ao serviço da escravatura em águas de Moçambique e que por inércia do Governo de Lisboa foi retirado do Tejo, foi outra das suas entusiásticas e patrióticas intervenções no Parlamento, como o foram os casos das Irmãs de Caridade Francesas e de Cavour, esta relativa à unificação de Itália, que foram intervenções polémicas mas crivadas de profundas convicções, não só religiosas, como políticas e patrióticas.
Aplaudido, respeitado, traído e exilado por três vezes, José Estevão foi um lutador da palavra e da escrita.
Os seus artigos nos jornais Revolução de Setembro, Liberdade, Atheleta e Distrito de Aveiro, ficaram entre outros a atestar todo o seu engenho na arte de escrever, mormente quando os sectários omnipotentes lhe negaram o direito constitucional de viver no seu País e de ser eleito para o Parlamento.